Rio - Dois moradores do Morro do Dendê foram mortos em uma megaoperação da Polícia Civil realizada, na manhã desta terça-feira, em favelas da Ilha do Governador, que tinha o objetivo de apreender caça-níqueis e cumprir mandados de busca e apreensão. Wanderson Jesus Martins, 23 anos, e Gilson Costa, de apenas 12 anos, segundo familiares e moradores, foram mortos por tiros disparados por policiais que estavam a pé, próximo a um veículo blindado, após disparos realizados por um helicóptero não terem acertado as vítimas, que teriam sido confundidas com criminosos. Os moradores relatam ainda a existência de um terceiro morto, no entanto, a polícia ainda não confirmou essa informação.
Ao DIA, a irmã de Wanderson, Paola Aparecida Jesus de Melo, de 16 anos, contou como o homem, que era pescador e tinha assinado a carteira de trabalho no último dia 4 como carregador, foi morto.
"O Wanderson ia comprar pão para o filho dele de 4 anos. De repente, um helicóptero da Civil deu um rasante. Ele e o menor se assustaram e correram para dentro de uma casa onde tem uma padaria. Os policiais nem perguntaram se ele era trabalhador. Já chegaram atirando na covardia. Executaram meu irmão. Não foi bala perdida, foi um homicídio", contou.
Estudante e moradora do Morro do Dendê, Cristiane de Melo, de 18 anos, confirma a tese a irmã de Wanderson. "Deram vários tiros para tudo quanto é lado. Atiraram a esmo. Um deles pegou no vidro traseiro do carro do meu pai que estava estacionado. Não pude nem sair de casa com tanto medo que fiquei", disse.
Presidente da Associação de Moradores do Morro do Dendê, Nilton Fernando Alves, de 40 anos, classificou a operação como um "erro de estratégia". "Com um helicóptero, a Polícia Civil pensou que conseguiria diferenciar um criminoso de um trabalhador. Não tem como diferenciar. Foi uma operação errada da Polícia Civil que resultou na morte de duas pessoas", disse, inconformado.
Fotos enviadas para o WhastApp do DIA (98762-8248) mostram um dos dois helicópteros usados durante a ação e um blindado no local onde o pescador Wanderson e o menor de idade foram mortos nesta manhã.
Protesto após mortes
Após as mortes, cerca de 50 moradores desceram o Morro do Dendê carregando sacolas e espalharam lixo no acesso à favela. Um dos manifestantes foi preso por desacato e agressão a um policial militar. Ele foi levado à 37ª DP (Ilha do Governador). Durante o ato, os manifestantes deram socos e pontapés em ônibus e em carros da Polícia e da Defesa Civil. Alguns até jogaram pedras para o alto. A todo momento, eles pediam "justiça" e chamavam os policiais de assassinos.
Uma viatura da 4ª DP (Praça da República) chegou a ser cercada pelos manifestantes e foi atingida com chutes, mas os policiais não reagiram. Os moradores fecharam a Rua Tenente Cleto Campelo, no Cacuia, causando um grande engarrafamento. Na Estrada do Cacuia, alguns comerciantes fecharam as portas. Na porta da 37ª DP, houve reforço no policiamento com cinco carros, mas não foram registrados confrontos.
Por volta das 14h30, os manifestantes fecharam a Rua Vistula, em frente à delegacia e alguns se sentaram no chão. Outros estão com o rosto coberto com capuz. Eles carregam cartazes com dizeres como:"Gilson Costa, morto enquanto saiu para comprar coentro" e "Justiça pelo Gilson e Vanderson". A maioria deu as mãos e fez um cordão na porta do local pedindo justiça.
O tenente coronel Wagner Nunes, comandante do 17º BPM (Ilha) explicou como teve início a manifestação e explicou que, embora a Polícia Militar estivesse presente, a operação que resultou na morte de duas pessoas, era da Polícia Civil.
"O protesto começou dentro da comunidade do Dendê, na Rua Graná, onde moradores conseguiram atear fogo em alguns objetos como cadeiras. Após, a ação ser controlada pela PM, eles reiniciaram o protesto. Infelizmente, durante a manifestação, algumas pessoas jogaram pedras. A PM apenas preparou o terreno para a operação da Polícia Civil, no Dendê, que desencadeou em dois mortos. Foi só um apoio", disse.
Em nota, a Polícia Civil informou que a operação, batizada de Black Machine III, ocorreu nas comunidades do Dendê, Barbante, Bancários, Boogie Woogie, entre outras localidades da região da Ilha do Governador. Quatrocentos policiais participam da operação, que teve o apoio de agentes da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) e de unidades do Departamento Geral de Polícia Especializada (DGPE), além de policiais militares. Em edições anteriores da ação, foram apreendidas cerca de 650 máquinas de jogos de azar.