Por thiago.antunes
Rio - Os bons negócios privados não garantem ao coronel César Rubens Monteiro de Carvalho sucesso na secretaria de Administração Penitenciária. Em oito anos à frente do comando dos 30 mil encarcerados do Rio de Janeiro, o oficial da PM conseguiu colocar o estado na liderança nacional dos maiores custos para manter o sistema penitenciário. A disparada nos gastos alcançou 141% entre 2009 e 2013, enquanto que o crescimento da população carcerária foi de apenas 47% no mesmo período.

O índice que mais pesa na cesta da Seap é a alimentação. Nem sempre vista com bons olhos pelos presos, a comida abocanhou 32% dos pagamentos executados pela secretária no ano passado —como aponta o levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Só por mês, o governo desembolsa R$ 661 (quase um salário mínimo) por pessoa mantida atrás das grades.

Com César Ruben na Seap foram feitos contratos com empresas processadas por superfaturamentoPaulo Araújo / Agência O Dia

Em São Paulo, onde a realidade dos preços é bem próxima do Rio de Janeiro, o gasto individual é de apenas R$ 199,16 com a alimentação. A Seap explica a escalada do custo com os sucessivos aumentos nos preços de alimentos, combustível e manutenção administrativa. A secretaria apresenta, inclusive, um número diferente de detentos mantidos no sistema e nos gastos diferentes dos auditados pelos técnicos do TCE. Para secretaria, o custo por preso no Rio de Janeiro é de R$ 2.157 — contra R$ 2.330. Mesmo assim, distante dos R$ 1.400 pagos por São Paulo.

O estudo do TCE traz um alerta nada saboroso para a Seap. Mais da metade da verba de alimentação está nas mãos de cinco das 18 empresas que fornecem comida e lanches aos presídios. Entre elas, pelo menos quatro — Padre da Posse Restaurante, Comercial Milano Brasil, Oscip Iniciativa Primus e Facility Alimentação — estão envolvidas em escândalos e processos por vender para o próprio Estado produtos com preços superfaturados ou com quantidade inferior à descrita nas notas fiscais. Para a secretaria, as empresas só são impedidas de participar das licitações após se tornarem inidôneas, o que não aconteceu até o momento.
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Ressocialização e saúde
No mesmo período que os gastos com a alimentação subiram na Seap, a curva com as despesas de Saúde e Ressocialização dos presos é proporcionalmente inversa. Enquanto as refeições comeram R$ 254 milhões, em 2013, a secretaria investiu só R$ 4 milhões naquele ano no tratamento médico dos detentos e R$ 13 milhões nas atividades produtivas.
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O reflexo da política pode ser visto na quantidade de presos que trabalham fora e dentro dos presídios. Segundo levantamento do Ministério da Justiça, enquanto no Rio apenas 755 detentos exerceram atividade laborativa, em Minas Gerais — onde a quantidade de presos é bem perto do Rio de Janeiro — 11.670 pegaram no batente. Em São Paulo, é bem maior: 48 mil. O mesmo sistema vale para a educação. No Rio, somente 2.702 detentos se debruçam nos livros, enquanto em Minas eles são 6 mil e, em São Paulo, chegam aos 12 mil.
Sócio é dono de uma firma envolvida em superfaturamento de material cirúrgico
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Encrenca em dose dupla. Além da casa de câmbio Intermundos — responsável pelo lucro extraordinário de R$ 1,2 milhão nas contas do secretário de Administração Penitenciária em apenas um ano — o coronel César Rubens Monteiro de Carvalho é dono de outro empreendimento explosivo. Em 2011, ele e dois amigos abriram a Precisão Indústria e Comércio de Mármores e Granitos, com escritório num condomínio de salas de luxo da Barra da Tijuca e com as instalações previstas para funcionar no Complexo Industrial de Queimados.
Sandro Alex foi detido em ação policial e Marcos Vinícius%2C é ex-secretário de Tratamento PenitenciárioReprodução

Um negócio robusto, que valeu, inclusive, um aporte financeiro de peso: juntos, os três empregaram R$ 1 milhão de capital no negócio, que até hoje não produziu uma pedra sequer. A composição da sociedade na Precisão Indústria e Comércio traz outro ingrediente sombrio: um dos sócios é o advogado Marcos Vinícius Silva Lips, ex- secretário adjunto de Tratamento Penitenciário da Seap, e o outro é o empresário Sandro Alex Lahmann, um dos donos da Lahmann Rio Comercial Cirúrgico — empresa envolvida em escândalo de venda de medicamentos e materiais cirúrgicos para o Ministério da Saúde com preços superfaturados.

Preso na Operação Furacão, em 2005, o empresário foi acusado de oferecer vantagens para agentes da PF parar a investigação, que, à época, mostrava que parte dos R$ 8,3 milhões recebidos eram transferidos para a agência do Banco do Brasil de Bento Ribeiro, para financiar campanhas políticas.
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Contrato com empresa ilegal
Não pesa sobre o secretário só a acusação de ter causado prejuízo de R$ 650 mil ao estado na contratação da Mazda Locadora e Turismo Ltda, sem licitação, em 2008. A empresa atuava ilegalmente no mercado, segundo ação do Ministério Público na 3ª Vara de Fazenda Pública, desde de 2012. Além do secretário, respondem outros cinco réus.
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A Seap contratou 30 carros blindados. Porém, a Mazda não tinha os documentos exigidos pelo Exército para atuar e sublocava-os de outra empresa. Enquanto a Mazda cobrava R$ 10 mil por blindado alugado, o Registro de Preço da Secretaria de Estadual de Planejamento (003/2008) estabelecia valor inferior de R$ 7.400 por veículo/mês. A empresa Veloz Transrio Transportes Ltda foi descartada porque só conseguiria atender o pedido da Seap em 90 dias. Procurados pelo DIA representantes da Mazda não foram localizados. A empresa não funciona no endereço que consta na ação do MP.
Rigor apenas com alguns contratos
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Em 2009, para fornecer carros blindados por 24 meses por R$ 4,6 milhões, Space 2000 Comércio e Serviços perdeu os contratos por não apresentar, no mesmo dia, os documentos exigidos. Segunda colocada, a Mazda venceu a concorrência, mas só apresentou a documentação dez dias depois.
Também chamou a atenção do MP os preços: sem qualquer justificativa, a empresa Mazda baixou o aluguel de R$ 10 mil para R$ 6.388,88 (35% mais barato). Na ação, promotora Gláucia Santana sustenta que se na primeira contratação com a empresa Mazda, o valor fosse o mesmo, o estado teria economizado R$ 650 mil. A Seap informou que como o processo está em curso “não é prudente avançar em informações de mérito ou em exame da culpabilidade”.
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