Profissionais estão à espera de nomeações para reposição de cargos vagos - Divulgação Asduerj
Profissionais estão à espera de nomeações para reposição de cargos vagosDivulgação Asduerj
Por PALOMA SAVEDRA

Rio - Em carta que será entregue aos candidatos ao governo do Rio (Wilson Witzel, do PSC, e Eduardo Paes, do DEM), os docentes, servidores e estudantes da Uerj, Uenf e Uezo pedem que ambos se comprometam a investir nas universidades e a não cobrar mensalidade dos alunos. No documento, a comunidade acadêmica ressalta ainda o papel que as instituições de ensino e pesquisa podem exercer no desenvolvimento do Estado do Rio.

Os universitários e professores defendem também o cumprimento do Plano de Carreira, Cargos e Salários (PCCS) dos profissionais e do repasse de duodécimos para as universidades — previstos em orçamento. Na Uerj, por exemplo, os docentes estão sem reajuste há 17 anos. 

Apesar de Witzel e Paes não terem defendido a cobrança de mensalidade dos estudantes, há preocupação por parte deles de essa política ser estudada ou mesmo implementada. Os alunos, servidores e docentes têm debatido essa questão depois de diversos problemas enfrentados por eles durante a crise financeira do Rio. 

Atrasos salariais e de pagamentos de bolsas de estudos, dívidas do estado com fornecedores, falta de limpeza e de funcionamento de elevadores e outros transtornos passaram a ser obstáculos frequentes na vida de quem frequentava as universidades. 

Confira a carta compromisso na íntegra:

"Universidades Estaduais se apresentam como saída para a crise do Estado e convidam para o Diálogo

A saída para a crise do Rio de Janeiro certamente envolve as universidades públicas estaduais e escolas técnicas. Essa é a tese central do documento enviado por nós, professores, servidores e estudantes, aos candidatos ao governo estadual no 2º turno. Após sobreviver a pior crise da nossa história, defendemos o investimento na ciência e tecnologia como o principal instrumento para a retomada do crescimento econômico e desenvolvimento social.

Carta compromisso aos candidatos ao governo do estado 

Somos profissionais do conhecimento e estudantes, nos apoiamos sempre na razão e no debate. Nesses termos, não compactuamos com teses que definam meros culpados ideológicos e valorizamos a ação política que encara a realidade concreta e que se mostra responsável para lidar com os desafios sem sacrificar o que é necessário.

Acreditamos que o principal embate que se deve ter é entre ter ou não estratégia para o Estado, em ter ou não suas Universidade Estaduais Públicas (Uerj, Uenf, Uezo e Faetec) como instrumentos indispensáveis para o desenvolvimento estadual. Uma política de Ciência e Tecnologia não se faz quando dá, ela é sempre necessária. Investir em Ciência e Tecnologia é o principal indicador de responsabilidade do político com o futuro, em não hipoteca-lo sob nenhuma circunstância.

O aspecto chave da crise atual é resgatar o papel da escala de poder estadual. Precisamos de um novo governo com visão estratégica e não refém de fazer do Rio de Janeiro, segunda maior economia do país, uma “vitrine” para agradar agiotas cobradores do “dever de casa”. Só assim terá condições para definir prioridades sem estar submetido à lógica viciada que o atual governo federal nos impôs.

Não exageramos ao chamar o atual governo federal de conjunto de agiotas. Afinal deram o direito ao governo estadual de “escolher” sem alternativas críveis, dada a chantagem e o risco de voltar a tornar a gestão orçamentária insustentável. Não deram margem de negociação futura, impuseram o terror financeiro: ou se aceita os termos impostos, ou se volta a praticar arrestos e bloqueios. Ignoram qualquer responsabilidade federal com o pacto federativo de modo a impor ao Rio um modelo de baixo crescimento e contidas possibilidades de desenvolvimento.

