Rio - O prefeito do Rio, Marcelo Crivella, afirmou ontem que vai implementar um projeto para blindar as escolas municipais que estão em linhas de tiro. Segundo o prefeito, uma argamassa especial pode ser utilizada. “Existe tecnologia. Há dez anos acho que esse projeto não foi bem aceito, mas agora, depois de tantos casos e tantas mortes, isso deverá ser melhor compreendido”, afirmou.
Cesar Benjamin, secretário municipal de Educação, esteve no IML para dar apoio à família e afirmou que a secretaria vai pagar os custos do enterro. Segundo ele, ontem, hávia 25 unidades educacionais fechadas por conta de tiroteios nos bairros atendidos pela 6ª Coordenadoria Regional de Educação (Costa Barros, Fazenda Botafogo, Acari, Pavuna e Coelho Neto), totalizando 9.583 alunos sem aula. Na unidade onde Duda morreu são 720 alunos divididos em dois turnos (manhã e tarde), e 42 professores dando aulas do sexto ao nono ano. A escola ficará fechada por tempo indeterminado.
'Estamos pagando com o sangue das nossas crianças'
‘Agora não estamos pagando mais só impostos. Estamos pagando com o sangue das nossas crianças.’ O desabafo é de Uidson Alves Ferreira, de 32 anos, irmão da adolescente Maria Eduarda Alves da Conceição, de 13 anos, que morreu baleada na tarde de quinta-feira dentro da Escola Municipal Jornalista e Escritor Daniel Piza, em Acari.
Peritos encontraram quatro ferimentos — dois perto da nuca e dois nas nádegas — no corpo da adolescente. O laudo da necropsia ainda não está pronto. A declaração de óbito da adolescente aponta ‘ferimentos transfixantes no encéfalo por projéteis de arma de fogo’. No momento em que ela foi atingida, estaria ocorrendo um tiroteio entre bandidos e policiais ao lado do colégio.
“Mataram o meu bebê. Ela foi embora. Os policiais mataram ela. Meu Deus, ela tinha apenas 13 anos. O que vai ser da minha vida? Eles acabaram comigo”, se desesperava a mãe de Maria Eduarda, Rosilene Alves Ferreira, 53. “Treze anos, atleta, estudante, tinha sonhos, e os policiais acabaram com os sonhos dela”, lamentava Rosilene, que é acompanhante de idosos.
O irmão Uidson conta ainda que, em três anos como atleta amadora de basquete, Duda, como era chamada, já tinha nove medalhas e ganhou bolsa para escola particular por causa do esporte. Ontem, a família esteve no Instituto Médico Legal (IML) para liberar o corpo.
Os pais da menina carregavam a blusa que ela usava no momento em que foi atingida, onde é visto um buraco provocado pela bala. O enterro da jovem está marcado para hoje, de manhã, no Cemitério Jardim da Saudade de Edson Passos, em Mesquita.
“Eu criei, trabalhei, mão calejada. Trabalhei duro para dar o que podia para minha filha. Aí, meia dúzia de PMs, sem preparo nenhum, sai dando tiro para cima e para baixo como se estivesse matando um monte de passarinho. E tiram a vida de uma criança de 13 anos”, lamentou o pai de Duda, Antônio Alfredo da Conceição, 63.
A escola fica na divisa entre o asfalto e a favela. “Estamos dentro da comunidade e lá é fácil para ser atingida, já que é toda aberta. Às vezes, em momento de confronto, a escola serve de escudo pra PM. Por conta do tiroteio de ontem várias paredes da escola foram atingidas, inclusive a minha sala”, disse o diretor do colégio Luiz Menezes.
Segundo ele, o professor de Educação Física da menina também ficou ferido por estilhaços.
O diretor contou ainda que, além de Duda, que estava na aula de Educação Física, havia mais 30 crianças no pátio quando começou o tiroteio. No total, 350 alunos faziam outras atividades nas salas. “No momento da morte da Duda uma amiguinha ainda se ajoelhou para tentar salvá-la”, revelou.
'Humanamente compreensível', diz comandante da PM
O comandante-geral da PM, coronel Wolney Dias, disse que não irá afastar o comandante do batalhão de Irajá e que vai intensificar os cursos de reciclagem de policiais militares para que situações assim não se repitam. “Não avalio como erro do comando. O comandante não irá ser afastado por isso. O que vamos fazer é intensificar as nossas abordagens de tiros e melhorar o treinamento baseado no relatório de vitimização policial, estudo que estamos fazendo.”
Wolney afirmou que o da execução de suspeitos em frente à escola onde Maria Eduarda foi morta o “chocou”, mas disse compreender. “Claro que não concordo. Mas é humanamente compreensível baseado no estresse que esses policiais vivem. Esse ano foram 46 policiais mortos. O PM já atua sob fortíssimo estresse. Estamos em uma guerra, em que o policial atua sob risco de morrer. O vídeo que circulou de um policial agonizando no chão, sem ser socorrido, criou um abalo e grande impacto nos policiais que estão na linha frente”, disse.
Sobre o ponto de vista do oficial, o promotor Paulo Mello, da Auditoria Militar, disse que “mesmo na guerra existem regras e há prisioneiros”. Outro caso essa semana com suspeita de envolvimento de PMS é a morte do motoboy Luís Fernando Malaquias, atingido por seis tiros no Morro da Formiga, na Tijuca, na quarta-feira.
De Adriana Cruz, Bruna Fantti, Jonathan Ferreira, Paola Lucas e do estagiário Rafael Nascimento, com supervisão dos repórteres