Thiago e João Ricardo estavam atrás do casal e presenciaram toda a cenaReprodução
Novas testemunhas prestam depoimento sobre caso de racismo em samba: 'Imitando sons de macaco'
Professora argentina e um brasileiro que mora no Rio foram filmados e imagens viralizaram
Rio - Duas novas testemunhas que presenciaram o casal imitando um macaco em uma roda de samba no Centro do Rio, prestaram depoimento na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) nesta sexta-feira (26). Segundo os relatos, o homem e a mulher chegaram a imitar os sons do animal.
O empresário João Ricardo, de 37 anos, estava no samba com o amigo, o jornalista Thiago Teixeira, 37. Eles aparecem ao fundo do vídeo, próximo ao casal. Segundo João, os dois editavam um vídeo para a página deles, que atua fazendo cobertura, divulgação e entrevistas dos sambas do Rio, quando a cena teve início.
"Em um certo momento, entra no meu campo de visão o homem, que estava imitando com movimentos, e fazendo sons de macaco, eu vejo aquilo, fico muito assustado e indago meu amigo Thiago 'eles estão imitando macaco' quando olhamos juntos, percebemos que a mulher e o homem estavam fazendo o mesmo movimento", disse ao DIA.
Os amigos, que ficaram assustados e sem reação, decidiram se afastar da dupla. Mesmo depois de uma semana, as cenas não saem da cabeça de Thiago.
"Eu me senti estarrecido. Eu estou preparado para ser seguido por um segurança, quando vou a um shopping de luxo. Eu sei que a minha presença causa estranheza quando vou a um tipo de restaurante onde eu sou o único negro. Esse racismo velado faz parte do meu dia a dia. E eu aprendi a lidar com isso. Mas ao chegar em um samba, um território historicamente negro, eu tento desligar a minha atenção em relação a isso. Ninguém se sente 100% preparado para lidar com um ato de racismo assim tão grotesco, tão explícito. Isso deixa qualquer um sem reação", desabafou.
A Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) investiga o caso como racismo, após representantes do PedeTeresa, grupo que se apresentava no local, e a jornalista Jackeline Oliveira, que gravou o casal, irem até a especializada na segunda-feira (22). A dupla que aparece no vídeo durante a roda de samba é uma professora argentina e um brasileiro que mora no Rio.
"O primeiro passo foi dado. Eu acredito na lei e acredito que ela será aplicada aos dois. Além disso, nós do Que tal um samba? - em parceria com a Comissão de Combate ao Racismo e ao Grupo PedeTeresa - estamos criando uma cartilha para o público e para os produtores, seguranças, músicos e todos os que trabalham com rodas de samba. O objetivo é educar, mas principalmente ensinar a agir para que casos assim não mais se repitam", disse Thiago.
Seguranças que trabalhavam na roda de samba relataram ter visto outro argentino fazendo imitação de macacos. A organização do evento acredita que havia um grupo de estrangeiros da Argentina no evento. Eles devem prestar depoimento na próxima semana.
"Espero que a justiça seja feita, os responsáveis por esse ato sejam responsabilizados e que seja um ponto de partida para acertarmos pessoas do samba e o público de como reagir em um momento tão sério e grave como este", finalizou João Ricardo.
Argentina estava no Rio em evento
A professora argentina veio ao Rio para um evento no Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), entre os dias 15 e 19 deste mês. A Junta Diretiva Internacional do Fórum Latino-americano de Educação Musical (Fladem) pediu à seção brasileira uma investigação sobre a estrangeira e informou que os investigados não são associados e que o vídeo foi gravado quando todo o seminário já havia terminado
A Associação Orff-Schulwerk da Argentina defendeu a professora na terça-feira (23), alegando que o ato não tem conotação racista. A organização sem fins lucrativos informou que a argentina é associada há muitos anos e participou de alguns encontros, "mostrando sempre uma grande capacidade de trabalho e criatividade". A nota diz ainda que, no país, "no contexto de uma atividade pedagógica, a imitação de animais não tem conotação racista".
Ato na Praça Tiradentes
O PedeTeresa convocou um ato contra o racismo, após o caso. O evento vai acontecer no dia 2 de agosto, na Praça Tiradentes, no Centro, onde o episódio racista aconteceu.
Em um vídeo nas redes sociais, os integrantes chamaram o público para participar do ato: "A gente está aqui não só para convidar vocês para a nossa roda de samba. A gente convida vocês para o nosso ato contra o racismo (...) Racismo é crime, chegue chegando, mas chega devagar, valeu? Respeite quem pôde chegar onde a gente chegou e quando chegar no terreiro, procure primeiro saber quem eu sou".
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