Diante disso, cabe um novo governo focado em corrigir injustiças na partilha tributária e rever o enquadramento do “acordo” que ignora a gravidade do quadro socioeconômico. Cabe um novo governo focado em liderar o debate nacional diante de tensões federativas e que valorize o diálogo. Que não hesite em defender o investimento público na educação superior, lembrando sempre que dispendiosa é a ignorância. É ela que nos afasta de sermos mais parceiros numa visão estratégica.

A comunidade universitária do nosso estado é qualificada e está apta a participar do debate sobre gestão pública, ao invés do governante recorrer aos serviços de consultorias privadas sem o menor enraizamento com a estrutura de Estado e a continuidade de planejamento. Em momento de crise é que se deve ter mais visão estratégica e responsabilidade social, mobilizando seus gestores para priorizar soluções políticas alternativas, logo, tendo como meta a reversão de ciclos viciosos que cumulativamente aumentam o drama socioeconômico e fragilizam financeiramente o poder público local. A orientação política deve ter um duplo desafio: modernização da gestão tributária combinada à reorganização de planos de ação produtivo-estratégicos e de redinamização rápida. Da mesma forma, a agenda econômica deve vir somada à agenda social e de maior investimento em infraestrutura básica.

Cabe enfatizar que o Brasil é o país da América Latina que menos investe recursos públicos em saúde, mesmo tendo um dos maiores sistemas de saúde pública do mundo, o SUS. O SUS cumpre o preceito constitucional do direito à saúde, é responsável pelo cuidado de 70% ou mais da população e garante a prevenção de doenças sérias para toda a população brasileira, por meio, por exemplo, do seu programa de vacinação e da vigilância sanitária. Ainda assim, é cronicamente subfinanciado em todos os seus níveis, o que compromete sua eficiência. Apesar do estabelecimento de mínimos orçamentários, manobras como a desvinculação de aplicação obrigatória de partes do orçamento reduzem o montante de recursos disponíveis.

Entre os maiores problemas enfrentados pela população usuária do SUS está o da garantia da continuidade do cuidado; por melhor que a atenção primária funcione, as pessoas eventualmente necessitarão de medidas diagnósticas ou terapêuticas mais complexas, passando a enfrentar gargalos no acesso que se traduzem na demora do cumprimento de certas etapas e na descontinuidade do processo terapêutico.

No caso do Rio de Janeiro, a convivência nada harmoniosa de sistemas de regulação municipais, estaduais, e mesmo federais, dificulta ainda mais a operação de fato unificada do sistema, e caberia ao Estado a gerência dessa articulação, o que não vem sendo feito de forma adequada.

A outra porta de entrada do sistema, a urgência, também apresenta problemas e vem sofrendo restrições no seu funcionamento; a manutenção e mesmo expansão do SAMU é fundamental para garantir o acesso ao cuidado de urgência com a rapidez e agilidade necessárias. Esses são desafios que as Universidades Estaduais vêm pesquisando e se encontram em plenas condições de propor encaminhamentos.

No que se refere à Educação, as universidades estaduais devem ser acionadas em parcerias com a rede estadual de educação básica no enfrentamento dos desafios de garantia de oferta com qualidade nas modalidades Regular e Educação de Jovens e Adultos. Referimo-nos à formação inicial e continuada de professores, no apoio à formulação de materiais didáticos, nos aportes teórico-práticos sobre currículos e propostas pedagógicas em diálogo com professores e estudantes das redes estaduais de educação básica e de ensino superior.

A garantia da oferta presencial é ponto fundamental para assegurar o direito à educação, inscrito na Constituição Federal e Estadual do Rio. Contudo, não é apenas no topo dos percursos escolares que investimentos se fazem necessários. A ampliação da oferta de vagas em creches e na Educação Infantil é fundamental para assegurar a conclusão, com qualidade, de percursos escolares das novas gerações que conduzirão o estado, continuamente, à expansão e diversificação de sua economia.

