Mas não dentro de campo.
Os cruzmaltinos lutavam contra as vontades políticas dos tricolores (com apoio de Flamengo e Botafogo), que desejavam barrar analfabetos, pessoas com subempregos e os atletas profissionais. Futebol era papo de amador, defendiam.
“Havia basicamente duas situações que a Liga tentava evitar: o profissionalismo dos jogadores e a presença de jogadores analfabetos nos times da liga. O combate ao profissionalismo era mais complicado de ser feito, pois na maioria das vezes os jogadores eram registrados em empregos obtidos através da influência de dirigentes e simpatizantes dos clubes”, escreveu o historiador João Manuel Casquinha Malaia Santos em sua tese de doutorado.
Muitos comerciantes vascaínos, em especial os portugueses, contratavam os atletas para seus estabelecimentos e não obrigavam a trabalhar. Mais: até davam um extra para jogarem. Burlou-se assim uma das obrigações.
Para o segundo ponto foi contratado um time de professores para capacitar os atletas. Era a educação servindo, para não variar, como resistência.
Mesmo com essas atitudes, continuava a perseguição ao campeão de 1923. Os camisas-negras, como eram conhecidos, atropelaram. Foi o primeiro clube a levantar o caneco no Rio de Janeiro com pobres, negros e analfabetos no elenco.
Fluminense, Flamengo, Botafogo, Bangu e São Cristóvão, então, criaram a Associação Metropolitana de Esportes Athleticos, conhecida como AMAE. Quem quisesse se associar precisava seguir as regras. O Vasco, por exemplo, teria que eliminar mais de dez jogadores.
De maneira corajosa, o Gigante da Colina tomou a decisão de romper. Isso chocou a opinião pública. Não esperavam atitude tão drástica.
A carta que o presidente vascaíno José Augusto Prestes enviou para o tricolor biliardário Arnaldo Guinle, então presidente da AMAE, é uma pérola. Duas partes estão aqui:
“Os privilégios concedidos aos cinco clubes fundadores da AMEA e a forma pela qual será exercido o direito de discussão e voto, e feitas as futuras classificações, obrigam-nos a lavrar o nosso protesto contra as citadas resoluções.
Quanto à condição de eliminarmos doze (12) dos nossos jogadores das nossas equipes, resolve, por unanimidade, a diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama não a dever aceitar, por não se conformar com o processo pelo qual foi feita a investigação das posições sociais desses nossos consócios, investigações levadas a um tribunal onde não tiveram nem representação nem defesa”.
Resultado: em 1924 tivemos dois campeonatos cariocas.
O organizado pela nova entidade foi vencido pelo Fluminense e o dos outros clubes foi vencido pelo Vasco.
A batida de pé foi fundamental para alterar os rumos do futebol no Brasil – além de aprofundar os debates sobre preconceitos raciais e sociais.
Em 1925 os clubes voltariam a formar um mesmo grupo. O campeão foi o Flamengo.
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Quem lutou para São Januário ser patrimônio?
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