Ingrid Vitória, de 9 anos, Bianca Natalia, de 8, e Kethellyn Rangel, de 9, mostram todo seu talento na escola do Theatro Municipal - Alexandre Brum / Agencia O Dia
Ingrid Vitória, de 9 anos, Bianca Natalia, de 8, e Kethellyn Rangel, de 9, mostram todo seu talento na escola do Theatro MunicipalAlexandre Brum / Agencia O Dia
Por Nathalia Duarte

Rio - Dançar no Theatro Municipal é meta de vários jovens bailarinos. A beleza e elegância dos corredores despertam a imaginação de quem passa, fazendo até quem nunca calçou sapatilha querer se arriscar. Mesmo aqueles que já estão acostumados com os movimentos clássicos podem considerar o sonho de dançar no tradicional palco como algo impossível. As meninas Kethellyn Rangel, 9, Bianca Natalia, 8, e Ingrid Vitória, 9, mostram que não há sonhos impossíveis para os grandes saltos de bailarinas. Elas, que começaram a fazer aulas de balé no Projeto Vidançar, no Morro do Alemão, hoje fazem parte da turma na Escola Estadual de Dança Maria Olenewa, do Theatro Municipal. 

Desde que o balé passou a integrar a rotina das jovens, até a maneira como elas se comportam mudou. Um bom exemplo é Kethellyn. A garota de 9 anos começou a dançar aos 6, um dia quando precisou pegar um caminho alternativo na comunidade, descobriu o projeto.

"Eu desci pela comunidade por um caminho que geralmente não passava, porque naquele dia havia tiroteio. Quando nós descemos perto da pista, ela (Kethellyn) viu que tinha balé no projeto e quis experimentar", conta Rafaela Dias, mãe da menina.

Na época, Kethellyn passava por problemas emocionais. Com o afastamento do pai, a menina desenvolveu depressão, tinha dificuldade de se alimentar e até de permanecer na escola. "Nenhuma escola queria mantê-la, por causa do problema dela. Na primeira semana que ela entrou no Vidançar e passou a se entrosar com as meninas, se encontrou. Mudou completamente o seu comportamento. Ficou alegre", diz Rafaela.

Muita disposição

E não foi só a vida de Kethellyn que foi transformada pela dança. Quem vê Bianca Natália acordando cedo e animada para ir à aula de balé, mesmo isso custando enfrentar o transporte público lotado, não imagina que, antigamente, a menina tinha dificuldades para acordar cedo para ir à escola.

Bianca, que segundo a mãe, Noemi Vicente, sempre teve inclinação para ser artista, encontrou na dança a realização pessoal, nos tão recentes 8 anos.

"O balé deu a ela responsabilidade e disciplina. Hoje em dia, não mando a Bianca estudar para prova, não mando ela fazer trabalho, não cuido da roupa de balé dela. Quem tem o compromisso com as coisas dela é ela mesma. E isso ela conseguiu através da dança. Ela se encontrou e está vivendo um sonho", conta Noemi.

Ser um dos poucos pais em um meio tão feminino pode causar incômodo para alguns, mas para Diogo Carvalho, vale tudo para realizar o sonho da filha, Ingrid Vitória. Até mesmo trabalhar no período da noite e, sem dormir, chegar em casa e, imediatamente, levar a garota para a aula de dança. 

"É uma correria, tem que ir trabalhar, levar para a escola, depois o balé. Às vezes eu fico sem almoçar porque não dá tempo. Mas não meço esforços, faço tudo para vê-la feliz. Ela está realizando um sonho. Ela quer seguir carreira como bailarina e eu estou aqui para apoiá-la no que for", conta Diogo Carvalho, pai de Ingrid Vitória.

Projeto passa por dificuldades

Foi graças ao projeto do Alemão que elas conseguiram apadrinhamento para pagar uniforme da escola de dança do Theatro Municipal e custear a passagem para frequentar, de segunda à sexta-feira, as aulas no

Centro. Os gastos, inclusive, chegaram a ser preocupação das mães. "Quando a Bianca passou na prova do Municipal, eu fiquei muito feliz, mas ao mesmo tempo tensa. Porque ela tinha feito a parte dela, mas fiquei com medo de não conseguir cumprir a minha parte por falta de dinheiro", disse.

Sair de uma comunidade e passar a frequentar um espaço de alta cultura mudou a percepção de vida das meninas e dos responsáveis delas. "É outro ambiente. Nós vemos que somos gente, somos reconhecidos. As pessoas de fora acham que quem mora na favela é parente de bandido, mas não é assim. Na favela tem muita gente boa. E quando nós chegamos em um lugar desses, nos sentimos alguém, parte de alguma coisa. Também estamos vivendo um sonho. Quando eu ia imaginar que uma menina de um projeto do Alemão estivesse prestes a dançar no palco do Municipal?", se orgulha a mãe de Ingrid.

"Acham que nós que moramos lá somos pessoas ruins. Lá tem pessoas que trabalham, que correm atrás, que têm sonhos. Que podem ser qualquer coisa. E elas provam isso", completa Rafaela, mãe de Kethellyn.

De segunda à sexta-feira as meninas fazem aula no Municipal, mas o Vidançar não foi esquecido e, aos sábados, é a vez delas irem para as aulas no Alemão. Mesmo revelando talentos, o projeto passa por dificuldade. "O Vidançar precisa de um espaço próprio. Eles estão em um local emprestado pela prefeitura, mas é complicado. Tudo vai resistindo com muita dificuldade", explica Rafaela

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