ATILAARTE O DIA

Videntes são largamente utilizados por várias autoridades policiais nos Estados Unidos. São médiuns sensitivos com uma capacidade intuitiva apurada em observarem detalhes que passam despercebidos por parte dos investigadores. Por aqui, não é comum nas delegacias policiais, mas cresceu muito o uso de provas na Justiça através de cartas psicografadas.

Um episódio que ficou famoso foi o de uma gaúcha chamada Iara Barcelos, absolvida da acusação de assassinato de Ercy Cardoso, morto dentro de casa com dois tiros na cabeça, na cidade gaúcha de Viamão, em julho de 2003. Iara foi apontada como mandante do crime. Três anos depois, o próprio Ercy depôs a favor da amante Iara Barcelos, apesar de estar morto. Contando com a ajuda do médium Jorge Santa Maria, Ercy contou o que sabia.

Surreal? Pode parecer, mas a Justiça brasileira tem levado em conta provas como essas para absolver réus. Esse caso que contou a ajuda de um médium não foi o único na história do Direito brasileiro. São conhecidos alguns em que Chico Xavier usou seus dons mediúnicos em favor dos réus.
A jornalista Aline Pinheiro lembrou no Conjur que na década de 1970, em Goiás, o juiz Orimar Pontes cedeu ao poder psicográfico inquestionável de Chico Xavier. Em 1976, o médium psicografou o depoimento de Henrique Gregoris, assassinado por João França durante uma brincadeira de roleta russa. No mesmo ano, em outro caso, Chico psicografou a carta de Maurício Garcez, também morto acidentalmente por José Gomes. Nos dois casos, o juiz aceitou o depoimento póstumo das vítimas e os jurados absolveram os réus.
Em 1980, em Campo Grande, outra vez Chico Xavier esteve nos tribunais provando a inocência de alguém. José Marcondes foi acusado de matar sua mulher, Cleide Maria, ex-miss Campo Grande. O médium recebeu o espírito de Cleide. Com o depoimento, José Francisco foi absolvido.
Dentro do universo jurídico, não há nada de errado na atitude da Justiça, destaca Aline Pinheiro. Nada impede que cartas psicografadas sejam usadas como provas judiciais, assim como não há nenhum problema do réu jurar pela Bíblia que não cometeu o crime ou ainda justificar seu ato como uma obrigação de fé. Para os especialistas, lançar mão de argumentos religiosos não viola a característica laica do Estado Brasileiro. Dizer que o Estado é laico significa dizer que ele não tem religião oficial, e não que ele não aceita a religião.
Óbvio, contudo, que uma carta psicografada não pode ser usada como única prova já que depende exclusivamente da fé. Essas cartas das vítimas mortas servem nos júris, já que os jurados não precisam fundamentar suas decisões, apenas respondem se o réu é culpado ou inocente. Não há nada que impeça a prova do além. É o caso das mensagens psicografadas.

Toda prova depende da convicção de quem julga. Quando uma testemunha afirma que um fato aconteceu de um jeito e outra testemunha diz que aconteceu de outro, o julgador acaba tendo de escolher entre uma das versões. Não há meios de impedir que algum advogado apresente uma mensagem psicografada como prova. É uma prova como qualquer outra.
A explicação dos especialistas é a de que o corpo de jurados é formado por pessoas que podem ter as mais diversas crenças, narra Aline. Uns podem acreditar na mediunidade, outros não. Dessa ótica, a carta psicografada é uma faca de dois gumes. Um católico pode achar a carta bobagem e condenar o réu, já que no júri, o que conta é a experiência pessoal de cada um.
Para qualquer documento ser considerado como prova, ele tem de ser, pelo menos, autêntico. A carta é autêntica se realmente tiver sido escrita pelo médium que a assina, por exemplo. Mas a sua veracidade não pode ser provada. Depende da fé de cada um. A veracidade depende, por exemplo, da credibilidade do médium.

Só que Chico Xavier sempre desfrutou de profunda credibilidade, mesmo entre aqueles que não acreditavam no Espiritismo. Quando o médium, entretanto, não tem o quilate de Xavier, o exame grafotécnico é a ferramenta buscada. Provar que a letra de quem assina a carta é mesmo do espírito do morto passa a ser a alternativa. Isso é fundamental para que a carta seja considerada verídica. Vários juízes aceitam cartas psicografadas, desde que o médium seja uma pessoa absolutamente idônea.
Ainda que a Justiça esteja aceitando e reconhecendo a validade de cartas psicografadas, os céticos ponderam que ainda que se aceite a prova do além, como a Justiça pode reconhecer o morto como testemunha?
É uma questão de tempo para que a figura do médium encarnado na cadeira dos réus seja plenamente aceita pela Justiça. A chave será a credibilidade dos médiuns. Isso preencherá um dos quesitos mais importantes: a veracidade.
Átila Nunes