A Polícia Civil começou a perícia no no Morro Boa Esperança em busca de explicações para o desabamento -   ESTEFAN RADOVICZ
A Polícia Civil começou a perícia no no Morro Boa Esperança em busca de explicações para o desabamento ESTEFAN RADOVICZ
Por RAFAEL NASCIMENTO

Rio - Enquanto parentes e amigos sepultavam as últimas vítimas do deslizamento no Morro da Boa Esperança, autoridades tentavam explicar, na tarde desta segunda-feira, as possíveis causas da tragédia, que matou 15 pessoas, feriu 11 e deixou 22 famílias desabrigadas.

O Departamento de Recursos Minerais do Rio (DRM), em nota técnica, alegou que o incidente era difícil de prever. No entanto, havia um levantamento desde 2009, encomendado pela própria Prefeitura de Niterói e pelo Ministério das Cidades alertando que a área precisava de monitoramento constante, por apresentar risco médio de acidentes.

O trabalho foi confirmado por um estudo contratado pela prefeitura em 2016, por R$ 1,8 milhão, mas que ainda não foi concluído, apesar de o prazo ter vencido em fevereiro de 2017. Segundo o secretário de Defesa Civil de Niterói, Wallace Medeiros, o estudo, que só deve ficar pronto na primeira quinzena de dezembro, indicava o risco de deslizamentos na região como "médio". "A gente tem uma avaliação que é preliminar, mas por conta da necessidade emergencial do que ocorreu, a gente pediu que se antecipasse, para entender a dinâmica dos fatos. Esse estudo caracterizou aquela área como de risco médio. Não foi verificado que poderia haver aquele rompimento daquele maciço", disse Wallace.

O engenheiro Elson Nascimento, do Departamento de Recursos Hídricos da Universidade Federal Fluminense (UFF), um dos responsáveis pelo estudo de 2009, disse que o morro precisava de monitoramento constante por causa da possibilidade de deslizamento e das construções irregulares na área. O professor acredita, que o acidente de sábado ocorreu por conta de um rompimento de um bloco de rocha. "Não foi uma chuva torrencial, provavelmente aconteceu uma infiltração no solo, que perdeu a capacidade de suportar a rocha. Tanto as construções irregulares como alterações da vegetação influenciam nesse solo, alteram a drenagem, o escoamento natural da água. Logo, aceleram as fissuras em rochas", explicou ele, que acrescentou que o estudo previa a aplicação de recursos para prevenir deslizamentos e inundações em Niterói.

Profissionais se esforçam para amparar quem foi atingido pela tragédia - ESTEFAN RADOVICZ / AGÊNCIA O DIA

"Infelizmente, a realidade é que a grande mobilização acontece apenas nos momentos das catástrofes. Em 2010, após o deslizamento no Morro do Bumba, ficou decidido que seria criado um departamento como o Geo-Rio, responsável pela contenção de encostas e que é referência, mas o projeto não continuou", lembrou o professor. Já o presidente do DRM, Wilson Giozza, emitiu nota técnica emergencial classificando como "de difícil previsibilidade" a ocorrência de deslizamentos na encosta do morro.

Pelos cálculos, ao se desprender e rolar morro abaixo, o pedaço do maciço provocou uma avalanche de 20 mil toneladas.

Nota 10 para solidariedade

Em meio à dor e jogo de empurra, após a tragédia a solidariedade marcou ponto. A quantidade de doações ultrapassou as expectativas e o número de voluntários emocionou. A Escola Municipal Portugal Neves, onde estão os desabrigados, recebeu 9 toneladas de alimentos e foi preciso pedir para interromper as doações.

O aposentado Arthur Silva, 75 anos, acordou às 4h, pegou dois ônibus e levou sua contribuição. "Trouxe óleo, açúcar, fubá e leite. É pouco. Mas, é de coração", disse.

A rotina da funcionária pública Nelma Serra, 59 anos, mudou domingo e ontem. "Estou de férias e não pude deixar vir ajudar", explicou a moradora do Fonseca, no outro lado da cidade. Era amiga de Claudiomar Dias Martins, 37, uma vítima. "As pontas dos meus dedos estão doendo de tanto montar os kits de roupas e higiene. Essa dor vale a pena", resumiu o sentimento.

Nelma: 'As pontas dos meus dedos estão doendo. Essa dor vale a pena' - Estefan Radovicz / Agência O Dia

Estudantes da escola que agora serve de abrigo também foram vítimas. Aulas foram canceladas e funcionários trabalham sem parar. A professora de História Nilza Gonzaga Alves lembra com lágrimas: "Maria Aparecida (Martins Viana, 19 anos) foi minha aluna. Era alegre, falante e usava roupas coloridas".

Mais quatro vítimas enterradas

As últimas quatro vítimas fatais da tragédia do Morro Boa Esperança foram sepultadas, ontem, no Cemitério do Maruí, Barreto. Arthur Caetano Carvalho, 3 anos, que havia comemorado o aniversário na véspera do deslizamento, e a irmã dele, Nicole Caetano Carvalho, de 8 meses, foram sepultados à tarde. Pela manhã, foram enterradas as moradoras Marta Pereira Romero, de 61 anos, e Dalvina Martins, de 56 anos. No mesmo cemitério, no domingo, foram enterradas as demais 11 vítimas da tragédia. Dois feridos seguem internados em hospitais públicos, com quadro de saúde estável

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