Por felipe.martins

Rio - A morte de Eduardo Felipe Santos Victor, de 17 anos, não foi a única registrada este ano envolvendo policiais da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Providência, no Centro. Há pelos menos outros dois casos de autos de resistência investigados pela 4ª DP (Central) — um em 13 de maio e outro em 25 de julho. Há ainda um assassinato sendo apurado pela Delegacia de Homicídios (DH) ocorrido na comunidade no último dia 15. De janeiro a junho deste ano, a 8ª DPJM abriu 17 inquéritos policiais-militares (IMPs) e 68 averiguações para apurar desvio de condutas por parte de PMs das UPPs.

Imagens feitas por moradores na manhã de terça-feira mostram militares tentando alterar a cena do crime onde está Eduardo. Nesta quarta-feira, a juíza Maria Izabel Pena Pieranti, do Plantão Judiciário, decretou a prisão preventiva dos cincos PMs envolvidos na morte do garoto.

Dezenas de pessoas acompanharam o enterro do adolescente Eduardo com flores e cartazes. Após o sepultamento, eles fizeram um protesto pedindo justiça pelo crime Severino Silva / Agência O Dia

Segundo a decisão da magistrada, é “inadmissível que agentes da lei, encarregados da manutenção da ordem pública e da regular persecução penal, procedam a alteração de cenário criminoso, visando a ludibriar perito ou magistrado e garantir a sua impunidade pela prática de crime”, afirmou no documento.

As imagens mostram Eder Ricardo de Siqueira colocando uma arma na mão de Eduardo e fazendo dois disparos. Em depoimento na DH, ele justificou ter atirado para evitar um acidente, alegando que a arma estava travada com duas balas. Segundo policiais, Eder não teria participado do confronto e foi ao local após ouvir tiros. No vídeo ele aparece sem farda.

Na DH, o PM Paulo Roberto da Silva assumiu ter sido o autor do disparo que atingiu e matou Eduardo. Ele afirmou que agiu em legítima defesa porque o garoto teria esboçado uma reação contra os PMs com uma pistola calibre 9 milímetros. No entanto, o delegado da DH Giniton Lages informou que a vítima não atirou.

“Já que a arma estava travada com munição, precisava ser feito o disparo para poder fazer o transporte dela com segurança”, justificou o advogado de três dos cinco PMs, Felipe Simão. Já o PM Riquelmo de Paula Geraldo contou na 4ª DP que acredita que o tiro teria partido da arma de Paulo Roberto ou de outro militar, Gabriel Julião Florido. O primeiro portava fuzil calibre 556, e o segundo, pistola calibre 40. Além dos quatro policiais, também está preso Pedro Victor da Silva Pena. Todos estão na Unidade Prisional da PM, em Benfica.

De acordo com o delegado Giniton Lages, o caso foi desmembrado em dois inquéritos: um para investigar o suposto auto de resistência e outro para apurar a suspeita de fraude processual. Ele informou que os PMs serão ouvidos somente após o recebimento dos laudos de necropsia e de balística e do depoimento das testemunhas na DH. 

Protestos no enterro de Eduardo, em Botafogo

Sob gritos de “justiça”, o corpo de Eduardo foi enterrado nesta quarta-feira no Cemitério São João Batista, em Botafogo. Apesar dos protestos no sepultamento, que contou com 100 pessoas, não houve tumulto. Patrícia, mãe de Eduardo, estava abalada e levava rosas brancas nas mãos. Muitos amigos e familiares usavam uma camisa com o rosto do jovem. Na chegada e na saída, o ônibus com amigos e familiares do adolescente foi escoltado por cinco motocicletas e uma viatura da PM.

Pela manhã, moradores apedrejaram oito ônibus da Viação São Silvestre, na Providência. Um motorista acabou ferido no peito por uma pedrada e foi encaminhado para o Hospital Municipal Souza Aguiar, Centro. Eles exigiam que a empresa cedesse ônibus para o enterro.

Ônibus foram apedrejados na manhã desta quarta-feira em mais um protesto na região do Morro da ProvidênciaFoto%3A Severino Silva / Agência O Dia

Por causa do clima tenso na região, a escola Joaquim José da Silva Xavier teve as atividades suspensas pela manhã, deixando 300 alunos sem aula.Ex-presidente da Associação de Moradores da Providência, Pablo Rodrigues denunciou que um ‘Bonde do Paulo’ seria o responsável por praticar abordagens violentas. “Colocam até mulheres deitadas no chão para a revista e ainda apontam fuzil. Agem mais de manhã e sempre com violência”, criticou.

Segundo uma amiga, Eduardo, que já foi coroinha da Igreja de Santa Catarina de Alexandria, na Saúde, entrou para o tráfico há cinco meses. “Mesmo assim ele ia uma vez na semana à igreja. Tinha coração grande e distribuía refrigerante e salgadinhos para as crianças. Era muito querido pelos mais novos”, afirmou a jovem. Também conhecido como Dudu, ele sonhava em casar com a namorada e virar jogador de futebol.

Pezão pede desculpas

O governador Luiz Fernando Pezão pediu desculpas à população e chamou a situação de “abominável”. A morte de Eduardo repercutiu também no cenário internacional. O ‘El País’ estampou em seu site: ‘Polícia do Rio forja cena de crime para esconder assassinato de jovem’.

Rua Senador Pompeu%2C no Centro%2C virou um cenário de guerra após protesto com barricadas de fogo pela morte do jovem Ernesto Carriço / Agência O Dia

O caso reverberou no MP. O procurador Antonio José Campos Moreira enviou e-mail interno criticando a atuação do órgão no combate às atividades policiais. Moreira diz não entender “a absoluta inércia da chefia”: “O MPRJ é, hoje o único que não conta com grupo especializado”, disparou. Em resposta, Marcio Mothé, coordenador de Direitos Humanos do MP, afirmou que desde 1990 o órgão faz este trabalho e que nos próximos dias deverá criar grupo de controle externo.


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