Rio - Durante depoimento prestado hoje à Justiça Federal, no Rio de Janeiro, a ex-diretora administrativo-financeira da Carioca Engenharia, Tânia Fontenelle, afirmou ter feito pagamento de propina para emissários do ex-governador Sérgio Cabral. Os repasses teriam ocorrido entre 2009 e 2015. As quantias foram entregues em espécie a Carlos Miranda e Carlos Bezzerra, homens da confiança de Cabral.
"Eram pagamentos mensais. A princípio R$200 mil mensais. Isso regra geral, porque quando não tinha disponibilidade eu passava para o próximo mês. Depois de uns dois anos e meio passou para R$500 mil mensais", contou Tânia.
O depoimento foi dado ao juiz Marcelo Bretas e integra um dos processos provenientes dos desdobramentos da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro. Sérgio Cabral é apontado como líder de uma organização criminosa que arrecadava propina durante o período em que ele foi governador. Em outros três processos, Cabral já foi condenado em primeira instância com penas que somam 72 anos de prisão. Atualmente ele está na Cadeia Pública José Frederico Marques, em Benfica, na zona norte do Rio de Janeiro.
As informações prestadas hoje por Tânia Fontenelle fazem parte de acordo de delação premiada que ela assinou com o Ministério Público Federal (MPF). Além de Cabral, são réus neste processo Wilson Carlos, Sérgio Castro Oliveira e Carlos Miranda, apontados como operadores do esquema, e os irmãos Marcelo Chebar e Renato Chebar, que teriam dissimulado a propina da organização criminosa no exterior.
Além de confirmar que teve participação como diretora da empreiteira na geração de caixa 2 para pagamento de propina, Tânia disse que a Carioca Engenharia financiou campanhas eleitorais de forma não declarada. "Era feito através de superfaturamento de contratos com fornecedores da empresa. Ou então, em poucos casos, com contratos totalmente simulados para a geração de caixa 2", explicou.
De acordo com a delatora, os recursos destinados a Sérgio Cabral eram, na maioria das vezes, entregues aos emissários no escritório da Carioca Engenharia, sediado no bairro São Cristóvão, no Rio de Janeiro. Propinas destinadas a outras pessoas não teriam sido pagas por ela. Os valores eram entregues a acionistas e outros diretores da empreiteira, que seriam responsáveis pelos repasses. Ela não soube dizer quem seriam os destinatários finais do dinheiro.
Entre os fornecedores envolvidos no esquema com o superfaturamento dos contratos, Tânia Fontenelle citou, sem dar mais detalhes a Agrobilara, que pertence à família Picciani. Segundo ela, as empresas cobravam ágio de 20 ou 25%. Na semana passada, o deputado estadual Jorge Picciani (PMDB) e seu filho Felipe Picciani foram presos no âmbito da Operação Cadeia Velha.
O advogado de Sérgio Cabral, Rodrigo Roca, considerou que as alegações de Tânia Fontenelle são "mais do mesmo". "Nós já conhecíamos o teor de quem prestou declaração". Ele disse ainda que não há provas concretas de que os referidos pagamentos seriam para Cabral. "A memória de uma senhora que ouviu dizer que seria do ex-governador é a única prova", acrescentou.
Além de Tânia Fontenelle, também prestaram depoimento Leonardo Aranha e Enrico Machado. Ambos são denunciados pelo MPF por participação em esquema criminoso liderado por Sérgio Cabral envolvendo o setor de serviços terceirizados. Segundo a denúncia, Cabral teria recebido propina no valor de US$ 10,4 milhões em transferências realizadas para contas em Antígua e Barbuda, na América Central.