Paciente estava internado no Hospital Federal dos Servidores do Estado
Paciente estava internado no Hospital Federal dos Servidores do EstadoDaniel Castelo Branco
Por Bernardo Costa
Mesmo com testes RT-PCR para diagnóstico de covid-19 em estoque no Ministério da Saúde - até o último dia 9 havia cerca de sete milhões armazenados em depósito de Guarulhos, em São Paulo -, o Hospital Federal dos Servidores (HFSE), no Rio, realizou a compra emergencial de 4.500 testes, por dispensa de licitação, para serem aplicados em pacientes e funcionários da unidade, ao custo de R$ 1,2 milhão.

Os testes em estoque do Ministério da Saúde foram adquiridos, em abril, junto a Organização Pan Americana de Saúde (Opas) e são da fabricante coreana Seegene. Os cerca sete milhões de testes têm data de vencimento na caixa entre janeiro e março do ano que vem, como foi revelado pelo Estadão. Mas tiveram o prazo estendido em quatro meses a partir de resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), publicada no Diário Oficial da União, no último dia 7.
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A questão chamou a atenção do Tribunal de Contas da União (TCU), que abriu processo para apurar supostas irregularidades na compra, armazenamento e distribuição dos testes. Segundo o TCU, o processo apura prejuízos aos cofres públicos, no valor de R$ 290 milhões, e à prestação dos serviços públicos de saúde no Brasil decorrente do vencimento do prazo de validade de milhões de testes adquiridos pelo Ministério da Saúde para o diagnóstico do novo coronavírus.
Ainda assim, mesmo com o material estocado, a compra emergencial de testes foi feita pelo Hospital Federal dos Servidores junto à empresa Promovendo Comércio e Representações de Material Hospitalar LTDA. As notas de empenho, no valor total de R$ 1,2 milhão, foram emitidas no dia 12 de novembro. E o processo de compra teve início no dia 12 de agosto, a partir de solicitação do Laboratório Central do hospital.
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O DIA apurou que os testes foram entregues à unidade, mas o hospital não confirmou em que quantidade.
"Nos últimos 20 dias foram aplicados cerca de, no máximo, 200 testes em pacientes e profissionais do hospital de forma esporádica e aleatória. Por exemplo, algum vai passar por um procedimento médico, antes essa pessoa é testada, assim como toda a equipe envolvida no procedimento. Mas, se já havia testes disponíveis no Ministério da Saúde, por que foram gastar mais dinheiro?", questiona um profissional do Hospital dos Servidores, que pediu para não ser identificado.
O profissional ainda levanta uma outra questão:
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"Houve uma ordem da direção do hospital de que a nota fiscal, quando os testes fossem entregues, seria assinada pelo coordenador de administração, e não pela chefia do laboratório, como seria de praxe. Isso chamou nossa atenção, pois pode ser algum indício de irregularidade".
HISTÓRICO DA COMPRA
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Após a solicitação dos testes pelo Laboratório Central do Hospital dos Servidores, teve início o processo de compra. Inicialmente, seriam adquiridos um total de oito mil testes, no valor total de R$ 3.412.000,00. O extrato da compra, por dispensa de licitação, foi publicado no Diário Oficial da União, no dia 5 de outubro.
No entanto, após consulta ao setor financeiro do Hospital dos Servidores, constatou-se que não havia orçamento disponível para compra do tipo. Em despacho do dia 9 de outubro, o diretor da unidade, Benito Accetta, determina o cancelamento da compra, justificando que a verba disponível da unidade era de R$ 742.238,30. O cancelamento foi publicado no Diário Oficial da União, no dia 26 de outubro.
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No dia seguinte, porém, foi publicado no Diário Oficial da União, novo processo de compra por dispensa de licitação para compra de testes pelo Hospital dos Servidores junto à mesma empresa, Promovendo Comércio e Representações de Material Hospitalar LTDA. Desta vez, a quantidade adquirida era de 4.500 testes, ao preço total de R$ 1.279.500,00.
O valor, ainda assim, é superior aos R$ 742.238,30 disponíveis em orçamento segundo o próprio diretor da unidade.
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RESPOSTA
O Ministério da Saúde informou que os testes comprados pelo Hospital Federal dos Servidores são compatíveis com o equipamento que o hospital já possuía. E que a aquisição dos testes moleculares RT-PCR para a detecção da covid-19 foi planejada considerando o cenário vigente naquele momento (em agosto), quando havia a expectativa de aumento das infecções provocadas pelo coronavírus.
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Na segunda quinzena de outubro, verificou-se uma retração significativa no número de novos casos da doença, o que levou o HFSE a revisar para baixo os quantitativos a serem adquiridos. "A unidade optou, assim, por uma quantidade de insumos suficiente para o período aproximado de três meses, ajustando o valor contratado (De R$ 3,4 milhões para R$ 1,2 milhão)", diz a nota.
Porém, o Ministério da Saúde não respondeu a uma série de questionamentos feitos por O DIA. Não respondeu por que os testes foram comprados por dispensa de licitação se havia estoque disponível no Ministério da Saúde, se houve solicitação do HFSE à pasta para o envio de testes, quantos testes ainda estão estocados em depósito do governo federal, qual é o plano de distribuição desses testes e o valor gasto pelo governo na compra.
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Também não houve resposta sobre se a quantidade de testes comprados pelo HFSE (4.500) foi entregue em sua totalidade, nem sobre a suposta determinação da direção da unidade de que a nota fiscal seria atestada pelo coordenador de administração do hospital e não pela chefia de laboratório, como seria de praxe.
O Ministério da Saúde também não explicou a disparidade entre a compra no valor de R$ 1,2 milhão e o orçamento disponível do HFSE de R$ 742.238,30, informado pelo próprio diretor da unidade em 9 de outubro.
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Também procurada, a empresa Promovendo Comércio e Representações de Material Hospitalar LTDA não confirmou se a totalidade de testes adquiridos foi entregue ao HFSE.