O Brasil é atualmente o epicentro da covid-19 no mundo, com uma morte a cada minuto. Para piorar nossa preocupante realidade, falta transparência na divulgação dos dados oficiais da doença. Desde quarta-feira, o Ministério da Saúde tem liberado os números de casos e de óbitos do novo coronavírus somente depois das 22h. A decisão teria partido do próprio presidente Jair Bolsonaro, como forma de evitar que os índices fossem veiculados nos telejornais noturnos. Ontem, segundo levantamento do G1, com base nas informações das secretarias estaduais de Saúde, foram registradas 35.033 vítimas fatais, com um total de 643.766 casos.
Segundo o infectologista Alberto Chebabo, a divulgação é um dever do Ministério da Saúde, que deve ser transparente. "O atraso na liberação demonstra desorganização ou é proposital, para reduzir o impacto da divulgação pela imprensa, já que, muito tarde da noite, diversos meios de comunicação não conseguem divulgar os dados nos telejornais ou mesmo na mídia impressa. Atraso é um desserviço à população", apregoa Chebabo, diretor-médico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho.
Opinião semelhante tem a geriatra e psiquiatra Roberta França. Segundo ela, na gestão do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, os boletins saíam na coletiva de imprensa, à tarde. Depois, com o então ministro Nelson Teich, eram divulgados no fim da tarde, início da noite. "A medida mostra mais uma tentativa do governo de mascarar os números reais, confundir a população. Quando você divulga à noite, de madrugada, parece uma tentativa de quanto menos pessoas tiverem acesso, melhor. Afinal, menores são as chances das pessoas se revoltarem, questionarem. Porque antes era feita de uma forma muito mais clara, direta", lembra.
Para a pesquisadora Chrystina Barros, do Centro de Estudos em Gestão de Serviços de Saúde, da UFRJ, a falta das coletivas de imprensa é um ponto crucial. "Nelas, tiravam-se dúvidas, era possível o debate e entender até mesmo a dificuldade de informações. Esse é o ponto que nós mais perdemos na medida que deixou de ter um fórum, com pessoas técnicas e qualificadas, que não só tiravam as dúvidas, como davam encaminhamentos e diretrizes. Perdemos muito da discussão e orientações técnicas, com transparência e clareza", avalia.
O Ministério da Saúde, comandado há 23 dias pelo general Eduardo Pazuello, que só na última quarta-feira foi nomeado ministro interino, não se pronunciou sobre o assunto.