Traficante Peixão frequentando uma igreja  - Divulgação
Traficante Peixão frequentando uma igreja Divulgação
Por Thuany Dossares

Rio - A ideologia dos traficantes do Complexo de Israel, pode estar se expandindo para outras comunidades do Rio. De acordo com a Polícia Civil, a vertente evangélica dentro da facção Terceiro Comando Puro (TCP), do traficante Álvaro Malaquias Santa Rosa, o Peixão, na Cidade Alta, Parada de Lucas e Vigário Geral, na Zona Norte, estaria ganhando simpatizantes na Ilha do Governador.

De acordo com investigações, as lideranças do tráfico do Morro do Dendê, na Ilha, Marcos Vinicius dos Santos, o Chapola, e Mario Henrique Paranhos de Oliveira, o Neves, também do TCP, estariam pensando assumir a doutrina religiosa usada por Peixão.

"Eles são da mesma facção e se respeitam. Mas não é de hoje também que lá na Ilha o tráfico demonstra sinais de religiosidade", explicou um investigador.

O antigo chefe do tráfico na Ilha do Governador, Fernando Gomes de Freitas, o Fernandinho Guarabu - morto em confronto com a polícia em 2019 - também se declarava evangélico. Segundo a polícia, ele teria sido uma das primeiras lideranças do TCP a se converter.

Por conta de sua fé, Guarabu não permitia qualquer manifestação de religiões de matriz africana, e já chegou a ordenar a destruição de centros de umbanda, no Morro do Dendê, em 2017.

A prática foi reproduzida dois anos depois por Peixão, que também ordenou a depredação de terreiros, segundo investigações da Polícia Civil. Chapola, sucessor de Guarabu, é mais um dos traficantes que se declara evangélico e também não permite manifestações de religiões de matriz africana, segundo o promotor do Ministério Público, Sauvei Lai.

Profeta da Bíblia

Segundo a Polícia Civil, a religiosidade de Peixão é tamanha que ele se intitula de Arão, o profeta de Deus, irmão de Moisés. O nome foi assumido também pela sua quadrilha que se autodenomina "Tropa do Arão". O próprio nome, Complexo de Israel, seria uma referência a terra prometida, de acordo com as investigações.

Outro exemplo da religiosidade de Peixão está nos símbolos usados para marcar seus territórios: a bandeira de Israel e a estrela de Davi. Esses símbolos geralmente estão colocados em pontos altos das comunidades. Um exemplo está na Cidade Alta, onde foi instalada uma estrela de Davi que pode ser vista há mais de 2,5 km de distância.

Segundo a polícia, a bandeira de Israel tem sido usada também em comunidades gerenciadas pelo TCP em Guadalupe, na Zona Norte do Rio, e até em Angra dos Reis.

 

Complexo de Israel na Baixada
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Agentes da Delegacia Especializada em Armas, Explosivos e Munições (Desarme) apuraram que Peixão tem sob seu comando cerca de 300 soldados, divididos entre a Cidade Alta, Parada de Lucas, Vigário Geral, Pica Pau e Cinco Bocas - comunidades que formam o Complexo de Israel, na Zona Norte. A "Tropa do Arão" possuiria cerca de 200 fuzis.
Investigações apontam que a gestão de Peixão já se estendeu para Baixada Fluminense. Segundo o delegado Gustavo Castro, titular da Delegacia de Combate às Drogas (DCOD), Parada de Lucas e Vigário Geral são os fornecedores de drogas das favelas do Buraco do Boi, em Nova Iguaçu, e Parque Paulista, em Duque de Caxias.
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Em 2019, Peixão foi acusado de ordenar ataques à terreiros na Baixada.
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Peixão também fez aliança com a milícia
Um dos objetivos de Peixão, a invasão ao Complexo da Penha, reduto de criminosos do CV, parece ter tido uma nova etapa no fim de 2020, quando a quadrilha liderada pelo traficante se uniu a milicianos de Brás de Pina. O pacto rendeu a Álvaro o comando da venda de drogas nas comunidades Quitungo e Guaporé.
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A união foi descoberta pela Polícia Civil durante a investigação de um homicídio na localidade do Dourado, onde apenas a milícia do Quitungo atuava até então. As vítimas José Mário Alves da Trindade, o Cebolão, e Jhonatan Batista Vilas Boas Alves, o Cepacol, seriam milicianos descontentes com o pacto entre os paramilitares e o TCP.
Segundo as investigações, o acordo promoveu uma união de forças entre os grupos, para que um defendesse o outro e se protegesse em caso de tentativas de invasão a áreas dominadas pelos rivais. Além disso, a gangue do Peixão ficou com o domínio da venda de drogas e abertura de bocas nas áreas da milícia.
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Um morador da região, que preferiu não se identificar, relatou que localidades como a Guaporé onde não havia tráfico passaram a conviver com essa realidade nos últimos meses. "Até circular por lá ficou esquisito. Você precisa dizer para onde vai e de onde vem", disse.
Com as novas áreas sob a influência da facção, a proximidade com o Complexo da Penha diminuiu. Segundo medição feita via Google Maps, a favela da Guaporé está a menos de 1 km do morro do Sereno, que é dominado pelo CV.
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