Camisa da Seleção entra em campo com uma torcida polarizada politicamentefoto de divulgação CBF

A Copa do Mundo do Catar pode ser a prova de fogo para o Brasil. Não necessariamente em campo, mas entre as torcidas. Muitos defendem que a polarização política atual pode enfraquecer a união da torcida brasileira.
No entanto, não é o que mostra a história do país. Nem mesmo no período mais duro da ditadura militar - que usou também a Seleção Brasileira em sua máquina de propaganda - fez com que os combatentes honrassem suas promessas e torcessem realmente contra a performance do país no mundial. Na hora H, esquecia-se das ideologias e os coros a cada "Gol" ecoavam uníssono pelas ruas do país. Nem mesmo os cantos ufanistas como de "prá frente Brasil" - de quando éramos apenas 50 milhões em ação - tiveram seus acordes ignorados quando cantados nas ruas. 
Desta vez, embora muitos discursos na internet sugiram um boicote ao evento, parecem mais aquelas promessas de começar a dieta ou a academia na segunda-feira e que nem quem as proferem acreditam em sua efetivação.
Por muito tempo falava-se que o brasileiro não se envolvia em política e a Copa do Mundo roubava para si o mote de ser o maior evento cívico brasileiro. A corrida eleitoral deste ano, mostrou que não é bem assim. O cidadão também se mostrou engajado politicamente. Portanto, em um ano de Copa do Mundo atípica e fora de época, resiste a paixão pelo campeonato.
Copa gera renda e turistas para o Rio de Janeiro
Podemos dizer que a Copa do Mundo é o evento que mais altera a rotina do país. Muda comportamentos, formatos e horários de trabalho e produção. No contraponto, gera uma onda de consumo de bens e serviços para segmentos econômicos que inflam neste período, como: indústria, comércio, entretenimento, turismo, hotéis, bares, restaurantes. Ou seja, mesmo com as provas sendo realizadas no distante Catar, gera renda e empregos temporários em praticamente todo o Brasil, principalmente numa cidade com as características do Rio de Janeiro. Fora que turistas nacionais e estrangeiros juntam-se a torcida carioca neste período movimentando os hotéis e estadias por temporada. 
O evento potencializa a ocupação da cidade numa dinâmica diferenciada. Parada a correria, dá-se um tempo na rotina, diminuem diferenças, amortecem divergências ideológicas. Vira tudo festas, churrascos, telões em lugares públicos, aglomerações, barracas em praias, grupos na calçada, ruas lotadas, pintadas e decoradas. 
Esses dias conversando com a responsável pelo setor de compra de uma grande organização carioca, podemos traçar um raio X do impacto econômico: desde Setembro não se encontra mais tecido comum e malha verde bandeira no mercado. Lojas de tintas e materiais de decoração reforçaram seus estoques para garantir a grande procura. No Saara, centro popular do comércio carioca, lojistas estão otimistas. 
A Copa do Mundo, há muitos anos, movimenta estruturas sociais e individuais. No sentido contrário, esses mesmos contextos, aliados a cenários políticos e culturais, também impactam diretamente a forma como o brasileiro lida com o futebol. Existe uma relação que extrapola o evento em si e carrega signos sensíveis e potentes, refletindo muitos temas da vida.
Despolitização das cores da bandeira
O ponto mais polêmico promete ser a associação das matizes da bandeira brasileira como parte da campanha de reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Tanto que o eleito, Lula da Silva tenta colocar fim no que define como "apropriação indébita das cores nacionais" avisando que vai acompanhar os jogos com a camisa oficial do Brasil.
       A CBF, junto com o lançamento da nova camisa, iniciou campanha para  dissociar o uniforme do time da política nacional. De forma sublimar, inserções publicitárias veiculadas na televisão, trazem um rap em cima do refrão do cantor e compositor Lulu Santos "Ela me faz tão bem" tentando mostrar que todos podem sentirem-se confortáveis usando a "nossa" camisa da Seleção. 
Pesquisa

Sondagem feita pela Apoema Pesquisa reforça o perfil apaixonado do torcedor brasileiro e aponta como este período esportivo impacta nas estruturas sociais e individuais do país. Os dados indicam que 71% acreditam que temos chances de trazer a taça para o Brasil. O estudo ainda contextualiza os cenários pandêmicos e eleitoral, numa das mais polêmicas campanhas da história com a camisa da seleção tendo se tornado símbolo político.
A torcida pela Seleção também impacta diretamente os comportamentos de consumo: os jogos movimentam as vendas de cervejas e eletrodomésticos, por exemplo, já que a festa está intimamente ligada às confraternizações em família ou em grupo. Em 2022, 24% dos torcedores pretendem comprar uma nova TV para assistir melhor aos jogos.
Efeito aglutinador da Copa
Outro aspecto mostra a íntima relação da Copa com o ambiente residencial – 91% dos brasileiros curtem assistir aos jogos no conforto do próprio lar e 29% organizam a casa para deixá-la mais confortável para o evento. Até porque, nesse sentido, 42% dos entrevistados dizem que a relação com o futebol começou a ser construída a partir das vivências com seus familiares e 32% dizem que, no período de Copa do Mundo, gostam de se reunir e torcer com as família e os amigos.
“O ato de torcer, por si só, proporciona momentos ao lado de pessoas queridas, que ficam marcados na história de cada um. O evento carrega memória afetiva, tanto para quem já assistiu a vitórias e conquistas quanto para quem só ouviu falar, mas sonha em vivenciar. É um respiro em meio ao caos”, explica a fundadora e head de conteúdo da Apoema, Julia Ades.
Pontos Facultativos
Quase todas as organizações dão folgas ou dispensam os funcionários no período dos jogos. As poucas que não podem alterar seu funcionamento, providenciam televisões, telões e comidas para que seus colaboradores possam alternar o trabalho com o acompanhamento das partidas. 
A pesquisa reitera essa quebra de rotina: 30% dos torcedores gostam do evento justamente pela quebra da rotina. Os entrevistados afirmam ainda que trata-se de uma oportunidade de se levar menos a sério o dia a dia e abrir espaço emocional para o lúdico se manifestar.
“A Copa do Mundo desperta a criança que existe em nós, mas que, podada socialmente, perde seu empoderamento”, explica Julia.
Sonho de ir a uma Copa
De acordo com o estudo, 55% dos "torcedores apaixonados" nunca foram ao estádio durante um campeonato mundial, mas sonham em, um dia, acompanhar presencialmente uma Copa do Mundo. O levantamento mostra ainda que, apesar de muitas vezes a torcida não sair de casa, os brasileiros são dedicados: estudam, analisam, discutem, conversam e sonham acerca da seleção brasileira. Hoje, 62% dos torcedores apaixonados pela equipe do Brasil e Copa do Mundo dizem que acompanham e sempre vão acompanhar o nosso time.