Rio - Em um trecho do 'Caminho do Grafite', muro pintado por 40 artistas quando a UPP dos Prazeres foi instalada em 2011, um policial aparece sob uma lona azul improvisada, sentado em um sofá velho. Em outro ponto, um PM descansa em um colchão no chão, onde as paredes estão corroídas e a fiação exposta. As fotos são de postos avançados da UPP. A falta de estrutura da corporação reflete também na segurança dos policiais. Na tarde de segunda-feira, sete agentes foram rendidos por cerca de 30 traficantes.
"Eles portavam granadas e pistolas. Cercaram e renderam todos os policiais. No beco do Aguinaldo (região da comunidade) tiraram as armas de quatro colegas. Os outros três estavam na quadra da associação", disse um policial. "Não agrediram, mas falaram que era para cada um ficar no seu espaço, que seria fácil apagar (matar) qualquer um que ali estava e que a guerra não era com eles", completou.
Em um relatório da ocorrência, que circulou em redes sociais, um outro agente escreveu o que queriam os criminosos. "Chegaram falando 'tá tranquilo, é só um papo'. A exigência era que a UPP retirasse os postos policiais do Aguinaldo e Doce Mel", relatou. Os policiais somente foram liberados após o subcomandante da unidade intervir, pedindo a liberação dos PMs rendidos.
Ainda no relatório, o policial escreveu que os agentes não foram agredidos e, após cerca de 50 minutos, tiveram suas armas devolvidas.
A ação dos criminosos foi confirmada em nota pela assessoria do Comando de Polícia Pacificadora (CPP). "Os policiais foram ameaçados por criminosos na localidade conhecida como Beco do Agnaldo. O policiamento na região foi reforçado por agentes de outras UPPs e do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope)", informou, seis horas após o ocorrido.
E, segundo o CPP, "alguns suspeitos foram identificados pelo setor de inteligência da unidade e ações estão sendo planejadas para capturá-los".
Ainda na noite de segunda, agentes da tropa de elite da corporação fizeram uma incursão no morro do São Carlos, a uma distância de 4,5 km do Morro dos Prazeres. Cinco supostos traficantes foram baleados e chegaram mortos no Hospital Municipal Souza Aguiar. Apesar do CPP confirmar que os agentes do Bope estavam nos Prazeres em resposta à ação dos bandidos, a corporação não confirmou se a presença da tropa especializada no São Carlos fazia parte da mesma operação.
O policiamento seguiu reforçado ontem nos Prazeres e, durante a tarde, houve troca de tiros. Moradores ficaram no meio do fogo cruzado e desabafaram nas redes sociais. "É muito tiro. Só Deus para proteger a gente", escreveu uma moradora. Não havia informações de presos ou feridos até a noite de ontem.
A UPP Prazeres/Escondidinho possui 182 policiais, que trabalham em regime de escala e são responsáveis pelo policiamento de uma área de 131.168 m² com uma estimativa de 5.500 moradores fixos. A comunidade tem acesso aos bairros de Santa Teresa, Lapa, Catete, Glória, Cosme Velho e Laranjeiras.
MP vai pedir explicações à Polícia Militar
O Ministério Público Estadual vai pedir explicações à Polícia Militar sobre as fotos que mostram a falta de estrutura dada aos agentes. Confrontado com os flagrantes, o promotor Paulo Roberto Mello Cunha, do Grupo Especial de Atuação de Segurança Pública (Gaesp), demorou a acreditar que as cenas eram de postos avançados da corporação.
Foi necessário mostrar um e-mail da assessoria do CPP enviado ao DIA que confirmava as informações. "Pelo que está retratado nas fotos, o local não tem as mínimas condições de funcionar como um posto de policiamento, sob nenhum aspecto. O Gaesp vai solicitar à Pmerj os esclarecimentos necessários sobre essa situação", afirmou o promotor.
Essa não foi a primeira vez que policias foram rendidos em uma UPP. Em 2015, agentes do Fallet passaram pela mesma situação.