Rio - Levantamento ao qual O DIA teve acesso mostra que a polícia não consegue atuar em quase um terço do total do território que deveria ser ocupado pelas Unidades de Polícia Pacificadora implantadas. Na UPP mais comprometida, a Nova Brasília, no Complexo do Alemão, a mobilidade dos policiais só é possível em apenas 24% da área da unidade. Há risco de confronto com traficantes caso passem do perímetro de segurança.
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O documento, organizado pelo Instituto de Segurança Pública, retrata a situação das 39 UPPs no primeiro trimestre deste ano e é um dos diagnósticos analisados pelo chamado Comitê Permanente de Avaliação e Deliberação da Secretaria de Segurança, comissão criada pelo secretário Roberto Sá para avaliar o programa de pacificação. Entre as reuniões quinzenais do grupo já há o debate de retirada do efetivo policial de algumas unidades.
Três UPPs lideram o ranking com maior área perdida para o crime: além da Nova Brasília, a vizinha Parque Proletário (Penha), e São Carlos, no Centro. Todas têm mais de 70% da área comprometida. Somente cinco das 39 unidades tinham, na época do levantamento, total locomoção dos agentes pelas ruas sem o risco iminente de confrontos. Eram elas: Dona Marta, Vidigal, Babilônia, Cerro-Corá e Barreira do Vasco. A situação pode ter mudado pois, na última semana, uma imagem emblemática da derrocada do programa circulou o mundo: a estátua de Michael Jackson, no coração do Dona Marta, com um fuzil. Não é só o tráfico que confronta os policiais. Na UPP Batan, três grandes regiões são controladas por milicianos que enfrentam os policiais.
Relatórios de confrontos indicam que, nos últimos três meses, 90% das UPPs apresentaram tiroteios. Mais da metade (56%) das bases onde ficam os policiais foram alvos de tiros. No total, 64% das unidades tiveram algum agente com ferimentos — provocados por tiros ou por pedradas, por exemplo. E, em quase 65% das UPPs, há barricadas na comunidade.
A comissão analisa também a quantidade de armas das unidades, coletes, viaturas e estrutura. Mais de 60% do efetivo ainda está em contêineres. Em entrevista de Sá ao DIA, no início do ano, sobre a possibilidade de retirada de unidades, o secretário disse que acredita no projeto. “A população residente nas áreas com UPP confia nas unidades e as quer”, disse o secretário.
Especialista diz que ‘não tem conserto’
Para a socióloga Julita Lemgruber, diretora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes, o projeto das UPPs não tem mais jeito. “Não adianta a gente se enganar. As UPPs não têm conserto, não há como dizer que você vai redirecionar ou reformular”, opinou. Pela sua análise, é necessário se repensar a política de Segurança Pública, principalmente escutando as necessidades dos moradores. “É necessário uma estratégia de policiamento comunitário que seja digna do nome. Não adianta a gente se enganar e enfrentar com violência o crime nas favelas”.
Para Julita, a reprovação das UPPs é culpa do governo. “Não foi feito o dever de casa. Estamos recolhendo os frutos da miopia e da crença de que policiamento comunitario poderia ser feito sem diálogo com a comunidade”, disse.
Deputado quer CPI para analisar a situação do projeto
O vice-presidente da Comissão de Segurança da Alerj, Bruno Dauaire (PR), recolheu 36 assinaturas essa semana para criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a situação das UPPs. “Queremos debater os direitos dos policiais. Alguns se deslocam do interior, às vezes pagando do próprio bolso. Fiz pedido de informações para a Polícia Militar, como a quantidade de efetivos por turno nas unidades e nos batalhões. O comando da Polícia Militar me negou”, disse.
Segundo o deputado, existe um aumento exponencial, nas áreas com UPPs, de pedidos de licenças médicas, o que fez ele protocolar um pedido de projeto de lei sobre o tempo máximo de permanência de agentes públicos nas UPPs. “O número de agentes afastados por problemas psiquiátricos nessas áreas é alto. Isso se deve ao estresse constante, com tiroteios e insegurança. Quero aprovar um projeto para que o policial fique no máximo dois anos em áreas conflagradas”, afirmou.
No dia 30, uma audiência pública com representantes do Ministério Público, da Polícia Militar e da Secretaria de Segurança será realizada devido à série ‘Rio Sem Polícia’, publicada, em junho e julho, pelo DIA. As reportagens apontaram o grau de precariedade da estrutura policial no combate ao crime.