KakayDivulgação
Eu me pego relendo meus últimos textos e confesso que há uma real preocupação pelo nosso futuro, na verdade, pelo nosso presente. E constato que tenho sido triste. Intrinsecamente triste.
Queria muito falar do livro que estou lendo, do poeta novo que descobri por acaso ou do antigo que voltei a ler, de uma música que ouvi depois de tanto tempo. E contar histórias que me sustentaram, e me sustentam, ao longo da vida, de detalhes quase esquecidos do meu velho pai - a pessoa que mais amei e me instigou a ser feliz -, lances do jogo do Cruzeiro que eu sei os detalhes, amigos que não vejo há tempos, saudades boas, enfim. E relembrar das infindáveis tardes e noites cantando “Evidências” e recitando poesias entre pessoas queridas. Sendo simplesmente felizes e leves.
Sinto que este governo medíocre que domina o país obnubilou a nossa capacidade de sonhar e de sermos suaves. Foi criado um muro de obscurantismo e, até, de certa maldade, que parece separar os idiotas das pessoas que querem ser simplesmente íntegras e contentes. Não é mais possível ser leve e feliz. A realidade cruel e boçal do bolsonarismo aniquila qualquer hipótese de humanismo. Não estamos falando de divergências ideológicas, de direita e esquerda. É uma dicotomia entre a civilização e a barbárie.
Tenho uma saudade profunda da direita civilizada, que discutia temas nos quais a nossa discordância não significava possibilidade de ruptura institucional. Claro, vamos enfrentar contraposições sérias sobre como tentar enfrentar as desigualdades e o abismo aterrorizante que a direita aprofundou com governos elitistas que deram as costas para o povo brasileiro. Mas isso não nos levava à insegurança que nos ronda com esses fascistas desavergonhados.
Durante anos, fui dono do velho e bom Piantella: o restaurante mais politizado do Brasil. E, ouso dizer, o mais charmoso. Éramos imensamente felizes naquele lugar. Sentávamos à mesma mesa, situação e oposição, e discutíamos noites a dentro fazendo política o tempo todo. Foi lá que vivemos a redemocratização, as Diretas Já e a efervescência política. Não havia esse clima de velório, de terror e de medo que é a marca do governo Bolsonaro.
O Brasil precisa voltar a ser feliz. Como disse Raduan Nassar: “A terra, o trigo, o pão, a mesa, a família (a terra); existe neste ciclo, dizia o pai nos seus sermões, amor, trabalho, tempo.”
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.