
Com a expansão da pandemia do coronavírus em todo o país, as comunidades quilombolas vivem um cenário crítico com proliferação de casos e aumento no número de mortes. Dados da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), junto com as organizações quilombolas estaduais, indicam que os casos de infecção já chegam a 2.590 e o de mortes é de 127 em territórios de 20 estados. O Rio é o estado com maior número de óbitos, 36, seguido do Pará, com 35, e do Amapá, com 16.
As lideranças no Rio têm feito um trabalho semanal para levantar dados para agrupar com os da Conaq.
"A gente faz um levantamento semanal e em apoio com a Secretaria de Saúde. Fazemos uma reunião toda sexta-feira. Somos 50 comunidades remanescentes do quilombo que precisam mais do que reunião, mas de um plano de ação urgente do estado e município juntos", afirma Ivone Mattos, presidente da Associação das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio (Acquilerj).
Para Rejane de Oliveira, coordenadora da Conaq pelo Rio de Janeiro, que apresenta também a segunda posição no número de contaminados, atrás apenas do Pará, o coronavírus veio para mostrar o descaso e ausência das autoridades com os territórios quilombolas.
"Não é de hoje que enfrentamos uma dificuldade tremenda, sem um atendimento digno. Há a falta de políticas públicas voltada para nosso povo e o cuidado com a comunidade. A população negra enfrenta esse período com mais dificuldade ainda. O estado devia ter feito um plano para as comunidades", afirma ela.
Além da ausência do estado, há a dificuldade de deslocamento dos quilombolas para os centros de atendimento em saúde, falta de testes e a subnotificação de casos, como alerta a Conaq.
Entre os quilombos que foram contabilizados com óbitos estão o Sacopã, Ilha de Marambaia, Camorim e Rio da Prata, na capital. Há, ainda, os no interior do estado: Lagoa Fea, em Campos; Maria Romana, em Cabo Frio; e Rasa, em Búzios. Esse último vitimou uma liderança atuante pela causa: Tia Uia, matriarca do quilombo, morreu em junho. "Ela era uma inspiração, grande mulher quilombola que lutou pela terra. Foi através dela que comunidades se autodeclararam, por sua garra e sua batalha", afirma Rejane, sobrinha da líder, que faleceu aos 79 anos.
Tia Uia morava com a mãe, a Vó Eva, de 110 anos. "Ficamos preocupadas, é claro, e queríamos testes para elas e demais quilombolas que vivem com parentes que tiveram coronavírus", afirma Ivone.