Da base ao topo dos percursos de escolarização as universidades têm importantes contribuições a dar e deve ser continuamente acessada em estreito diálogo com os sujeitos educandos e gestores dos distintos níveis (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio) e modalidades (Regular e EJA) de ensino cuja oferta é obrigatória ao estado.

A Uerj é uma das vinte mais importantes instituições de ensino superior da América Latina, segundo levantamento recente da Consultoria Britânica de Ensino Superior. No entanto, a excelência, internacionalmente reconhecida, desse patrimônio do povo fluminense esteve ameaçada nos últimos anos por uma equivocada política do governo do Estado. Ao relegar as universidades do estado, a Faetec e a Faperj, ao abandono, o governo subestimou a excelência destes centros de ensino, pesquisa e extensão como instrumentos fundamentais para a superação da grave crise que enfrenta o Estado do Rio de Janeiro.

A correção dessa equivocada política requer obrigatoriamente o compromisso do futuro governador do Estado do Rio de Janeiro com uma pauta inicial de demandas da comunidade universitária, que possibilite as universidades estaduais cumprir sua importante missão com a população fluminense e conduzir o nosso estado de volta ao caminho do desenvolvimento econômico e social.

Destaca-se que os pontos principais dessa pauta são: a) O respeito à autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, estabelecido pelos artigos 207 da Constituição Federal e 309 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro; b) A garantia de recursos públicos para o custeio e o desenvolvimento das Universidades Estaduais e da Faperj; c) e a garantia do repasse desses recursos, determinados pela Lei Orçamentária Anual, em forma de duodécimos mensais, como determina a Emenda Constitucional nº 71/2017; d) o estabelecimento de uma data-base que impeça o acúmulo de perdas salariais dos servidores das Universidades, que hoje é de mais de 100%; e) o cumprimento dos Planos de Carreiras dos trabalhadores das Universidades, aprovados pela Alerj; f) a remuneração do regime de trabalho com dedicação exclusiva dos professores da Uerj e Uezo, em alínea única no vencimento base, como já ocorre na Universidade Estadual do Norte-Fluminense (Uenf) e nas universidades federais do país; g) e o respeito ao Projeto de Lei 4205, que prorroga por dez anos o sistema de cotas para o ingresso discente nas universidades do estado; h) assegurar política de permanência (bolsas, transporte, restaurante universitário) aos estudantes das universidades estaduais; i) a garantia de concursos públicos para suprir o déficit de servidores no caso de vacâncias por exoneração, aposentadoria e mortes, assim como aquelas demandadas por novos cursos e pela necessária ampliação de vagas nas universidades estaduais; j) a manutenção irrestrita do seu caráter laico, público e gratuito, no qual se deixa claro que não aceitaremos cobranças de mensalidades e outras taxas aos estudantes de nossas instituições.

Todas essas questões demandam responsabilidade institucional do governo estadual da mesma forma que cuidado político de não se isolar e participar do debate nacional a partir dos interesses do Rio. Da mesma forma, é necessário ampliar o debate interno e trazer a reflexão regional para dentro da estrutura de Estado.

Como representantes de uma instituição pública de porte e chave para o desenvolvimento, não assumimos postura passiva, mas apontamos as responsabilidades e a necessidade de soldar compromissos. Estamos dispostos a abrir e manter diálogo com quem assuma ter lado, estar do lado das Universidades Estaduais, de sua missão estadual e de seu carácter público e gratuito".

O documento é assinado pela Associação de Docentes da Universidade do Estado do Rio (Asduerj); Associação de Docentes da Universidade Estadual da Zona Oeste (Aduezo); Diretório Central dos Estudantes da Universidade do Estado do Rio (DCE-Uerj); Diretório Central dos Estudantes da Universidade Estadual da Zona Oeste (DCE-Uezo) e Sindicato dos trabalhadores das universidades públicas estaduais do Estado (Sintuperj). 

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