Rio - Agentes relataram ao DIA que houve mudança nos confrontos no Jacarezinho, na Zona Norte. Os traficantes passaram a utilizar diferentes técnicas militares, além de armar até usuários de crack com pistolas glock com kit rajadas.
“Isso foi visto pela primeira vez na sexta-feira. Fomos apoiar a UPP, que já estava sem armas e munições. Chegamos ao local e fomos recebidos até por ‘cracudos’, que disparavam rajadas, inclusive em direção a moradores”, detalhou um agente da Delegacia de Combate às Drogas (Dcod), que preferiu não se identificar.
Traficantes também fariam ‘iscas’: um homem sozinho dispara contra o blindado, até atrair o carro para um beco onde há inúmeros bandidos armados escondidos. Ao tentar recuar, o carro encontra barricadas de trilhos de trem que até então não estavam no local. Granadas também são utilizadas.
De acordo com um policial da Core, o uso intensivo de coquetel molotov nos blindados não danifica a lataria, mas tem objetivo de sufocar os policiais com a fumaça. “Tem uma foto que o blindado está parado com uma garrafa pegando fogo no teto. Ali, o motorista não conseguia dirigir, sem visibilidade e asfixiado”, contou.
Procurado, o delegado da Dcod, Felipe Curi, não quis entrar em detalhes sobre os métodos utilizados. “Eles usam táticas de guerrilha sim. Peço aos moradores que ajudem a polícia com denúncias”. Segundo apuração da delegacia, Jacarezinho é uma favela de entreposto de drogas do Comando Vermelho, além de ser muito procurada por usuários de drogas. O tráfico é constituído também por assaltantes de carros e motos, que circulam com veículos roubados.
Seria o caso, segundo a polícia, de Moisés Alves, 28 anos, que foi ferido ontem no braço. Imagens mostram ele dirigindo uma moto roubada, minutos antes de ser baleado pela polícia.
De acordo com o agente que atirou, Moisés fez disparos contra os policiais com uma pistola. Enquanto era socorrido por moradores, a arma teria sido recolhida. Escutas gravadas de rádios de traficantes, anexadas ao registro de sua prisão, indicam que ele seria criminoso. “Mano, balearam um nosso. Foi agora, em cima da laje”. A família nega. A polícia afirma que o homem morto ontem também era traficante e também estava em uma laje.
Até cachorro é baleado nos tiroteios
Nem mesmo os animais escaparam da violência que já completou uma semana no Jacarezinho. Um cachorro vira-lata foi atingido ontem por uma bala perdida. Segundo moradores, ele seria o animal de estimação de uma mulher que vive na comunidade.
O cão teve um ferimento na perna traseira e foi encaminhado para a Sociedade União Protetora dos Animais (Suipa). O quadro de saúde dele é estável.“Ele estava bem anêmico e perdeu muito sangue”, contou, Raphael Cunha, veterinário da Suipa.
Suspeitos da morte de policial são identificados
A Dcod identificou Jonathan Luís da Silva; Jefferson Gonçalves da Silva; Wellington de Sousa Macedo e Carlos André da Conceição como suspeitos que participaram do tiroteio que matou o agente Bruno Buhler, da Core. Informações podem ser repassadas ao Disque-Denúncia (2253-1177).
A assistente comercial Maíra Mendonça, mulher de André Luís Medeiros, mototaxista que morreu na quarta-feira, após ser baleado na sexta, desabafou sobre a violência no Jacarezinho. “As pessoas me ligavam e diziam para não ir para casa. Enquanto houver aquilo (confronto), eu vou reviver o momento que meu marido foi baleado”. André será enterrado hoje, às 15h30, em Inhaúma.
Durante o confronto de ontem na comunidade, a sede da ONG Rio de Paz, foi alvejada por tiros. No aquário de música da ONG, também no Jacarezinho, mais de 200 disparos atingiram janelas, paredes, livros e portas. A instituição suspendeu as atividades na região por conta da violência.
Verdureiro foi enterrado
Em misto de comoção e revolta, o verdureiro Sebastião Sabino da Silva, de 46 anos, foi enterrado ontem, no cemitério do Caju. Ele foi morto na terça-feira, quando trabalhava durante um tiroteio no Jacarezinho. “Não foi bala perdida. Eles miraram no peito do meu pai e atiraram porque achavam que ele era traficante. Não foi apenas um disparo, e sim três”, lamentou Raquel Sabino, filha do feirante, conhecido na região como Tião.
Para ela, o verdureiro poderia estar vivo se o socorro não tivesse demorado tanto. “Meu pai ficou agonizando por mais de meia hora. O sentimento é de tristeza e indignação. Confundiram um trabalhador, que estava ali ganhando seu pão de cada dia, com um traficante”, afirmou. Além de Raquel, o feirante tinha outros seis filhos.
*Colaboraram Daniel Castelo Branco e Maria Inez Magalhães