Por thiago.antunes

Rio - Há 18 anos sequestros e assaltos a bancos assustavam o Rio diariamente. Foi quando grupo de banqueiros se uniu para fazer alguma coisa. Nascia o Disque-Denúncia, o primeiro do Brasil e desde sua criação comandado por José Antônio Borges Fortes, o Zeca Borges, um experiente profissional do mercado financeiro. A missão era criar um serviço da sociedade civil de apoio no combate ao crime, que não fizesse nenhum uso de violência.

Zeca estudou as experiências do Canadá, dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha com o serviço Crime Stoppers. O similar carioca virou produto de exportação: já foi levado para o Chile e para a cidade argentina de Córdoba. Hoje, ele vê crescerem denúncias sobre o tráfico de animais e outros crimes ambientais.

'Extrapolamos a meta inicial'%2C diz criador do Disque-DenúnciaJoão Laet / Agência O Dia

O DIA: Qual a importância do serviço para o Rio?

Zeca: O Disque-Denúncia começou para receber denúncias e repassar à polícia. Só que as demandas nos fizeram mudar. É um projeto que recebe informação, analisa e guarda em um banco de dados, hoje com dois milhões de denúncias e 10 milhões de informações — placas de carro, nomes de pessoas, modo de agir de bandidos, etc. Levamos informações às polícias, e elas trazem resultados. E não só com a polícia. Temos Ibama, Vigilância Sanitária...

O serviço não está apenas na segurança?

Extrapolou. E, mesmo na segurança, há variações. Há diferença entre tráfico de drogas e violência contra a mulher; roubo de cargas e violência infantil; danos ao meio ambiente e qualidade de vida. Também há a área de direitos humanos e a de meio ambiente. Somos muito fortes nessas duas áreas. Começamos libertando pessoas. Hoje, libertamos animais — basicamente pássaros, mas também cobras, jacarés, baratas-gigantes-de-Madagascar, tartarugas..

Como funciona, na prática, o Disque-Denúncia?

Temos uma atitude agressiva de marketing. Não para a autopromoção, mas porque precisamos de informações. A minha obrigação com as autoridades é essa; e elas têm a de dar resultados. A cada resultado, a confiança da população cresce. Um simples call-center não alcança essa credibilidade e continuidade de serviços. Outra coisa importante é o anonimato. Há vários cuidados. Na ligação, não perguntamos quem é. Nem mesmo o sexo da pessoa é registrado. Providenciamos que na conta telefônica do denunciante não apareça nosso número. Quando alguém usa WhatsApp, Facebook ou Twitter, garantimos anonimato. E recomendamos que a pessoa não comente com parentes e amigos que ligou.

Qual é o procedimento ao receber uma denúncia?

Primeiro, avaliação. Se for pertinente, é enviada à polícia. Temos um grupo de cobrança, em contato permanente com as policiais. Esse grupo é quem paga a premiação das delegacias. Nossa atuação consiste no tripé polícia-imprensa-população. Nele, residem nossas trocas.
Nossos instrumentos são a garantia de anonimato; o pagamento de recompensa; a premiação de policiais — que tem sido útil no sentido de o policial ver alguém preocupado e grato com ele; e o banco de dados. Quando é preciso, faz-se um relatório sobre um alvo, um local ou um tipo de crime.

Como é a relação do serviço com a imprensa?

Um exemplo é o site Procurados, do Disque-Denúncia, com informações sobre cerca de mil foragidos, com fotos e descrição dos crimes. O site é acessado de três a quatro mil vezes por dia. Essencialmente, por policiais e repórteres. E hoje é automático: abrimos o site do jornal O DIA e está lá nosso cartaz, com a descrição do criminoso. No último trimestre de 2013, tivemos registradas 393 menções na imprensa. Pesquisas mostram que 82% da população do Rio percebem o Disque-Denúncia como serviço público, prestado ou pelo governo estadual, ou pelas polícias. Nas matérias, não houve nenhuma com tom negativo. Para um serviço público, como somos percebidos, é algo que nos confere muita responsabilidade.

Há migração do telefone para redes sociais?

Muito pouco. O canal ainda é o telefone. Nas redes sociais, o importante é a interação. No Twitter, são 150 mil seguidores. O Facebook traz denúncias melhores, mais bem estruturadas; no Twitter, chegam clamores da população, por regiões onde a violência está intensa. O WhatsApp tem esse perfil de estruturação, além de permitir diálogo, que dura até uma semana.

Como é a relação com os governos?

Pegamos os governos Marcello Alencar, Garotinho, Benedita, Rosinha e Sérgio Cabral e 13 secretários de segurança. Eu não recebo nenhuma doação da Secretaria de Segurança. Mas ela colabora com pessoas e espaço (o Disque-Denúncia funciona em instalações da Secretaria). É uma interação ativa. Temos uma equipe da própria Subsecretaria de Inteligência, que nos ajuda muito.

Quantas denúncias são recebidas por dia?

Recebemos uma média de 400. Na época da ocupação do Complexo do Alemão, chegamos a mil por dia.

Houve mudanças com a criação das UPPs?

A UPP criou expectativa de que as coisas podiam melhorar. Não era mais retórica. Eram fatos. Isso deu ao Rio um estado de ânimo forte.

E agora, com os recentes ataques às UPPs, o que está mudando?

As denúncias refletem o fato de que são orquestrados pelas facções criminosas. Sempre chega uma informação de que a ordem de queimar o ônibus veio de um presídio. Temos um problema sério no Grande Rio: o assalto em pontos de ônibus, entre as 4h e as 7h, quando as pessoas estão indo trabalhar. Quem vai se deslocar por uma, duas horas, para fazer registro? Ninguém. Mas ligam para o Disque-Denúncia e, através de nós, a polícia fica sabendo.

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