Kathlen estava grávida de quatro meses quando foi mortaDivulgação
A modelo de 24 anos é uma das 1.000 vítimas de balas perdidas nos últimos seis anos no estado do Rio, de acordo com um levantamento realizado pelo Instituto Fogo Cruzado divulgado nesta terça-feira (10). Para Jackeline Oliveira, mãe de Kathlen Romeu, o número de atingidos poderia ter sido evitado a partir de ações do Governo do Estado em prol da segurança pública.
As vítimas são atingidas das mais diferentes formas, seja indo para o trabalho, para a escola, visitando familiares, procurando atendimento médico ou até mesmo caminhando pelas ruas.
Casos como o de Kathlen Romeu, Ágatha Félix, Joseph Trey Thomas, Emily Victória e Rebecca Beatriz mostram que a violência no Rio não escolhe idade, hora ou local, mas vem se tornando frequente com o passar dos anos.
Entre 1.000 as vítimas dos disparos, 229 morreram e 771 ficaram feridas. Somente em 2022, 20 pessoas foram mortas e 62 feridas até a realização do levantamento.
"As ações e operações obedecem a uma lógica de conflito. As polícias não estão preparadas para evitar conflitos e isso se reflete no número elevado de vítimas de balas perdidas. Foram nove meses sem um plano de redução da letalidade policial desde que o STF determinou a elaboração de um projeto que visasse a redução de mortes pelos agentes do Estado. Esse é um passo importante para que a população do Rio de Janeiro deixe de viver à mercê de tiroteios que trazem traumas e afetam a rotina", avalia.
Dos 1.000 baleados, 624 foram atingidos na presença policial. 162 deles não resistiram e morreram. Desde 2016, o pior ano da série história foi em 2018, quando 252 pessoas foram vítimas de balas perdidas, sendo 47 mortas e 205 feridas. Neste ano, a Região Metropolitana do Rio passou por um período de Intervenção Federal, que durou 10 meses.
O homicídio doloso (intencional) apresentou a maior queda desde o início da série histórica, há 31 anos. Houve uma redução de 6,8%.
A letalidade violenta (roubo seguido de morte, homicídio doloso, morte por intervenção de agente do estado e lesão corporal seguida de morte) teve queda de 7,2%; a morte por intervenção de agente do estado reduziu 5,2%; o latrocínio diminuiu 42,3%.
Medo de bala perdida
Na cidade do Rio de Janeiro, ainda segundo relatório do Fogo Cruzando, 80% dos moradores dizem ter medo de serem vítimas de balas perdidas e 59% declararam que se mudariam da cidade caso fosse possível, revelou pesquisa do Datafolha divulgada em 2022.
Na região metropolitana, a violência está em todos os lugares e faz com que nem o próprio lar seja um lugar seguro. 108 pessoas foram vítimas de balas perdidas quando estavam dentro de casa (33 morreram e 75 ficaram feridas). Outras 25 pessoas foram atingidas quando se divertiam em bares (cinco mortos e 20 feridos). No relatório, o instituo ainda mostra que transitar pela região metropolitana também fez com que 18 pessoas fossem baleadas dentro de transportes públicos (uma morta e 17 feridas).
Os adultos, que transitam diariamente pelas cidades, são os mais afetados e representam 688 baleados entre as 1.000 vítimas. Dentre o número, 137 foram mortos e 551 ficaram feridos. Já entre a população idosa, com idade a partir de 60 anos, houve 119 das vítimas de balas perdidas e 77 morreram.
A violência desenfreada do Rio de Janeiro não atinge somente adultos e idosos, mas também crianças e adolescentes. Entre a população com idade inferior a 18 anos, 87 crianças e 92 adolescentes sofreram com as balas perdidas. Desse número, 21 crianças e 27 adolescentes não resistiram aos tiros e morreram. Houve ainda quem nem chegasse a conhecer o mundo: três bebês foram baleados quando ainda estavam na barriga da mãe e somente um sobreviveu. E 10 gestantes foram atingidas por balas perdidas: duas morreram e oito ficaram feridas.
O levantamento ainda destaca que nem mesmo estudantes e profissionais da educação dentro das unidades de ensino estavam livres de se tornarem vítimas das balas perdidas. Em pouco mais de seis anos, 16 pessoas foram vítimas: uma morreu e 15 ficaram feridas.
Maria Isabel Couto lembra ainda das consequências invisíveis dos tiroteios.
"Crianças e adolescentes em idade escolar têm o seu futuro prejudicado. As aulas são canceladas, provas são perdidas e professores e diretores precisam se preocupar com a própria segurança e a segurança de seus alunos. Incerteza, trauma e medo de serem as próximas vítimas da violência armada são efeitos diretos dos tiros que comprometem a aprendizagem. Os tiros deixam marcas, que vão além do está na pele e geram consequências que podem durar anos".
De acordo com o relatório, os trabalhadores informais também convivem diariamente com os riscos. Ao todo, nove motoboys/mototaxistas foram vítimas de balas perdidas (três morreram e seis ficaram feridos), oito motoristas de aplicativo foram baleados (metade morreu) e outros nove vendedores ambulantes também foram atingidos (um morreu e oito ficaram feridos).
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