A professora Gisele Lopes Guerra Gaspar, de 37 anos, com os filhos, André, de cinco anos, e Arthur, de dois anos - Arquivo Pessoal
A professora Gisele Lopes Guerra Gaspar, de 37 anos, com os filhos, André, de cinco anos, e Arthur, de dois anosArquivo Pessoal
Por ANA CARLA GOMES
Na casa da professora Gisele Lopes Guerra Gaspar, de 37 anos, em Duque de Caxias, o início do isolamento social provocado pela pandemia da covid-19 foi marcado pela angústia de explicar diariamente aos filhos, André, de cinco anos, e Arthur, de dois, que não iriam mais à escola. “Eles adoram o ambiente. Para mim, era um momento de cuidar da casa e fazer yoga e pilates com calma, ficar sozinha, sem ser a ‘mamãe’”, lembra Gisele,que divide com o marido, o professor José Carlos Gonçalves Gaspar, de 42 anos, as tarefas da casa e das crianças para se dedicarem ao trabalho.
Essa alteração no lado emocional das mães foi refletida num estudo publicadona plataforma The Conversation. Realizado por pesquisadoras do Departamento de Sociologia e Antropologia Social da Universidade de Valência, na Espanha, por telefone e questionários online, a pesquisa apontou que mães de crianças pequenas são as mais afetadas pelo estresse em meio à pandemia.“Achamos que era necessária uma análise das dificuldades enfrentadas pelas mulheres que precisam combinar os encargos familiares com o horário de trabalho, por home office. Muitas trabalham enquanto cuidam das crianças e algumas têm a sensação de trabalhar o dia todo”, defende Empar Aguado Bloise, uma das autoras.
Publicidade
Diante das incertezas, Gisele reconhece o privilégio de estar em casa e, com o tempo, organizou a rotina, notando que as crianças estão mais tranquilas. “Temos a hora do quintal pela manhã, de tarde alguma atividade dirigida com eles e as tarefas da escola e, à noite, o videogame. Temos as terapias do André duas vezes na semana.Ele tem feito teleatendimento com a fono e com a terapeuta ocupacional e se adaptou superbem, fica empolgado. Meu suporte é mais tecnológico porque ele entende os comandos e se faz entender bem”, conta Gisele, sobre o filho mais velho, que está dentro do espectro autista.
Até para quem tem filhos maiores, a tarefa não vem sendo fácil. A procuradora do estado Natália Amitrano Vargas, de 42 anos,conta que as filhas, Luiza, de 13, e Maria Manuela, de 10, exigem mais a sua atenção neste momento, até por contas das atividades online. “Cada um da família fica no seu notebook, mas toda hora ouço ‘manhê’”, diz. Ela explica que a mais velha se vira melhor com as tarefas escolares. “A menor demanda demais. Para tudo. A plataforma da escola é bem difícil, mas ela vai se habituando.Tem muitas dúvidas e gosta que faça com ela as pesquisas de História e Geografia e também gosto. Quer me mostrar tudo e, em geral, trabalho ao lado dela”, conta Natália,que também é mãe de Gabriel, de 23 anos.
Publicidade
A professora Pappila Bittencourt Oliveira, de 38 anos, mãe de Gustavo, de 13, trabalha em duas escolas particulares e mostra que, mesmo com o filho sendo mais velho,é inevitável o cansaço mental pelo acúmulo de tarefas em casa. Apaixonada pelo Magistério, ela teve de se adaptar à nova realidade com videoaulas. “Como fazer uma coisa que nem sabia como começar? Foi um desespero, mas fluiu. Estou nas aulas ao vivo e me sinto exausta”. A antiga rotina tem feito falta: “Quando saía para trabalhar e o Gustavo para estudar, nos víamos pela manhã e pela noite. Ele tinha várias coisas para contar e nem me esperava entrar em casa direito”.
Gisele Guerra, mãe de André e Arthur
Publicidade
Meu marido e eu dividimos as tarefas por afinidade. Cozinho, mas ele cuida da roupa. Com as crianças, fico com as tarefas da escola e, ele, com o banho e a comida. Ele sai para fazer compras. Revezamos nas brincadeiras no momento de fazer as tarefas dos nossos respectivos empregos. E ele tem trabalhado muito mais em casa porque faz hora extra em projetos na Secretaria de Educação. Tiro toda a noite uma hora pra fazer yoga com meu professor Felipe pelo Instagram. É o meu momento e tem sido importante para segurar a ansiedade e movimentar o corpo. Comemoramos 10 anos de casamento em abril. Nossos planos eram uma viagem a Maragogi, em Alagoas, com os meninos,e tivemos que adiar. Mas comemoramos em casa com eles. Pedimos uma comida,tomamos um vinho e vimos ‘Patrulha Canina’ depois (risos)”.
Natália Amitrano Vargas, mãe de Luiza e Maria Manoela
Publicidade
Resta pouquíssimo tempo para brincar e promover atividades em família, daquelas que a gente fica romantizando e pensando em fazer quando ficar mais tempo em casa. As meninas ajudam nas tarefas de casa,meu marido divide comigo muita coisa,mas mãe é quem fica no front. Somos brincalhões, cozinhamos juntos e aproveitamos para rir. Os animais — dois gatos e um cachorro — nos divertem. É tão bom sentar exausta no sofá e ficar vendo filmes com elas e meu marido. Aí surgem nossas piadas internas. Elas têm dormido mal e eu pior ainda. Depois que todos dormem, às vezes vou pendurar roupa ou arrumar a sala. Já virei a noite trabalhando. Não dá tempo dos tais cursos online,de aprender um novo prato nem de criar novidades com os filhos, mas temos rido,comido bobagens e desrespeitado algumas regras para ter paz”.
Pappila Bittencourt Oliveira, professora e mãe de Gustavo
A professora Pappila Bittencourt Oliveira, de 38 anos, com o filho, Gustavo, de 13
A professora Pappila Bittencourt Oliveira, de 38 anos, com o filho, Gustavo, de 13fotos Arquivo Pessoal
Publicidade
"Tenho um filho de 13 anos que precisa de cobrança constantemente. Um adolescente que está na fase de não gostar de nada, literalmente. Preciso acordá-lo todos os dias para assistir às aulas e escuto:“Que saco, mãe!”. Nos fins de semana,procuro olhar as atividades dele e as dos meus alunos. Tento sempre sentar com ele durante as refeições e mostrar que, mesmo trabalhando muito, eu o amo e precisamos desse momento juntos. Sobre a casa, faço o que posso.Meu marido ajuda muito. Dividimos as tarefas e ele compreende bem o meu trabalho. Estou extremamente estressada e cansada mentalmente. Quando termino as minhas aulas, deito no sofá e relaxo. Eu me permito ficar pelo menos uma hora assim, sem fazer nada.Às vezes, durmo (risos). Depois, volto à minha rotina, ligo o computador, corro para a cozinha, vejo as coisas do cachorro (Trovão). Nos fins de semana, procuro adiantar meu trabalho e tirar as tardes para descansar. Às vezes, faço uma hidratação e vejo televisão com o Gustavo. Está sendo muito ruim passar por essa situação,mas vamos vencer!"