Rio - Em entrevista exibida neste domingo pelo programa Domingo Espetacular, da TV Record, a jovem de 16 anos vítima de estupro coletivo na Zona Oeste do Rio de Janeiro no sábado recordou os momentos que ocorreram após a agressão. "Acordei em um lugar totalmente diferente, com um homem embaixo de mim, outro em cima e dois me segurando, muito garotos rindo, eu estava dopada (...) Provavelmente colocaram alguma coisa na minha boca, no meu nariz enquanto eu estava dormindo", contou a adolescente que se recorda de ter passado a tarde de sábado na casa do namorado após ter participado de um baile funk.
O local que a jovem descreveu como "uma casa abandonada, que só tinha uma cama, uma geladeira e uma cômoda" é conhecido como "abatedouro", usado para a realização de sexo em grupo, segundo a polícia. A jovem lembra que, ao acordar, se deparou com pelo menos 28 homens armados. Após despertar, ela contou, foi novamente estuprada. "Tiveram relações comigo, e eu gritando e chorando. E hoje todo mundo nega, falam que a culpa é minha, que eu queria".
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A jovem diz ter sido resgatada por um amigo, que entrou no quarto e a vestiu com roupas masculinas para que eles pudessem deixar o lugar. "Quando acordei pensei que ia morrer, mas quando meu amigo apareceu, pensei que tinha mais uma chance de sobreviver", recorda.
A jovem falou ainda sobre culpa e a rotina após as agressões.
"Me roubaram não um bem material, mas um bem físico. (...) Senti e sinto várias vezes, até hoje eu me sinto culpada. Não está sendo mais a mesma coisa comer, dormir, conversar. Às vezes, me sinto culpada por andar com um short curto ou andar com dois homens ao meu lado. A ficha não caiu ainda, parece que nada aconteceu, será mesmo que isso aconteceu, que isso está acontecendo?"
Quando perguntada se conseguiria traduzir fisicamente como havia sido a experiência, ela respondeu "Lixo. Saiu de mim lixo e mais lixo. Saiu lixo da minha boca, dos meus ouvidos, dos meus olhos (...) Tomo banho cinco, seis vezes por dia. Acordo de madrugada só para tomar banho".
Ela mencionou o apoio que tem recebido de mulheres de todo o Brasil, que se mobilizaram após a ocorrência da agressão.
"Foram 33 no caso, mas foram todas as mulheres junto comigo. Eu sempre me pus no lugar de muitas mulheres que aconteceu isso, mas nesse momento, eu senti que muitas mulheres se pôs (sinc) no meu lugar. Dói na alma porque me culparam, mesmo eu não sendo culpada (...) Tem algumas pessoas, sim, me julgando, mas outras também me apoiaram, fizeram protesto, mandaram mensagem, estão me dando forças".
"Justiça"
A jovem contou durante a entrevista que não pensou em procurar a polícia após o ocorrido porque "sabia que não ia ter justiça". Segundo ela, a mãe soube do caso apenas depois que a avó chegou acompanhada de uma advogada à casa onde a família vive.
A avó tomou conhecimento do drama da neta por meio de um vizinho, que viu as imagens e o vídeo da menina nas redes sociais. "Vi as imagens e identifiquei que era ela mesma. Fiquei muito chocada. Depois que me acalmei vi o vídeo, mas me arrependi de ter visto. É muito cruel! Fiquei transtornada e só pedia para Deus que ela estivesse viva do jeito que estivesse".
A adolescente prestou três depoimentos desde que o caso se tornou público, e condenou o comportamento dos policiais que ouviram seu testemunho. "Eles me culparam por uma coisa que eu não fiz, perguntaram o que eu estava fazendo, se eu tinha feito sexo grupal, querendo me colocar de culpada de todas as formas".
De acordo com a advogada que estava acompanhando o caso, Eloisa Samy, a adolescente ficou constrangida quando os agentes mostraram as fotos e rodaram o vídeo do estupro para que todos os que estavam presentes na sala de depoimento pudessem ver. "O que se viu, em seguida, foi um processo de criminalização da vítima. Não tinha como continuar, até mesmo atendendo a reivindicação da adolescente que virou pra mim e disse 'eu não vou responder isso'.
Para afastar qualquer acusação de parcialidade na condução do caso, a delegada da Criança e do adolescente Cristina Bento assumirá a investigação, informou a Polícia Civil do Rio de Janeiro na noite deste domingo. A instituição acrescentou que a vítima foi incluída no Programa de Proteção à Testemunha", e que as alegações de que ela foi constrangida durante os depoimento serão apuradas.