Segundo estudos da professora Vânia Penha Lopes, que analisou o caso da evolução na Uerj, as cotas promoveram o aumento de alunos negros nos cursos de Ensino Superior e a desistência de cotistas por falta de preparo ou adaptação na universidade não aconteceu
Uma das políticas públicas que tenho orgulho de ter participado em minha vida pública foi o processo de formulação da legislação que estabeleceu as cotas sociails e raciais para ingresso de alunos em universidades públicas estaduais do Rio de Janeiro. À época, em 2001, ocupava o cargo de secretário de Energia, Indústria Naval e Petróleo, do então governador Garotinho, e integrei a equipe que criou a primeira lei do Brasil que estipulou esse benefício.
A proposta, devido a seu pioneirismo, foi exemplo para o país, estimulando a criação e adoção dessa ação afirmativa em outros estados, inclusive sendo, quase dez anos depois, a inspiração para a Lei Federal 12.711/2012 l quando foi estendida a universidades públicas e institutos federais. Hoje, após mais de 20 anos da criação da primeira ei sobre o tema no Brasil, acompanho de perto, em meu cotidiano profissional e pessoal, os benefícios que tal medida proporcionou em especial aos alunos da rede pública de ensino contribuindo para a diminuição de diferenças sociais e corrigindo injustiças sociais históricas herdadas desde o período da escravidão no Brasil.
Quando no passado começamos os debates para formulação da lei estadual que estabelece o sistema de cotas, foi notório constatar que alterações nas formas de acesso ao Ensino Superior eram necessárias. Em 1997, por exemplo, pouco mais de 2% de pessoas pardas e 1,8% de afrodescendentes, entre 18 e 24 anos, concluíam ou faziam um curso de graduação no Brasil. Esse dado indicava que era preciso uma mudança tendo como meta a ampliação de possibilidades de ingresso em cursos de graduação e oportunidades no mercado de trabalho para negros, estudantes carentes, entre outras pessoas consideradas excludentes sociais e que até se achavam indignas de conquistar uma vaga em universidades públicas.
A legislação estadual original previa sua reanálise a cada dez anos e assim foi feito e a sua última revisão foi ao final de 2018, onde também colaborei como então secretário estadual de Educação e sinalizei aos governadores Dornelles/Pezão e a membros do Legislativo a necessidade de mantermos essa ação afirmativa, em que os maiores beneficiados eram os alunos da rede pública estadual de ensino, o que se transformou na Lei Estadual 8121/2018, que está em vigor.
Durante os anos de discussão para formulação da lei, é fato que muitos foram avessos, e ainda são, quanto a sua implementação. Críticas eram feitas, especialmente quando era argumentado descabidamente que a política de cotas causaria um “empobrecimento intelectual” dos cursos de níveis superior por admitir alunos que eram classificados erradamente como desqualificados. Recordo quando fiz os cursos de Graduação em Engenharia, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e de Administração de Empresas, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que existiam poucos alunos negros e provenientes de escolas públicas estudando nessas instituições.
Segundo estudos da professora Vânia Penha Lopes, que analisou o caso da evolução na Uerj, as cotas promoveram o aumento de alunos negros nos cursos de Ensino Superior e a desistência de cotistas por falta de preparo ou adaptação na universidade não aconteceu. Na verdade, o número de evasão dos cotistas foi, em muitas universidades, menor que a de outros alunos, levando a crer que os mesmos encararam a experiência de ingresso na graduação de maneira diferente dos outros estudantes e que podem se superar com o auxílio dos professores e de programas de permanência na instituição.
Agora é o momento do governo federal e Congresso Nacional discutirem a renovação da Lei Federal 12.711/2012 que no segundo semestre desse ano também completa dez anos e devido ao seu Artigo 7 requer sua renovação. Na certa acontecerá muita polêmica e debates que coincidem com o momento eleitoral, mas os resultados no país dessa semente plantada pelo Rio de Janeiro há mais de 20 anos dão evidências claras da sua importância e da necessidade de sua renovação.
Wagner Victer é ex-secretário estadual de Educação do Rio
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