Rio - Foi com tristeza e indignação que a comunidade acadêmica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) recebeu o parecer do Tesouro Nacional que sugere a "revisão da oferta de ensino superior" público. A desestatização da Uerj e outras universidades seria uma medida adicional caso as regras previstas no Regime de Recuperação Fiscal, homologado na terça-feira pelo governador Luiz Fernando Pezão e o presidente em exercício Rodrigo Maia, não sejam suficientes para restaurar o equilíbrio das contas do estado. O Regime tem duração de três anos e poderá ser renovado por mais três.
Os calouros da Uerj, que ingressaram na faculdade ainda em estado de greve, sem bandejão e com atrasos de bolsas de pesquisa e salários dos servidores, defenderam a importância da universidade, apesar da crise. "Seria um absurdo privar a população de um lugar de tradição como a Uerj, que presta tantos serviços à sociedade", disse Raphael Trevisan, aluno do 1º período de Filosofia.
Os funcionários da instituição também se indignaram com o parecer. Para Regina Souza, coordenadora geral do Sintuperj, sindicato que representa os servidores das universidades estaduais, o parecer é absurdo e causa inquietação e insegurança na população. "Pode não ser para agora, ele lançou uma semente para ver a repercussão. As conquistas da Universidade, as pesquisas, os prêmios, são todos fruto de um esforço enorme de quem ainda acredita na ciência", destacou.
Em nota, a Associação dos Docentes da Uerj (Asduerj) também repudiou a possibilidade de privatização. "Estamos indignados, mas infelizmente não estamos surpresos. Esse parecer só dá comprovação documental ao que já temos denunciado há muito tempo. Esse documento não vale de nada, não tem efeito prático nenhum, a não ser como declaração de guerra à Uerj", diz o texto, ressaltando que a medida também poderia afetar outras instituições de ensino técnico e superior estaduais, como a Uenf, o Uezo, a Faetec e a Cecierj.
O reitor da Uerj, Ruy Garcia Marques, considera a possibilidade de privatização ou fechamento estarrecedora e descabida. Em nota, a reitoria alega que o governador Pezão afirmou que a medida seria "fora de qualquer propósito".
"A Universidade do Estado do Rio de Janeiro sempre foi, é, e continuará sendo pública e gratuita, aberta à população do nosso estado", apontou a nota, que destacou também que a Uerj foi considerada a 11ª melhor universidade do Brasil pela avaliadora educacional Times Higher Education.
Projeto de prestação de serviço também é criticado
Além da possibilidade de desestatização, os alunos da Uerj também se assustaram com as declarações do governador Pezão, sobre a pretensão de enviar à Assembleia Legislativa, ainda neste mês, um projeto de lei que prevê a prestação de serviços ao estado, por pelo menos dois anos, de ex-estudantes da universidade.
"Não é correto precisarmos trabalhar por algo que é nosso direito. Quero me formar e trabalhar sim, mas com remuneração, onde eu quiser, e aí estarei pagando impostos, que é como se mantêm as universidades públicas", apontou Gabriela Ribeiro Figueiredo, aluna do primeiro período de Enfermagem.
"É uma má ideia. Acredito que isso seja impossível de se concretizar, pois seria uma loucura. Mas, no governo atual, estamos vivendo tempos loucos mesmo. Precisamos ficar alertas", lamentou a caloura do curso de Oceanografia, Juliana Fernandes.
Universidade tem 67 anos de história
Fundada em 1950, a Uerj já foi Universidade do Distrito Federal, Universidade do Rio de Janeiro e Universidade do Estado da Guanabara, ganhando seu nome definitivo em 1975. Além do campus principal, no Maracanã, a instituição também possui unidades em Duque de Caxias, São Gonçalo, Petrópolis, Teresópolis, Nova Friburgo, Resende e Ilha Grande.
A Uerj já formou nomes célebres em diversos campos de atuação, como os ministros do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso e Luiz Fux. Eles chegaram a se mobilizar pela mudança da Faculdade de Direito da universidade, que iria do campus Maracanã para o prédio do Tribunal de Justiça, no Centro do Rio. A viabilidade da mudança ainda está sendo avaliada.
A Uerj também formou outros grandes nomes de destaque, como os políticos Wadih Damous, Jandira Feghali e Enéas Carneiro, além do ex-ministro da Cultura Marcelo Calero e os compositores Vinicius de Moraes e Geraldo Vandré.
No corpo docente, a relação de professores em destaque é extensa, especialmente na área jurídica, como os ex-ministros do STF, Joaquim Barbosa, Ary Franco e Oscar Dias Correia.
Reportagem da estagiária Nadedja Calado, sob supervisão de Cláudio de Souza