Rio - O cabo David Gomes Centeno, um dos policiais flagrados em vídeo atirando contra dois jovens já caídos no chão em frente à Escola Municipal Daniel Piza, em Acari, na quinta-feira, era considerado pela própria corporação como um policial que atirava demais. Há dois anos, Centeno integrou a lista dos 31 policiais que mais fizeram disparos na PM, selecionados para fazer parte da primeira turma do curso de ‘Aprimoramento do uso de força com emprego da arma de fogo’.
Montada dias antes da chacina de Costa Barros, quando cinco jovens foram fuzilados com mais de 100 disparos, a ação surgiu com o objetivo de controlar o uso excessivo de tiros e estresse em operações policiais. Na época, foram selecionados 67 policiais. Por quatro semanas, Centeno foi afastado das ruas e teve apoio psicológico, além de simular disparos em um estande de tiros virtual. No simulador, havia situações de risco ao policial e outras em que ele não deveria atirar: quando o criminoso se rende, por exemplo.
Na época, o então chefe de planejamento operacional da PM, coronel Mauro Andrade, já se mostrava surpreso com o excesso de tiros dos selecionados. “Este grupo representa 20% dos disparos nos últimos seis meses no estado. Atiraram muito para um número pequeno de policiais. Isso preocupa”, afirmou. Como justificativa ao curso, o boletim interno 233/2015 dizia que era necessário ‘atualizar o treinamento e o conhecimento de policiais militares com histórico de consumo elevado de munição em contextos conflagrados’.
Em depoimento sobre a execução filmada em Acari, Centeno confirmou o disparo ao criminoso, mas alegou legítima defesa. Ao DIA, o comandante-geral da PM, Wolney Dias, disse que vai intensificar o curso para que situações como a de Acari não se repitam mais.
O 41ºBPM (Irajá), onde Centeno já atuava, foi a única unidade da capital em que mais de 10% do efetivo ultrapassou o limite tolerável pelo sistema naquele ano. Na turma de reciclagem de Centeno, também estava o sargento Anderson Faria Merces, segundo policial que mais fez disparos em 2015. Merces é alvo de outra investigação da Delegacia de Homicídios (DH), ao lado do cabo Fábio de Barros Dias — agente que fez o primeiro disparo em um dos criminosos caído que, como mostra o vídeo da execução, se move antes do tiro.
Em 2014, Merces e Dias foram apontados pela DH como autores da morte de Maria Eduarda Sardinha, de 11 anos. Partiu da arma de um deles o tiro que acertou o rosto da menina, enquanto ela comia um pedaço de pão dentro de casa, na favela Para Pedro. A investigação ainda não virou denúncia.
‘Assassinos foram policiais’
Em uma postagem em sua página no Facebook, na madrugada de ontem, o secretário municipal de Educação, Cesar Benjamin, acusou os policiais militares pela morte de Maria Eduarda Alves da Conceição, de 13 anos. A menina foi morta por três disparos dentro da escola, durante uma operação policial que terminou com a execução filmada de dois criminosos, na quinta. O momento em que os policiais atiram contra os homens desarmados foi flagrado pelo celular de uma moradora.
Segundo Benjamin, ‘não resta dúvida de que os assassinos foram policiais militares que, de uma distância de cerca de 250 metros, decidiram alvejar com tiros de fuzil dois homens que transitavam armados’. A Delegacia de Homicídios (DH) investiga a origem dos disparos.
Ainda na internet, um abaixo-assinado pede apoio aos policiais flagrados no vídeo atirando contra os homens no chão. Entre as 91 mil assinaturas, registradas até a noite de ontem, estava a do coronel Mario Sérgio Duarte, ex-comandante-geral da PM.