Por adriano.araujo, adriano.araujo
Rio - Policiais do 23º BPM (Leblon) estiveram no Jardim Botânico, na Zona Sul da cidade, na manhã desta segunda-feira, para fazer cumprir a reintegração de posse da Comunidade do Horto. Moradores reclamam que estão sendo despejados sem ter para onde ir e tentaram resistir às remoções. As pessoas tiveram seu direito de ir e vir prejudicado por conta de barreiras policiais montadas em diversos pontos do local. Por volta de 12h, PMs começaram a impedir a entrada na região e dispararam bombas de gás e balas de borracha. Uma repórter do DIA foi atingida no pé por uma das balas disparadas pela polícia. 
Moradores da Comunidade do Horto recusam ser chamados de ocupação e lutam para não serem removidos Severino Silva / Agência O Dia
A operação, que começou por volta das 7h, ocorreu com apoio do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq) e o Batalhão de Policiamento em Grandes Eventos (BPGE). PMs do 2º BPM (Botafogo), do 16º BPM (Olaria) e também seguranças do Jardim Botânico apoiaram no processo de reintegração. Não há registro de prisões até o momento, de acordo com a polícia.
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Adolfo Paiva, de 46 anos, relatou que mora no Horto desde os 7 meses e "não aguenta mais" viver desta forma. "Eles falam que somos ocupação. Não somos invasores. Meu avô trabalhou no Jardim Botânico, temos documentação da casa", falou.
Morador mostra bala de borracha disparada pela PM em remoção na comunidade do Horto Divulgação
Segundo ele, uma ambulância entrou mais de quatro vezes no local para socorrer pessoas por conta da ação truculenta da PM. "Eles lançaram bombas de gás dentro da casa de uma idosa. Ela teve que ser socorrida", disse o morador, acrescentando que há muitos idosos e crianças no local.
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"A nossa comunidade é bicentenária e hoje nós fomos surpreendidos com essa remoção arbitrária, porque chegaram aqui com todo o aparato da polícia, proteção para os oficiais de Justiça e para os funcionários do Jardim Botânico, e nenhuma proteção para a comunidade", afirmou Emilia Maria de Souza, vice-presidente da Associação de Moradores e Amigos do Horto. Ela tem 65 anos e nasceu no local.
"Não tem oferta de outro imóvel, a família simplesmente tem que sair e ficar na sarjeta, porque o presidente do Instituto de Pesquisa do Jardim Botânico tem que fazer a limpeza social da área. Eu pergunto: em benefício de quem? Eles alegam que têm que tirar 521 famílias para o crescimento do Jardim Botânico, mas não apresentam um projeto viável, que a gente possa identificar a função dessa área caso eles consigam remover essas pessoas daqui", afirmou Emilia.
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Na rede social Facebook, as pessoas publicam vídeos e relatos nesta segunda-feira para fazer denúncias contra a remoção. "Venham ajudar por favor! Muita polícia! Estão afrontando porta e morador", apelou a Comissão de Moradores do Horto.
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Em nota, a PM informou que foi "necessário fazer uso progressivo da força" contra os moradores porque estes arremessaram pedras nos agentes, mas não mencionaram a repórter ferida e nem as bombas dentro da casa da idosa. O Corpo de Bombeiros informou que três vítimas foram levadas para o Hospital Miguel Couto, mas a ocorrência está em andamento. São elas: Ronaldo da Silva Moreira, 57 anos; Marlene A. de Andrade, 78 anos e Hugo Barbosa, 23 anos.
Por volta das 17h, as ruas Pacheco Leão e Jardim Botânico foram interditadas em protesto. A PM liberou a última via às 18h20, lançando bombas de gás para dispersar os ativistas. O tráfego ficou lento nas vias. O policiamento foi reforçado no trecho.
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Jardim Botânico move ações individuais contra as famílias
O Jardim Botânico move ações individuais contra as famílias, muitas já julgadas, alegando interesse ambiental. O parque fala sobre um perímetro, que nunca foi oficializado. Vale ressaltar que na área de habitação da comunidade não há degradação ambiental aparente.
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Os moradores querem regularizar sua situação. Em 2008, eles apresentaram um projeto de regularização fundiária da ocupação, desenvolvido pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, em parceria com a Secretaria do Patrimônio da União - SPU, que não foi aceito. 

A reintegração do terreno pelo Governo Federal se arrasta por anos. Em 2013, a então ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, anunciou em visita ao Rio que a União faria o registro em cartório do perímetro histórico do Jardim Botânico e a reintegração ao parque das terras ocupadas por 521 famílias.

Em março deste ano, um grupo de cerca de 200 pessoas fechou o parque Jardim Botânico por três horas reivindicando o das remoções de moradores que vivem na área. Na época, a presidente do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Samyra Crespo,afirmou que eles não respeitaram os visitantes e os funcionários.

O Tribunal de Contas da União (TCU) informou que já tomou todas as medidas cabíveis para que a transferência definitiva do local seja realizada para o Jardim Botânico.

"Foi fixado prazo de 90 dias corridos para que o Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MP), a Secretaria do Patrimônio da União (SPU), a Superintendência do Patrimônio da União no Estado do Rio de Janeiro (SPU/RJ), o Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) adotassem providências para sanar as pendências que eventualmente estivessem obstruindo a transferência da propriedade ao Jardim Botânico do Rio de Janeiro do imóvel registrado sob a matrícula n. 103475 no 2º Ofício de Registro de Imóveis do Rio de Janeiro", informou.

Em nota, o Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro esclareceu que a ação "trata-se do cumprimento de decisão judicial proferida em processo ajuizado pela União na década de 80". Segundo o órgão, cabe a ele atuar conforme o que foi determinado pelo Poder Judiciário e "zelar pela posse após a reintegração." Os demais órgãos ainda não se posicionaram a respeito.