Por karilayn.areias

Rio - A auxiliar administrativa Patrícia Evangelista, 44 anos, nasceu na comunidade de Manguinhos, onde cria as três filhas de 25, 21 e de 17 anos e, agora, duas netas, uma de 5 e outra de 1 ano e três meses. Presidente da Organização Mulheres de Atitude, ela conta que em todos esses anos nunca havia visto um confronto armado tão violento e prolongado como o que tem ocorrido desde o dia 11 na comunidade, após a morte de um policial militar no Jacarezinho, área vizinha.

“Somos divisa aqui e, infelizmente, quando a operação começa lá, começa aqui também. Há uma circulação do caveirão pelo entorno e pelo interior da comunidade como um todo”, disse em entrevista à Agência Brasil.

No sábado, no nono dia de conflitos no Jacarezinho, cinco pessoas foram feridas e levadas para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Manguinhos. Entre elas, um homem chegou morto na unidade à tarde. À noite, a moradora Jorgina Ferreira não resistiu ao ferimento na cabeça e morreu. Outra mulher, baleada na nuca, foi transferida para o Hospital Salgado Filho, no Méier, na zona norte, e permanece em estado estável. Uma mulher e um homem, com ferimentos leves, foram liberados após serem atendidos. 

Cerca de 250 pessoas participaram de uma caminhada pela paz e pela garantia dos direitos dos moradores de Manguinhos e do Jacarezinho realizada neste domingo. A manifestação foi organizada por representantes comunitários, coletivos culturais, associações de moradores e integrantes do Sindicato dos Servidores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), instituição que funciona na região.

Com medo, moradores mudam hábitos

Segundo Patrícia Evangelista, os confrontos interferem no dia a dia da comunidade e provocam reflexos na saúde dos moradores. “A gente não está vivendo. A gente está sobrevivendo assustados, amedrontados. São pessoas com síndrome do pânico, tomando remédio controlado, porque não tem saúde que resista à esta situação que a gente está vivendo. A cada minuto, a cada instante, a gente sabe que um conhecido foi baleado, outro morreu”, relata, acrescentando que crianças e adolescentes estão sem aulas por causa dos conflitos.

“O que a gente tem certeza, é que, nós moradores, e as pessoas de bem, que vivem na favela não têm que pagar com o sangue e a vida por conta da vingança dos policiais que perderam os seus companheiros. Não fomos nós que apertamos o gatilho”, diz Patrícia, revelando ainda que Jorgina Ferreira, uma das vítimas, era tia de duas integrantes da Mulheres de Atitude, sendo que uma delas é professora da Fundação Oswaldo Cruz e a outra faz parte da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

Os conflitos estão mudando também os hábitos de compras de alimentos. Segundo Patrícia, para evitar riscos de serem atingidos por tiros, os moradores estão se organizando em grupos para fazer uma compra conjunta. “Não conseguem ir na padaria. Não conseguem ir ao mercado. Não conseguem nada e aí em um intervalo [do tiroteio], uma vai e traz pão para duas, três vizinhas e reveza quando dá para sair”.

A família de Patrícia foi para Manguinhos, após ser removida da favela da Praia do Pinto, na zona sul do Rio. “A minha família vive aqui. Tenho tias, tios, primos, irmãos. Escolhemos este lugar para continuar morando e tentar mudar. Esse é o meu objetivo. A gente tem visto que a cada dia, a gente está perdendo esta batalha, mas ainda não perdeu essa guerra”, afirma.

Você pode gostar