Por tiago.frederico
Menor é apreendido em flagrante na orla de Copacabana (arquivo)Leitor Betinho Casas Novas

Rio - A partir desta quarta-feira, o adolescente apreendido por cometer ato infracional nas ruas do Rio será apresentado pela Delegacia de Proteção à Criança e Adolescente (DPCA) ao Núcleo de Audiência de Apresentação (Naap), criado pelo Tribunal de Justiça nesta terça-feira. A medida irá evitar a internação provisória do menor na unidade do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase), antes de ser apresentado e ouvido pelo Ministério Público e pelo juiz da Vara da Infância e da Juventude.

O núcleo criado nesta terça-feira é fruto de uma parceria entre a Justiça, o Ministério Público, a Defensoria Pública, a Polícia Civil e a Prefeitura do Rio. Os representantes desses órgãos participaram, no Tribunal, da cerimônia de assinatura do Termo de Cooperação Técnica para a Reestruturação das Audiências de Apresentação dos Adolescentes em Conflito com a Lei e do Ato de Instituição do Núcleo de Audiência de Apresentação da Comarca da Capital.

Para o presidente do Tribunal de Justiça, o desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, a cerimônia representa um ato em defesa dos direitos humanos dos adolescentes e do Estatuto da Criança e do Adolescente (Eca). “É um sonho que estamos realizando juntos. Temos a possibilidade de dar a esse adolescente um espaço na vida, a esperança de melhorar a sua existência. O juiz vai decidir se ele será internado ou liberado e entregue à sua família para a sua reintegração à sociedade”, disse o desembargador.

O Naap atende a determinação do Eca, que prevê a realização da audiência de apresentação tão logo o adolescente envolvido na prática de um ato infracional seja apreendido pela polícia. Depois de passar pela DPCA, esse menor será ouvido pelo MP e, em seguida, em audiência com o juiz da Infância e da Juventude. A iniciativa altera o sistema até então em vigor, em que o infrator era encaminhado pela DPCA ao Degase. Ali, permanecia de três a quatro dias até ser apresentado à autoridade judicial.

O núcleo funcionará, nos dias úteis, no Fórum Central do TJ, nas instalações do Plantão Judiciário, na Rua Dom Manuel. Aos sábados, domingos e feriados, o adolescente que for apreendido deverá será ouvido pelo MPRJ, no Plantão Judiciário do TJRJ, e apresentado, no primeiro dia útil, ao juiz no núcleo.

50% não precisam de internação provisória

Segundo a juíza Raquel Chrispino, o crescente número de apreensões de adolescentes chamou a atenção para o problema. Em 2015, dados do Instituto de Segurança Pública apontavam a apreensão de 10.262 menores infratores, num crescimento de 22,5% comparado ao ano anterior. A juíza disse que cerca de 50% dos adolescentes apreendidos não precisam de internação provisória no Degase, até a realização da audiência judicial. Conforme estimativas, são apreendidos em torno de 450 adolescentes por mês.

A magistrada também informou que até final deste ano deverá ser criado o Núcleo de Justiça Restaurativa do TJ. O projeto busca cumprir a meta nº 8 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabelece prazo até o final de 2016 para a instalação de um núcleo de Justiça Restaurativa pelos tribunais de Justiça dos estados.

“A Justiça Restaurativa é uma nova forma de ver a Justiça penal, onde, em vez de buscar apenas a punição, ou necessariamente a punição do infrator, busca-se colocar como principal sujeito do processo penal não o infrator, e sim a vítima. Busca-se restaurar e reparar o dano que foi causado à vitima de forma que o infrator consiga se colocar no lugar da vítima e entender o que ela está passando por causa da conduta dele. E que a vítima consiga se colocar no lugar do infrator e procurar entender de que forma ele chegou até ali”, explicou a juíza Vanessa Cavalieri.

A titular da Vara da Infância e da Juventude de Competência Infracional defendeu a instituição da audiência de apresentação como medida para evitar, na internação provisória no Degase, que ocorra o contato de adolescentes que cometeram atos infracionais de menor impacto com outros responsáveis por crimes. Vanessa Cavalieri disse ser “linha dura” em suas decisões, sem deixar de reconhecer o direito das pessoas.

Emocionada, ela contou o drama de uma mãe cujo filho tinha sido apreendido pelo furto de uma bolsa. Na apresentação em juízo, a magistrada determinou uma medida socioeducativa e que o menor fosse entregue à família. Mesmo assim, a mãe começou a chorar. Perguntada por que chorava, a mulher respondeu que, somente na audiência, descobriu que o filho, desaparecido de casa, estava vivo. Ela já tinha percorrido necrotério, hospitais e espalhara pela cidade cartazes com a foto do filho por desconhecer o seu paradeiro.

Participaram da cerimônia o vice-prefeito do Rio, Adílson Pires; o subprocurador-geral de Justiça de Administração do MPRJ, Eduardo Machado de Castro; o defensor público-geral, André Luis Machado de Castro; a subchefe administrativa da Polícia Civil, delegada Elizabeth Cayres; o diretor-geral do Departamento de Ações Socioeducativas, Alexandre Azevedo de Jesus; desembargadores e juízes do TJRJ. O procurador-geral de Justiça, Marfan Martins, que não pôde estar na solenidade, informou que fará a assinatura do documento.

Você pode gostar