Rio - Uma festa de arromba em um dos cartões postais do Rio, o Museu de Arte Moderna (MAM), a partir das 21h, celebra hoje os 80 anos do capo do jogo do bicho, Aniz Abrahão David, o Anísio, e, para muitos no mundo da jogatina, também pode ser chamado de Dom, título apropriado por mafiosos.
O renomado cerimonialista Roberto Cohen foi contratado para recepcionar os 400 convidados ilustres da estrutura da Justiça, políticos, artistas, jornalistas e celebridades do mundo do samba. Com patrimônio incalculável, alicerçado ainda por nove empresas em seu nome, construído à margem da lei, o bicheiro não poupou o cofre.
À boca miúda, o gasto com o rega-bofe é estimado em mais de R$ 1 milhão para garantir a fartura de canapés, uísque, champanhe e jantar bem longe do seu reinado em Nilópolis, na Baixada Fluminense.
Aos amigos, Anísio fez um convite bem singelo na cor cinza. Avisou em letras prateadas que haverá manobrista no local. E nada de black-tie, o traje é de passeio mesmo.
Enquanto o capo se mostrou relaxado e à vontade para chamar os parceiros para a comemoração, quem fica ao redor está cheio de dedos e preocupado para não constranger e muito menos permitir flagras aos presentes. Alguns convidados, por exemplo, foram orientados pelos organizadores a não levar equipamentos como telefones celulares e câmeras fotográficas para o evento.
O espaço MAM, onde ocorrerá a festa, tem 450 metros quadrados e comporta até 900 pessoas, levando-se em consideração a área externa. Para garantir o local, o contraventor desembolsou R$ 40 mil.
A ornamentação e o cardápio ficaram por conta do aniversariante. Para animar a festa não poderia faltar a bateria da escola de samba Beija-Flor, da qual Anísio é patrono, e o puxador oficial da agremiação, Neguinho da Beija-Flor.
Um dos pontos altos do cerimonial será a apresentação de um documentário sobre a vida de Anísio, um menino classificado como pobre que chegou ao topo do poder empresarial com muito trabalho. A homenagem é guardada a sete chaves como surpresa para o dono da noite e a festa não tem hora para acabar. O aluguel do salão é por 23 horas.
O espaço no Aterro do Flamengo, Zona Sul carioca, tem vistas deslumbrantes para a Baía de Guanabara, o Pão de açúcar, os Jardins de Burle Marx e a Marina da Gloria, outros cartões postais do Rio.
O projeto arquitetônico pertence a Affonso Reidy. Inaugurado em 1948, o MAM é uma das construções mais marcantes da cidade. A pompa e exuberância também entrarão para a história da vida do todo poderoso do jogo do bicho.
“O Anísio responde a dois processos em liberdade. Não tem nenhuma condenação com trânsito em julgado (definitiva sem direito a recurso)”, afirmou o advogado Ubiratan Guedes, defensor do bicheiro há mais de 30 anos.
Inconformado com qualquer crítica que possa ser feita ao réu em dois processos e com ficha pra lá de suja, Guedes vai mais longe e arrematou: “Não entendo a hipocrisia desse país. O Anísio é um grande injustiçado. Ele nunca se apropriou de dinheiro público. Patrocina uma escola com 1.500 crianças e creche com mais de mil beneficiados. Enquanto, muitas autoridades, eleitas pelo povo, tiram dinheiro dos carentes”.
Anísio está em prisão domiciliar graças à saúde debilitada, por decisão do Tribunal Regional Federal 2, de 2012. A Corte ainda não julgou recurso do bicheiro contra a condenação de 48 anos e oito meses pela Justiça Federal por envolvimento com a cúpula do jogo do bicho.
Contraventor tem longa ficha criminal
A ficha de Anísio é bem extensa, constam 41 anotações. A maioria por contravenção, ou seja, estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público. Em muitos casos, o capo também foi absolvido das acusações.
Pendentes estão dois processos. Um no Tribunal Regional Federal 2 por envolvimento com a cúpula do jogo do bicho. Nele, outras 19 acusados também foram condenados na 1ª instância, em função da operação Furacão, da Polícia Federal, deflagrada em 2007, que levou Anísio para a cadeia em Brasília.
Outra pendência na vida do bicheiro é o processo que tramita na vara criminal de Teresópolis que ainda não foi julgado. O procedimento foi feito com base na operação Dedo de Deus, deflagrada pela Corregedoria da Polícia Civil, em 2011, a maior já feita pelo órgão.
Na ocasião, os agentes revistaram o tríplex de Anísio em Copacabana, com dez quartos. O imóvel foi avaliado em R$ 72 milhões à época.
Registro de ocorrência
O primeiro registro que consta na ficha de Anísio é 5 de novembro de 1964 na 29ª DP (Madureira) por contravenção. O caso tramitou na 17ª Vara Criminal e o bicheiro foi absolvido.
Condenação
Há uma de 48 anos e oito meses e 15 dias de prisão na Justiça Federal. A base do processo foi a Operação Furacão que investigou crimes como formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, corrupção, contrabando e homicídios. A ação atingiu membros do judiciário. Anísio recorreu ao Tribunal Regional Federal 2, que ainda não julgou o caso.
Processo
Há um em tramitação na Vara Criminal de Teresópolis por formação de quadrilha, mas ainda não foi julgado com base na Operação Dedo de Deus da Corregedoria da Polícia Civil, em 2011.