Por adriano.araujo

Rio - Há mais de um ano acompanhando o pai, Elbo Figueiredo, em tratamento de próstata e cálculo renal no Hospital Federal do Andaraí, a operadora de telemarketing Simone Ferreira foi obrigada a desembolsar em torno de R$180 em antibióticos, no mês passado. A falta de medicamentos e insumos viraram alvo do Ministério Público Federal (MPF). Em inspeção na unidade na quarta-feira passada, o procurador da República Sérgio Suiama, que atua na área da Saúde, constatou que faltam 38 itens importantes como gaze, além de 14 tipos de remédios na farmácia, entre eles Dipirona. Durante inspeções foi contatado também um desperdício absurdo: remédios mofados.

A falta de medicamentos e insumos viraram alvo do MPFMarcelo Del Negri / MFP

Em agosto, Suiama foi informado de que durante três meses faltou pino cirúrgico na Ortopedia, o que impediu as operações dos pacientes. Entre novembro e dezembro do ano passado, outras 14 cirurgias foram adiadas. Para fazer um raio-x da situação do Andaraí, o procurador inspecionou 24 setores. Encontrou medicamentos e alimentos expostos à ação de cupins, em depósito classificado de insalubre. Apesar do desabastecimento há ainda desperdício, como medicamento fora do prazo de validade. “Há problemas graves de gestão. Enquanto a sala da administração é linda, o almoxarifado do hospital é um lixo”, analisa Sérgio Suiama.

No local, parte do teto caiu, há infiltrações, fios à mostra e produtos estocados próximos de ralos. Em vários andares faltam extintores, o que colocaria o prédio em risco em caso de incêndio. Para quem precisa do hospital, comprar remédio pesa no bolso. “No desespero, arquei com R$ 180 por cada vidro do medicamento. Não faço ideia de quanto gastei”, desabafa Simone.

No almoxarifado%2C parte do teto caiu%2C há infiltrações%2C fios à mostra e produtos estocados próximos de ralosMarcelo Del Negri / MFP

Para o procurador, também é preciso mais organização. “Muitas vezes, tem o material na farmácia, mas não está disponível no setor. Isso é um problema de fluxo que precisa ser resolvido”, analisa Suiama. Em nota, a direção da unidade nega o desabastecimento. Informa ainda que em casos pontuais — que já estão em processo de compra —, os pacientes são medicados com outros compostos que possuem a mesma ação, o que garante a continuidade do tratamento. Desta forma, assegura o acesso aos medicamentos e insumos tanto aos seus pacientes internados quanto aos ambulatoriais.

PF apura falta de pedidos

Um inquérito da Polícia Federal também apura a falta de medicamentos e materiais no Andaraí. A investigação começou porque no ano passado, a unidade enviou ao Departamento de Gestão Hospitalar, do Ministério da Saúde, responsável por abastecer as seis unidades federais do Rio, planilhas sem pedidos de produtos e remédios.

Uma das hipóteses investigadas é a que a falta de pedido possa ter sido proposital para forçar licitações emergenciais que pudessem beneficiar empresas. O procurador da República Sérgio Suiama vai recomendar à unidade que abra uma sindicância interna para verificar o que aconteceu. “O foco não é só a possibilidade de fraude. Por enquanto, não é possível afirmar se houve dolo ou má-fé”, explica o procurador.

Pacientes relatam os problemas

Madrugada de agonia. Este é o relato da balconista Nilda Oliveira, de 30 anos, sexta-feira, que buscou atendimento no hospital para a filha, Júlia da Rosa Oliveira, de 5 meses. A menina apresentava sinais de febre e vomitou. “Na emergência, a médica nos solicitou exames de sangue e urina mas, para minha surpresa, o hospital não tem potes de coleta. Como não sei a gravidade do que minha filha está passando, vou ter que comprar em uma farmácia próxima. Imagine se eu estivesse com o dinheiro da passagem de volta para casa contado?", questionou Nilda.
Ela também reclamou da falta de copos para que os acompanhantes do pacientes bebam água enquanto esperam pelo atendimento emergencial.

Nilda%2C com a filha Julia%2C teve que comprar pote para fazer exame de urinaAlexandre Vieira / Agência O Dia

O aposentado Moacyr Mathias, 74 anos, se lembrava das despesas que teve durante a internação de dez meses de sua esposa, Genoeffa Mathias, 72, devido à fratura que teve no joelho. Ela recebeu alta mês passado. “Tive gastos incalculáveis com fraldões geriátricos. Graças a Deus pude arcar com as despesas”, ressaltou Moacyr.

CGU de olho na unidade

?A Controladoria Geral da União (CGU) também está de olho no hospital do Andaraí. Técnicos do órgão acompanham a prestação de contas da unidade para o ano que vem.
Para evitar a falta de medicamentos e insumos, a direção do hospital afirmou ainda, em nota, que foi criada uma força-tarefa para acelerar os trâmites administrativos.

Muitos funcionários reclamam que as roupas enviadas à lavanderia retornam danificadas.

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