Alegoria da São Clemente neste Carnaval ironizou as viradas de mesa da Liesa. Na plenária, a agremiação votou a favor da permanência da Imperatriz - BANCO DE IMAGENS
Alegoria da São Clemente neste Carnaval ironizou as viradas de mesa da Liesa. Na plenária, a agremiação votou a favor da permanência da ImperatrizBANCO DE IMAGENS
Por O Dia
Rio - Ao beneficiar a Imperatriz Leopoldinense em mais uma virada de mesa no Grupo Especial - a terceira em três anos -, a Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa) provocou uma crise no Carnaval carioca. Além de pagar multa de R$ 750 mil pela mudança no resultado oficial, a entidade terá que lidar com a perda de credibilidade, além da instabilidade provocada pela renúncia do presidente Jorge Castanheira. O racha divide as agremiações em dois blocos, as que votaram contra e as que foram a favor da decisão.
O promotor do Ministério Público Rodrigo Terra já declarou que irá à Justiça para reverter a decisão. “Eles não podem desrespeitar o que está escrito. Eu avalio como uma audácia”, afirmou Terra, referindo-se ao acordo firmado, em 2018, entre o órgão e a Liesa para impedir novas viradas de mesa na disputa das escolas de samba.
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Gabriel David, filho de Anísio Abrahão David, patrono da BeijaFlor, fez duras críticas, pelo Instagram, à Liesa e às agremiações que votaram a favor da permanência da Imperatriz: “O que alguns demoraram uma vida inteira para construir e deixar de legado para toda uma nação, outros se prestam a tentar destruir”, escreveu ele. “Que a luta pela volta da credibilidade seja ainda mais forte”, acrescentou.
Em repúdio à decisão da Liga, a Beija-Flor cancelou o evento de lançamento de seu enredo de 2020, previsto para domingo. Gabriel também revelou que pretende conversar com as outras quatro escolas que votaram contra a virada de mesa para decidir o futuro do espetáculo. São elas: Mangueira, Portela, Viradouro e Vila Isabel.
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Capitão Guimarães, ex-presidente da Vila e patrono da Viradouro, disse para quem quisesse ouvir, na plenária da Liesa que mudou o resultado, na segunda-feira, que “se continuar assim a Liga não dura dois meses”. Presidente da Imperatriz, Luiz Pacheco Drummond ficou do outro lado, unido a Mocidade Independente, Salgueiro, Unidos da Tijuca, Estácio de Sá, União da Ilha, Grande Rio, São Clemente.
Nos bastidores, a justificativa de Luizinho foi atribuída à mudança de comando da Lierj, organizadora da Série A. Há cerca de dez dias, Wallace Palhares assumiu a direção, no lugar de Renato Thor. “Há certa incerteza no Grupo de Acesso, porque não é uma clássica liderança do Carnaval. Luizinho sentiu medo”, afirmou Fábio Fabatto, especialista da festa e jurado do prêmio Tamborim de Ouro, do jornal O DIA.
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Logo após o resultado do Carnaval, em março, Luizinho havia garantido que valeria a regra do rebaixamento. “Não tem virada de mesa. Será que os 54 juízes erraram? Não. Tem que respeitar. Quem errou foi a escola”, pontuou Luizinho, na época.
Por nota, o presidente da Lierj se defendeu. “A Lierj nada tem a ver com o que aconteceu na Liesa. Particularmente, acredito que a virada já iria acontecer. A Imperatriz nunca compareceu às reuniões (da Série A), independentemente da presidência. As escolas conseguiram que eu fosse eleito de maneira legítima, em processo totalmente democrático”, ponderou Palhares.
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MUDANÇA DE MODELO
Para Fabatto, é o maior racha da história da Liesa: “Afeta completamente a credibilidade da festa, que já está com dificuldades para conseguir patrocinadores. Foi um tiro no pé da Liesa e expõe a necessidade de mudança do modelo do Carnaval”.
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O jornalista Aydano André Motta, também jurado do Tamborim de Ouro, acredita que a sobrevivência da Liesa está ameaçada. “Agora, o prefeito Marcelo Crivella tem todos os argumentos para não dar mais um ‘tostão’ para o desfile. As escolas não respeitam o regulamento. O mundo do Carnaval ainda funciona no compadrio”, afirmou ele.
Salvo em 2018 pela virada de mesa junto com a Grande Rio, o Império Serrano, mais uma vez rebaixado, não vai contestar a decisão da Liesa, que agora só beneficiou a Imperatriz, penúltima colocada no resultado oficial. “Foi um decisão do plenário da Liga, que é soberano”, disse o vice-presidente de Carnaval da escola, Paulo Elias, que não quis comentar por que não foi votada a permanência também da agremiação de Madureira: “Isso deve ser perguntado aos representantes das escolas que votaram a favor do retorno da Imperatriz”.
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Com a saída de Castanheira, os nomes para assumir a presidência da Liesa já são cogitados. Entre eles, Ubiratan Guedes, presidente do Conselho Deliberativo da Liga; e o vice-presidente da entidade, Zacarias Siqueira de Oliveira. Também são citados o vice-presidente da Mocidade, Rodrigo Pacheco, e Regina Celi, ex -presidente do Salgueiro e integrante do Conselho Fiscal da Liesa. “Acredito que vá emergir uma nova liderança da Liesa. O Carnaval é construído na tensão, e esse é mais um capítulo do comando da Liga”, avaliou Fábio Fabatto.
Promotor: ‘Essa situação cria falta de confiança’
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Ano passado, após a Liesa permitir que a Grande Rio e o Império continuassem no Grupo Especial, um acordo foi firmado entre a Liga e o MPRJ para que escolas de samba não sejam mais beneficiadas após a decisão final em rebaixá-las. A multa prevista para o descumprimento do termo é de R$ 750 mil.
“Essa situação cria uma instabilidade, uma falta de confiança. Há o descumprimento da promessa de que
haja uma competição, o consumidor compra o ingresso para ver isso. Se o regulamento passa a não valer, o desfile deixa de ser uma disputa”, explica o promotor Rodrigo Terra, representante do MP na assinatura do acordo.
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A negociação teve a participação das prefeituras de Duque de Caxias e do Rio. Jorge Castanheira, que assinou o documento como representante da Liesa, renunciou após a virada de mesa de segunda-feira. Terra cobrou respeito ao acordo assinado no ano passado: “Eles não compreendem a relevância do
termo. Nada impede que eles façam a festa de outra maneira, mas vale o que está escrito e isso precisa ser respeitado.”
Opiniões divididas até em Ramos, reduto da escola
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Até no berço da Imperatriz, o bairro de Ramos, na Zona Norte, a decisão da Liesa causou polêmica. No balcão do bar do comerciante Gabriel Ribeiro, de 40 anos, o assunto deu caldo. “A Imperatriz merece essa segunda chance, pois é a salvação do nosso bairro. Quando tem samba por lá, eu vendo bastante. Ela é a nossa escola”, bate no peito o comerciante, puxando a sardinha para a Imperatriz.
Já o gari Paulo Antunes, de 49 anos, criticou: “Não acho certo virar a mesa. Se desceu, como vai subir assim? Tantas outras escolas tradicionais desfilaram no Grupo de Acesso. A Imperatriz não poderia ter aceitado isso”.