Falar sobre a alma do carioca suburbano é quase falar de boteco e samba. Mas venho lembrar de um importante estabelecimento subestimado nessa questão: a padaria. Decidi escrever sobre elas quando fui fisgado pela nostalgia que me trouxe por esses dias aquela mistura de cheiros de massa assando no forno, cafezinho sendo servido em bicas atrás do balcão e fatias de algum frio sendo cortadas por um atendente.
Uma das primeiras emoções que experimentamos como crianças é ir à padaria buscar pão, ou refrigerante pro almoço, ou cerveja, ou maço de cigarro, ou tudo isso junto. A padaria precisa ser um bar ampliado ou um mercado em miniatura. Padaria que só vende pão tem algum problema de gestão. Repare bem: um dos grandes dilemas de almoço em família é exatamente quando o mais velho sai para comprar algum produto que falta para a refeição e demora horas para voltar; sai de casa às 8h da manhã dizendo que vai ao sacolão, mas chega pela rádio-fofoca que viram seu Valdir bebendo com os amigos… na padaria! E nisso já é 15h…
Para quem esquece delas, é preciso ampliar sua visão: as padarias também são verdadeiras encruzilhadas por onde passam as mais importantes figuras locais. Esperar na fila para pagar o pão com o jornal de baixo do braço e encontrar o vizinho que estava com parente doente, perguntar como estão as coisas, ou a vizinha cuja notícia do novo emprego do filho fora do Brasil já passou por todo o quarteirão, faz parte do ritual de iniciação do dia.
Muitos trabalhadores e trabalhadoras, antes mesmo de bater cartão na firma ou de encarar o transporte público, batem o cartão no balcão da padaria para degustar a preciosa dupla gastronômica pão na chapa com pingado ou média (para os iniciantes, são diferentes formas de servir café com leite).
De suas vitrines repletas de doces - geralmente cobertas de abelhas… -, passando pelas histórias de balcão ou de anúncios de venda de imóveis no local, precisaríamos ficar aqui lembrando de cada coisa que nos marca ao lembrar da vivência nesse estabelecimento.