Fábio Máskara, Juliana Regis, Jorge Luis Pereira, Garcia Duarte, Mário Belisário e Miguel Marques fazem parte do elenco do programa 'Patrulha da Cidade' - ARMANDO PAIVA
Fábio Máskara, Juliana Regis, Jorge Luis Pereira, Garcia Duarte, Mário Belisário e Miguel Marques fazem parte do elenco do programa 'Patrulha da Cidade'ARMANDO PAIVA
Por FRANCISCO EDSON ALVES

Rio - Há quase 60 anos, milhares de ouvintes no país inteiro param na hora do almoço para rir muito, ouvindo a Patrulha da Cidade, pela Rádio Tupi. Programa mais longo da história do rádio brasileiro, a atração, criada em 1960, vai ao ar de 12h às 13h10, de segunda a sábado, e transforma, com linguagem popular, o noticiário policial carioca em histórias, interpretadas por radioatores. O sucesso que perdura décadas é tanto que a atração virou inspiração para um filme, lançado semana passada nas telonas.

"O Patrulha é o único do gênero ao vivo que se tem notícia", orgulha-se o comunicador Mário Belisário, que comanda os esquetes com o jornalista Garcia Duarte. Advogados e estudiosos de comunicação, no entanto, vêem com reservas o estilo, que para alguns pode induzir a maior agressividade e hostilidade, em tempos já tão violentos. Para esses críticos, é preciso tomar mais cuidado com os textos que levam a crer que qualquer preso pode ser visto como culpado (veja coordenada abaixo).

O sonoplasta mais antigo da Tupi, Salvador Aiello, foi quem criou, desde os tempos do vinil, as mais de 100 vinhetas do programa, disparadas diariamente por Jorginho Uepa - ARMANDO PAIVA

Para os integrantes, a atração sexagenária faz uma espécie de crônica da rotina da Cidade Maravilhosa. "Contamos as mazelas, fatos e curiosidades do Rio, por meio de sátiras incorporadas por tipos caricatos", comenta Garcia, que empresta a voz ao longa-metragem 'Os Últimos dia de Copacabana Jack'. O filme, inspirado no Patrulha, de Rob Curvello, foi lançado quarta-feira, na Estação Net.

Nos bastidores, quem produz os diálogos e dá apelidos esquisitos aos personagens é o redator Jorge Luis Pereira, 67. Diariamente ele escreve seis histórias. Quatro baseadas em fatos reais e duas fictícias. "Já escrevi mais de mil", calcula o radionovelista. Quem dispara as mais de 100 vinhetas durante o programa, produzidas pelo sonoplasta Salvador Aiello, ainda na época do disco de vinil e agora digitalizadas, é operador Jorge Martins, o Jorginho Uepa, 45. "Tenho que estar ligado o tempo todo. Cada segundo é precioso".

ingrid Michele, radioatriz do Programa Patrulha da Cidade, ao lado do marido, o apresentador Garcia Duarte. Comandos dos dois aos sábados. - Divulgação: Rádio Tupi

Garcia, cria do ex-âncora Coelho Lima, que se aposentou, comanda também a atração aos sábados com a mulher, Ingrid Michele, que interpreta uma repórter no filme.

Fábio Máskara, Miguel Marques e Juliana Regis, que incorporam malandros, policiais, velhinhos, travestis, entre outros personagens, não escondem a emoção, ao lembrarem os monstros sagrados que já fizeram parte do elenco da Tupi. Entre eles, Orlando Drummond, Yoná Magalhães, Carmem Miranda, Luiz Gonzaga, Ary Barroso, Paulo Gracindo, Maria Alcina e Chacrinha.

"São nossas inspirações", lembra Máskara. "O desafio é controlar o riso entre nós mesmos", brinca Miguel. "Saber que temos fãs pela internet em Portugal, França, EUA e outras partes do mundo, dá frio na espinha", revela Juliana. Nair Amorim, 86, de férias, é outra fera do elenco, assim como Aldenora Santos (Pudica), 84, afastada por problemas de saúde.

Histórias bizarras garantem risadas nos programas

Em pouco mais de uma hora, histórias surreais garantem a audiência do programa, como a do marido que, bêbado, foi para o motel com a amante no carro da esposa. Sem dinheiro para pagar as despesas, deixou o automóvel como penhora. Outra história foi a do ladrão que, fugindo da polícia, invadiu uma casa que, por azar, era de outro PM. “Tem umas situações em Boletins de Ocorrências que parecem mentiras”, diz Mário Belisário.

Mas nem tudo é considerado engraçado no Patrulha da Cidade. Ao cobrar, de forma sempre enérgica, providências às autoridades em prol do povo, os apresentadores acabam “exagerando na dose”, segundo críticos, ao ensejar punições que transgrediriam direitos. Expressões do tipo “põe o vagabundo na tranca, naquela onde os presos gostam desse tipo de bandido”, ou “menor no Brasil é tratado como coitadinho, embora vote”, são questionadas. “De forma irresponsável, acabam incitando mais ódio e violência, num cenário já hostil em que vivemos”, opina o advogado e presidente do Instituto dos  Defensores dos Direitos Humanos (IDDH), João Tancredo.

“Às vezes, a maneira de falar assusta. Antes de julgados, presos só são suspeitos”, justifica Élida Aguiar, do Observatório Mídia Sul. Garcia Duarte alega que o programa mostra “a dura realidade do povão”. “Usamos o humor, o sarcasmo, mas também a indignação, traduzidas das ruas. Mas o rádio é um aprendizado constante. Críticas são bem-vindas”.

Já Belisário recebe elogios dos ouvintes sobre seus discursos em defesa da educação em tempo integral — “único caminho para tirar crianças do mundo do crime”, na sua opinião —, elogiando a polícia e criticando os ‘margiranhas’ (criminosos) ladrões de marmitas, como ele diz. Na terça-feira, ele atacou “covardes que batem e matam mulheres”. Na sexta cobrou transporte mais digno. “O programa tem essa pegada firme. Mas temos respeito, sim. Não fazemos piadas com tragédias, tipo a do Ninho do Urubu, estupros de crianças e espancamento de idosos”.

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