Várias plataformas da Petrobras na Bacia de Campos têm apresentado surtos de casos de coronavírus - Divulgação
Várias plataformas da Petrobras na Bacia de Campos têm apresentado surtos de casos de coronavírusDivulgação
Por Leonardo Maia
Campos — A quarentena imposta pela pandemia do novo coronavírus levou a população em geral a experimentar os sentimentos e os dramas usuais da realidade dos trabalhadores embarcados. Ansiedade, pânico, depressão, o medo da morte, males que muitos relatam nestes tempos de isolamento socia,l fazem parte da rotina dos petroleiros que passam semanas confinados nas plataformas de petróleo. A questão é que esses profissionais também estão sujeito a essa nova ameaça, sem deixar de conviver com as outras, o que tem provocado um aumento nos casos de petroleiros com transtornos emocionais.
“Essas pessoas trabalham num vulcão, pronto para entrar em erupção a qualquer momento”, compara Maria da Graça Alcântara, assistente social do Sindicato dos Petroleiros no Norte Fluminense (Sindipetro-NF). “Mas eles já têm consciência desse risco inerente ao ofício, a possibilidade real de um acidente grave, da morte. Quando você coloca mais esse elemento (do coronavírus), a sobrecarga é intensa”.
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Além da crise da covid-19, funcionário da Petrobras estão apreensivos com a paralisação de plataformas na Bacia de Campos - Arquivo / Secom Macaé

De acordo com Maria da Graça, que passou a atender online durante a quarentena, o número de trabalhadores que a procuram triplicou no último mês. “E é importante ressaltar que é uma parcela muito pequena a daqueles que buscam contato com o sindicato”, frisa.
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Fobias, transtornos de ansiedade crônicos, estresse, angústia são sintomas usuais apresentados pelos profissionais offshore. A tendência neste cenário de contaminação descontrolada da covid-19, projeta a psicóloga Simone Braga, é que tais distúrbios se agravem perigosamente.
Petroleiros trabalham na Bacia de Campos - Petrobras - Divulgação
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“Assim como todas as doenças físicas que costuma brotar desses males da mente, como diabetes, hipertensão, enxaquecas crônicas”, destaca Simone, que trabalha há anos no atendimento desses homens e mulheres, em Campos.
Petroleiros trabalham na Bacia de Campos - Petrobras - Divulgação
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Um funcionário da Petrobras que trabalha embarcado há mais de uma década, ouvido com a condição de anonimato, confirmou que tais transtornos psicológicos são comuns, em maior ou menor grau, e que a exigência emocional leva muitos a desistir do ramo, “tanto quanto os riscos físicos”.
Em resposta à reportagem, por nota, a Petrobras informou que disponibilizou um canal de atendimento psicológico “voltado especialmente para esse período de contingência, em que o isolamento social e as mudanças ocasionadas pelas medidas de proteção podem aumentar o estresse e a ansiedade”.
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Segundo a empresa, uma equipe de psicólogos fica à disposição dos funcionários das 8h às 17h, de segunda a sexta.
Mas Ricardo Duarte, médico do trabalho que atende ao Sindipetro-NF, vê medidas como essa como pouco eficientes. Ao longo de 15 anos assistindo esses profissionais, Duarte percebeu que muitos deles, por mais abalados emocionalmente que possam estar, evitam buscar esse tipo de apoio, ou pelo menos pelos meios oficiais.
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“Eles preferem pagar um tratamento particular, mesmo podendo usar o plano da empresa, porque temem que os chefes fiquem sabendo. Ficam com receio de serem afastados, de serem obrigados a tirar licença e, pior, de serem estigmatizados por não terem suportado o estresse do ofício”, relata o médico.

“Não foram poucas as vezes que vi homens levando essa situação ao extremo, com um custo muito grande para o resto de suas vidas”, diz Duarte, que aponta o alcoolismo e o abuso de medicamentos entre as consequências possíveis.

“E são pessoas que precisam lidar com todas essas questões longe da família, num lugar isolado, de difícil acesso. Tudo isso agrava o quadro da saúde mental”, nota Maria Da Graça.

O longo tempo que passam fora de casa, afastados de mulher, marido e filhos, também é um elemento que provoca desgaste mesmo num cenário de “normalidade”. Nem todos suportam essa rotina.

“Os trabalhadores offshore já convivem com um nível de ansiedade absurdo. Risco concreto de morte, ausência da família em datas importantes, em casos de doenças dos filhos, mortes e nascimento de parentes, tudo isso gera uma angústia muito grande”, comenta Simone.

A isso se soma as mudanças forçadas pelo risco de contágio do coronavírus. Até o fim de março, os funcionários da Petrobras precisavam ficar sete dias confinados em um quarto de hotel, para garantir que não apresentassem sintomas, antes de embarcar. Depois, mais 21 dias em alto-mar, e 14 dias de folga.

“Esse isolamento do quarto de hotel se assemelha ao cárcere privado”, critica a assistente social do Sindipetro-NF. “Tivemos casos de trabalhadores que desenvolveram quadro de pânico”.

A Petrobras diz que esse isolamento anterior ao embarque agora é feito em casa, sob supervisão e acompanhamento de médicos da empresa.

Uma profissão que já era de alto risco tem se tornado quase insuportável neste novo mundo em que um inimigo invisível está em todo lugar e não pode ser contido.

Simone usa uma imagem semelhante à de Maria da Graça para descrever o nível de pressão rotineiro do trabalho nas plataformas marítimas: “Essa gente está sentada em bombas-relógio, sempre prestes a explodir”.

“O grande problema é que, além do medo de morrer embarcados, agora eles lidam com o temor de levar a morte para casa consigo”, observa a psicóloga.