Por thiago.antunes

Rio - O número de jovens interessados em se tornar padres no Rio dobrou depois da visita do Papa Francisco. Como o milagre da multiplicação, desde julho de 2013 pelo menos 90 cariocas, de 18 a 25 anos, ingressaram no Seminário Arquidiocesano São José, o mais antigo do Brasil, no Rio Comprido.

Desses, a metade optou pela vida sacerdotal, depois que todos passaram pela fase de discernimento, que dura um ano. Agora, já são 155 rapazes na instituição, que forma vigários desde 1739. O perfil dos novos candidatos à batina também mudou: no lugar de moços tímidos estarão nos altares jovens apaixonados por esportes e ligados ao mundo pela internet.

Railson Barboza (com a camisa do Botafogo) e colegas seminaristas na academia do S. JoséBruno de Lima / Agência O Dia

“A Jornada Mundial da Juventude (JMJ), com o lema ‘Ide e fazei discípulos entre todas as nações’, acendeu a chama pelas vocações”, admite o padre Leandro Tavares, responsável recepção dos novatos. Atualmente existem pouco mais de sete mil candidatos a padres no Brasil, em 500 seminários.

A maioria dos novos proponentes ao clero vem das zonas Norte e Oeste. É o caso de Rafael Ribeiro, 20 anos, de Bangu. Filho de pais separados, ele conta que decidiu “doar” a vida a Deus no encontro com o Papa no Riocentro, durante a JMJ.

Padre Tavares%3A 'Sempre haverá estrutura para novos sacerdotes'Bruno de Lima / Agência O Dia

“Quando o Papa disse, ‘jovens, não tenham medo de seguir Cristo’, deixei para trás todas as dúvidas e o quinto ano da faculdade de Engenharia Agronômica. Parte da família ficou perplexa, mas sei que fiz a escolha certa”, garante Rafael, há oito meses no propedêutico (seminário introdutório), que antecede três anos de conhecimentos filosóficos e quatro teológicos, totalizando oito anos de estudo.

Para o arcebispo do Rio, Dom Orani João Tempesta, o Rio tem dado belos sinais de como Deus age. “Uma das coisas que mais me impressionam nessa metrópole é a tradição de acolher vocações”, comentou Orani.

O entusiasmo é tão grande que a Arquidiocese reabriu o chamado Seminário Menor, para jovens que ainda não terminaram o Ensino Médio. A euforia se justifica. Há 400 padres para 265 paróquias. “Há um certo equilíbrio. Mas há aposentadorias, mortes e igrejas maiores que precisam de mais sacerdotes”, pondera o reitor do seminário, cônego Leandro Câmara. No Brasil existem 22.119 sacerdotes, um para cada 8,6 mil habitantes.

Os diáconos Bruno Citelli, com Dom Orani, e Gabriel Coelho, com o Papa: ordenação em novembroDivulgação

Aulas de latim e capricho no cabelo

A nova seara de futuros padres dedica boa parte do tempo de suas atividades, que, a exemplo de um quartel, começam religiosamente às 5h45, para cuidar da aparência física. Os exercícios na academia interna e a prática de esportes ocorrem sempre à tarde. Pela manhã, as aulas de latim, grego e hebraico, e as faculdades de filosofia e teologia vão até a hora do almoço.

“Nosso corpo é templo de Deus. Temos que cuidar bem dele”, justifica Railson Barboza, 22, do 4º ano de Filosofia. Com físico de atleta, olhos azuis e sempre sorridente, Railson, botafoguense “doente”, arranca gargalhadas dos colegas enquanto faz ginástica e mostra vídeos engraçados no celular.

Turma de 25 dos 45 novos seminaristas “pós Papa Francisco” assiste a uma aula de missal romanoBruno de Lima / Agência O Dia

Vaidosos, os estudantes, a exemplo de jogadores de futebol, fazem fila para cuidar do cabelo. Quarta-feira, Luiz Tadeu Leonel, 24 anos, do primeiro ano de filosofia, deu um “capricho no black” com o barbeiro José Maurício Sobrinho, de 76 anos, 56 deles cortando o cabelo de seminaristas no São José. “Vou entrar para o Guinness Book (o livro dos recordes)”, brinca José Maurício, lembrando que corta cerca de 20 cabelos por semana lá.

Fã de Ivete Sangalo e encomenda no Facebook

Antes de dormir, em quartos individuais, às 22h, os seminaristas ainda podem assistir a jornais na TV, ouvir música e acessar a internet, em meio a momentos de formação espiritual. A maioria tem perfil nas redes sociais.

Um dos que mais acessam a internet é o diácono Bruno Citelli, 27 anos, que será ordenado em 7 de novembro com o amigo Gabriel Coelho, de 33, fã de Ivete Sangalo. Dia desses, no facebook, deu bronca nos Correios pela demora de uma encomenda feita virtualmente.

A escolha pelo celibato faz com que os rapazes tenham que resistir aos assédios românticos próprios da idade. “Demonstramos a todo momento que nossa escolha por Cristo é irreversível. Temos que dar respeito parar termos respeito”, diz Gabriel. Ele terminou um namoro de seis anos para seguir a carreira religiosa. Na JMJ teve a oportunidade de cumprimentar o Papa em Copacabana. “Nossa conduta e nossos atos devem espelhar em nós o sagrado”, completa Bruno.

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