Tia Glorinha, do Salgueiro, e baianas na quadra da escola - Luciano Belford/Agencia O Dia
Tia Glorinha, do Salgueiro, e baianas na quadra da escolaLuciano Belford/Agencia O Dia
Por MARTHA IMENES
Os deslumbrantes desfiles do Sambódromo, no Rio de Janeiro, deram lugar ao vazio iluminado por um show de luzes coloridas, que vão acender até sábado em homenagem às vítimas da covid. Com as cores de cada uma das escolas de samba, a Marquês de Sapucaí e a Apoteose serão iluminadas até meia-noite todos os dias. A pandemia de coronavírus, além da crise sanitária e econômica, trouxe um grande desalento aos foliões do Rio de Janeiro: o giro mágico das baianas que empolga arquibancadas e camarotes este ano será dentro de casa. A tristeza só não é maior porque o amor pela escola e a expectativa de 2022 acalentam o coração.
O DIA conversou com baianas da Mocidade Independente, Salgueiro, Mangueira, Portela e Unidos da Tijuca. Todas trazem consigo a esperança da vacinação contra a covid, contam sobre suas origens e deixam seu recado aos foliões que estão desolados com o adiamento da Folia de Momo.
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"Até o tempo está triste com a falta do Carnaval", lamenta Nelcy Moraes, 55 anos, responsável pela ala das baianas da Mangueira, se referindo ao céu cinza e a chuva que cai na cidade. Neta de D. Neuma, Nelcy desfila há 35 anos na escola. Ela conta que é nascida e criada no Morro da Mangueira, mas hoje vive em Belford Roxo, na Baixada Fluminense.
Nelcy Gomes, da Estação Primeira de Mangueira - Divulgação
Nelcy Gomes, da Estação Primeira de MangueiraDivulgação
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Nelcy começou a desfilar de baiana aos 15 anos em 1984 e sua entrada na avenida foi uma punição muito bem dada. "Estudava em colégio de freiras e só passei em religião. A minha mãe, como castigo, me colocou pra sair de baiana! Foi melhor castigo até hoje", ri Nelcy.
Lembranças à parte, a baiana diz que está triste, mas alerta que manter a saúde vem em primeiro lugar. "O Carnaval é minha vida! Amo o que faço, mas saúde primordial, sem ela nada podemos fazer", afirma.
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Tia Nilda da Mocidade Independente - Reprodução
Tia Nilda da Mocidade IndependenteReprodução
Conhecida como Tia Nilda, a baiana Nilda Silva, 78 anos, moradora de Bangu, diz que a decisão de adiar os desfiles foi acertada: "Desfilo há 40 anos como baiana na Mocidade Independente de Padre Miguel, é claro que vou sentir falta. Mas entrar na avenida sorrindo e girando num momento desse, não seria a mesma coisa. Perdi muita gente pra covid, o país tem milhares de mortos, essas pessoas merecem respeito", afirma Tia Nilda. E complementa: "Nós temos que respeitar e ter empatia com as famílias enlutadas".
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Tia Glorinha, ou Maria da Glória Lopes de Carvalho, tem 74 anos, nascida e criada no Morro do Salgueiro. Desfila desde 1963, conta que o seu primeiro enredo foi Xica da Silva. "É o meu maior prazer, não posso ouvir esse samba!", relembra. A baiana com 58 anos de Marquês de Sapucaí mostra esperança em relação à vacina.
Tia Glorinha, do Salgueiro, e o giro das baianas na quadra da escola - Luciano Belford/Agencia O Dia
Tia Glorinha, do Salgueiro, e o giro das baianas na quadra da escolaLuciano Belford/Agencia O Dia
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"Estou triste, mas temos que cumprir a ordem. É tudo como Deus quer e nada como a gente quer. Já se passou um ano (que o mundo sofre com a pandemia) e agora é só a gente aguardar, que vai ser mais fácil. Com a vacina vai ser melhor", acredita Tia Glorinha, que vai ficar em casa assistindo os desfiles antigos e fazendo um Carnaval no quintal com as crianças.
Jane Carla, da Portela, herdou o amor pela Azul e Branca de Madureira da avó e da mãe. Passou para os filhos e agora pra os netos - Léo Cordeiro/Divulgação
Jane Carla, da Portela, herdou o amor pela Azul e Branca de Madureira da avó e da mãe. Passou para os filhos e agora pra os netosLéo Cordeiro/Divulgação
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Entre uma live aqui, uma gravação ali, Jane Carla de Azeredo de Andrade, 55 anos, moradora de Madureira, presidente da Ala das Baianas da Portela, bateu um papo com O DIA. "É com muita tristeza que não vamos desfilar esse ano", lamenta. "Vamos ficar em casa brincando o Carnaval em família", diz Jane Carla que herdou o amor pela Portela da avó e da mãe. Hoje esse amor já passou para seus filhos e netos.
Baiana há 15 anos, Rita Sampaio Silvestre, da Unidos da Tijuca, 55, de Santa Teresa, concorda que foi necessário o adiamento. "Este momento é difícil pra todos nós sambistas, mas temos que compreender que é melhor para todos não ter Carnaval esse ano, mas sim ter saúde! Sem contar que temos em nossa escola e nas coirmãs muitos idosos e não queremos colocar ninguém em risco", diz.
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Rita Sampaio Silvestre, da Unidos da Tijuca - Divulgação
Rita Sampaio Silvestre, da Unidos da TijucaDivulgação
Uma curiosidade: sabem de onde vem o giro das baianas? Segundo a professora Eliane Santos Souza, que é comentarista de Carnaval, vem dos passos de ijexá. "Toda a performance das baianas na avenida, com seus passos miúdos, são oriundos da cultura africana, dos orixás femininos", explica. "As baianas são o simbolismo da africanidade no Rio de Janeiro", finaliza a professora.