Grupos paramilitares ocupam 58,6% do território da capital fluminense. Organização criminosa ainda está em outros 199 bairros da Região Metropolitana
Operação mirou quadrilha que extorquia comerciantes em Madureira. Bando era formado por milicianos, traficantes, GMs, PM e servidoresReginaldo Pimenta
Por Anderson Justino
Dos 163 bairros da capital fluminense, 41 deles estão sob o domínio de grupos paramilitares. É o que aponta pesquisa inédita feita em parceria entre o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (Geni/UFF), o datalab Fogo Cruzado; o Núcleo de Estudos da Violência da USP; a plataforma digital Pista News e o Disque-Denúncia. Até o ano passado, as milícias tinham sob seu poder 58,6% da superfície territorial da cidade. Atualmente, quase 2,5 milhões de cariocas vivem sob os olhos dos milicianos.
Infográfico mostra como parte da população carioca vive sob poder da milíciaArte: Paulo Esper / O Dia
Hoje, será apresentado o mapa com a expansão territorial de cada uma das principais organizações criminosas presentes no estado e o novo cenário de confrontos, no 1º Seminário da Rede Fluminense de Pesquisas sobre Violência, Segurança e Direitos - Milícias, grupos armados e disputas territoriais no Rio de Janeiro. O evento terá transmissão ao vivo pelo Youtube e terá início às 14h.
O pesquisador Daniel Hirata, que participou do mapeamento, diz que os grupos paramilitares seguem forte na Zona Oeste. A disputa por território se estende para outras regiões, como a Zona Norte.
"A pesquisa durou cerca de um ano e meio. Foram 37 mil denúncias que nos levaram a esse mapeamento. Sabemos como esses grupos atuam, mas o que nos assustou foi essa expansão rápida das milícias. Em tão pouco tempo eles ocuparam um território muito grande", explica o pesquisador.
Das 148 comunidades no Rio, 96 delas estão divididas entre o tráfico de drogas e a milícia. Outras 52 estão sob disputa. "A gente não pode precisar como será esse território em dez anos, mas temos a certeza de que a milícia vai continuar com esse crescimento. Diferente do tráfico, os grupos paramilitares estendem seus ramos de trabalho", diz o pesquisador.
Enquanto a milícia segue avançando na capital, o cenário não é diferente nas cidades da Região Metropolitana. O mapeamento mostra que os paramilitares estão presentes em mais 199 bairros, espalhados pela Baixada Fluminense, São Gonçalo e Itaboraí. As três facções do tráfico juntas somam 246 bairros.
Apesar de vários núcleos formados, um dos principais grupos milicianos, a Liga da Justiça, é chefiado por Wellington da Silva Braga, o Ecko, de 34 anos. Ele é o responsável pela expansão desse tipo de crime. O criminoso é foragido da Justiça. O Disque-Denúncia oferece recompensa de R$ 10 mil por informações que levam à sua prisão.
"Segundo o mapa, as milícias entram em disputas territoriais violentas e atuam em territórios cada vez mais extensos, onde controlam esses bairros ilegalmente, cobrando taxas extorsivas sobre os mercados de serviços essenciais como água, luz, gás, TV a cabo, transporte e segurança, além do mercado imobiliário", ressalta Hirata.
MILÍCIA X POLÍTICA
Investigações da Polícia Civil apontam que é cada vez mais forte a tentativa da milícia entrar na política. Para as eleições municipais desse ano, a instituição montou uma força-tarefa responsável por investigar a ação de grupo paramilitares na indicação de alguns candidatos.
Conforme publicado na edição de ontem de O DIA, a Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) vai convocar, a partir de hoje, candidatos às Eleições de 2020 para cargos municipais na Zona Oeste do Rio e na Baixada Fluminense para prestar depoimento.
O objetivo é esclarecer um possível relacionamento entre os políticos e a milícia.
Somente neste mês de outubro, dois candidatos à Câmara Legislativa de Nova Iguaçu foram assassinados. Um deles, Domingos Barbosa Cabral, era suspeito de envolvimento com a milícia. Ambos já haviam sido presos.
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MORTES COMETIDAS POR POLICIAIS CHEGOU A 30% NO ANO PASSADO NO RIO
O relatório Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostrou que o Brasil atingiu o maior número de mortes em decorrência de intervenções policiais desde que o indicador passou a ser monitorado pelo órgão, em 2013.
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Os Rio de janeiro e São Paulo lideram o ranking, com respectivamente 867 e 1.810 mortes por intervenções de policiais civis e militares no último ano. A cada cem mortes violentas, 13 foram cometidas com a presença dos agentes de segurança. No Rio de Janeiro, essa proporção chegou a 30,3%.
Vale ressaltar, que no primeiro semestre deste ano, quando o país foi atingido pela crise sanitária da pandemia da Covid-19, as mortes por intervenção policial vitimou 3.181 pessoas. Um crescimento de 6%, comparado ao mesmo período do ano passado.