Por adriano.araujo

Rio - ‘Ao chegarmos no local, constatamos que tratava-se de cenário de risco para a guarnição. A PMERJ (Polícia Militar) estava em confronto armado com criminosos." O relato, de próprio punho, é da capitão-médico do Corpo de Bombeiros Juliana Rangel e foi feito no livro de registros do quartel do Centro, após ela e dois bombeiros ficarem no meio do fogo cruzado no Morro do Fallet, em Santa Teresa, no domingo 18. “Fomos coagidos a entrar na zona de conflito tanto pela população de civis quanto pela PMERJ.”

Bombeiros%2C muitas vezes%2C têm de entrar em áreas de risco para resgatesAgência O Dia

De acordo com o texto de Juliana, o comandante da UPP Fallet ameaçou prender os três caso não fossem à área do tiroteio para socorrer dois moradores baleados — um deles morreu. Populares tentaram agredir a equipe e atacaram a ambulância da corporação. “Em momento algum nos recusamos a prestar atendimento às vítimas”, escreveu a capitão-médico.

Ela queria que os PMs as removessem para um local seguro, onde pudessem fazer o trabalho sem risco. A equipe estava sem colete à prova de balas ou capacete adequado.

Situações como essa retratam o cotidiano dos quase seis mil bombeiros que atuam na capital, onde as favelas são dominadas por traficantes. A assessoria de imprensa do Corpo de Bombeiros informou que os militares não recebem treinamento para atuar em áreas onde há confrontos. Eles só podem entrar em momentos de tiroteio com apoio da Polícia Militar. Mesmo assim, apenas quando se sentirem seguros.

Nem é preciso que haja troca de tiros entre criminosos e polícia para que os socorristas se exponham a riscos. Ser abordado por criminosos armados na entrada das favelas faz parte do dia a dia deles. “Já fui parado na subida de uma comunidade do Grajaú por traficantes armados que nos impediram de subir porque era aniversário do chefe de tráfico do local e estava tendo uma festa. Tivemos que obedecer as ordens dos bandidos”, contou um bombeiro, que não quis se identificar.

Presidente da Comissão de Defesa Civil da Câmara, o vereador e major bombeiro Marcio Garcia (Rede) classificou de constrangedor o caso sofrido pela equipe no Fallet. “Vejo a agressão à capitão com muita tristeza. Há vários casos em comunidades em que o bombeiro passou por situações assim, de ser xingado, tomar tapa na cara. É uma humilhação”, lamentou o vereador.

?Risco para cumprir a missão

São muitas as histórias de bombeiros que passam aperto para tentar cumprir a missão de socorrer quem precisa. Sob anonimato, para não ferir o regulamento militar, alguns deles contaram alguns episódios. Um relata que foi obrigado a correr risco na comunidade após receber ordens de traficantes do Complexo do Chapadão, em Costa Barros.

“Eles queriam entrar na ambulância de fuzil e nos levar até um dos comparsas que estava ferido por granada. Tive que dizer não, mas corri o risco”, conta o bombeiro. “Consegui convencê-los a ir na frente de moto e, quando chegamos ao local, havia mais de 30 bandidos armados e o ferido já estava morto. Fomos obrigados a levar o corpo até o hospital. Passar por traficantes armados e receber ordens deles acontece todos os dias durante nosso serviço”, reclama o militar.

Outro bombeiro contou que em áreas pacificadas costumam ter o apoio dos PMs que os levam até o local da ocorrência. “Mas eles têm fuzil, carro blindado e colete à prova de balas. Nós não temos nada. Não recebemos nem treinamento para atuar em áreas de risco”, denunciou.

No caso do Fallet, a Coordenadoria de Polícia Pacificadora informou que a equipe dos bombeiros foi orientada pelos policiais sobre o melhor momento para a entrar na comunidade e que não houve impedimento ao socorro da vítima por parte da PM.

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