Mulheres que precisaram fazer a remoção da mama por conta de câncer ou outra doença, terão direito a fisioterapia de reabilitação na rede pública de saúde do EstadoReprodução

Rio - No mês em que acontece a campanha Outubro Rosa, de conscientização contra o câncer de mama, a Câmara Municipal do Rio aprovou em segunda votação, nesta quarta-feira (13), a criação do Programa de Navegação de Pacientes (PNP) na rede municipal de Saúde. O objetivo do projeto, de autoria do vereador Dr. Marcos Paulo (PSOL), é agilizar o tratamento contra o câncer na cidade.

O PNP já foi desenvolvido de forma experimental na Clínica da Família do Andaraí, no Rio Imagem, e atualmente é oferecido no Hospital Estadual da Mulher Heloneida Studart, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. Em 2019, 27% das pacientes atendidas pelo Hospital da Mulher iniciavam o tratamento no período de 60 dias. Esse número saltou para 85% em 2020, quando o PNP foi implementado. Já na Clínica da Família do Andaraí, que desenvolveu um projeto-piloto do PNP em 2018, a taxa de cumprimento da Lei dos 60 dias passou de 10% para 52% e a taxa de cobertura mamográfica cresceu de 14% para 88%.

Atualmente, o estado tem a pior colocação no ranking nacional que mede o tempo de início de tratamento após o diagnóstico da doença. Apenas 11% das mulheres com câncer de mama no Rio conseguem iniciar tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) dentro do prazo de 60 dias, conforme determina a lei federal. A proposta agora segue para sanção do prefeito Eduardo Paes e regulamentação da prefeitura, que já se posicionou em favor da aplicação do PNP no município, com o auxílio de agentes comunitários, em um debate sobre a proposta, no último dia 27.
"O apoio do executivo ao PNP foi dado diretamente pelo secretário Municipal de Saúde, Daniel Soranz, por ocasião do Debate Público sobre o PL que fizemos na Câmara Municipal no dia 27 de setembro. Agora é trabalhar para colocar o programa em prática e agilizar o tratamento contra o câncer em nossa cidade", Dr. Marcos Paulo, que declarou que o tempo deve ser um aliado do tratamento. 
"Quando o assunto é câncer, o tempo pode ser um aliado ou um inimigo. Infelizmente os resultados de nosso estado em relação ao início do tratamento são vergonhosos. Fico muito contente de termos aprovado esse projeto durante o Outubro Rosa. Com o programa em funcionamento, o paciente será acompanhado por um profissional de saúde durante toda a jornada do tratamento, desde o diagnóstico até a alta médica. Este profissional vai auxiliar na marcação de exames, nas consultas e na emissão de laudos. Esta estratégia já deu bons resultados no Brasil e em outros países", declarou o autor do projeto de lei.
Lei dos 60 dias

A Lei 12.732, de 22 de novembro de 2012, conhecida como Lei dos 60 dias, estabelece que os pacientes diagnosticados com neoplasia maligna (câncer) receberão, gratuitamente, todos os tratamentos necessários, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). Esses pacientes têm direito de receber o primeiro tratamento no prazo de até 60 dias, contados a partir do diagnóstico em laudo patológico, ou até em prazo menor, de acordo com a necessidade terapêutica do caso registrada em prontuário único.

A legislação determina que as pessoas que sentirem dores consequentes da doença terão tratamento privilegiado e gratuito, quanto ao acesso às prescrições e dispensação de analgésicos opiáceos ou correlatos. Nos casos em que a principal hipótese diagnóstica seja a de câncer, os exames necessários à confirmação devem ser realizados no prazo máximo de 30 dias, mediante solicitação do médico responsável.

Além disso, a medida ainda prevê que as doenças, agravos e eventos em saúde relacionados ao câncer terão notificação e registro compulsórios nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional, nos termos regulamentares. Por fim, os estados que apresentarem grandes espaços territoriais sem serviços especializados em oncologia deverão produzir planos regionais de instalação deles. O descumprimento da Lei sujeita os gestores, direta e indiretamente responsáveis, às penalidades administrativas.
Pandemia impactou tratamento oncológico

Um estudo da Coordenadoria de Saúde e Tutela Coletiva da Defensoria Pública do Rio (DPRJ) em parceria com Instituto de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), publicado em agosto deste ano, com dados comparativos entre o trimestre anterior à pandemia (dezembro de 2019, janeiro e fevereiro de 2020) e o primeiro trimestre de pandemia (março, abril e maio de 2020) aponta uma redução de 25% nas cirurgias oncológicas realizadas no estado do Rio e queda de 24,8% em tratamentos de câncer, com exceção de radioterapia, quimioterapia e cirurgia, depois que a pandemia começou.
As consultas ambulatoriais para esses pacientes também tiveram diminuição de 21,9% no período analisado. A pesquisa constatou ainda que os pacientes que demoram a entrar na rede especializada e permanecem por um longo período à espera de atendimento acabam recebendo, em muitos casos, tratamentos mais drásticos do que receberiam se tivessem acesso de forma rápida e eficiente. Ainda segundo o levantamento, ocorreu afastamento de 20,4% dos profissionais alocados em unidades especializadas em oncologia durante o período de março a maio de 2020.
Dessa forma, acredita a DPRJ, pode ter ocorrido um déficit no quadro de profissionais das unidades, levando a diversas mudanças na organização dos serviços, como a redução na oferta de serviços oncológicos; necessidade de realocação de profissionais especialistas em oncologia para outras funções; diminuição das atividades administrativas de alimentação de banco de dados para registro de atividades e captação de recursos, entre outros.
"A redução na oferta de ações assistenciais voltadas ao combate do câncer em patamar semelhante de 20% revela como, mesmo diante da determinação de manutenção desse tratamento durante a pandemia pelas autoridades sanitárias, a Covid-19 impactou na garantia de atendimento às demais necessidades de saúde, confirmando a reiteradamente denunciada precarização das redes de atenção à saúde no Estado do Rio de Janeiro. Sem novo aporte de recursos materiais e humanos, era esperado que uma rede tão subfinanciada e desorganizada não desse conta do acréscimo de demandas decorrentes da Covid-19 sem prejudicar o atendimento das demais doenças", disse a coordenadora de Saúde e Tutela Coletiva da Defensoria Pública do Rio, Thaisa Guerreiro.
Para levantamento dos dados, foi elaborado um questionário online que foi enviado via ofício às unidades que compõem a rede de alta complexidade em oncologia do SUS no Estado do Rio. Nas respostas, foi mencionado o desabastecimento de Docetaxel, droga utilizada para o tratamento do câncer de mama, por quatro unidades de saúde (26,6% delas); além de analgésicos (6,7%) e anestésicos (6,7%), ambos mencionados por apenas uma unidade cada um. Dentre as 15 unidades que responderam ao questionário, 80% afirmaram ter um Plano de Contingência criado para o enfrentamento do novo coronavírus na unidade, enquanto 20% dos representantes de unidades não souberam responder.

O estudo também mostra as deficiências na oferta de tratamento adequado para pessoas com câncer antes da pandemia. Vistorias feitas pelo Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj), entre os anos de 2016 e 2019, consolidadas no levantamento, mostram que os leitos de cuidados paliativos não existem em 88% das unidades, sendo oferecidos de acordo com a demanda. Com relação aos leitos oncológicos, 44% das unidades afirmaram não possuir nenhum leito específico para casos de oncologia, sendo ofertados de acordo com a demanda; e 13 afirmaram possuir leitos específicos, apresentando uma mediana de 20 leitos por unidade de saúde, variando de 6 a 77 leitos.