Há uma semana, de 11h às 14h, Silvério Morón, de 63 anos, começou a tirar dúvidas de matemática e física, sem cobrar nada, na Praça Compositor Mauro Duarte - Luciano Belford / Agencia O Dia
Há uma semana, de 11h às 14h, Silvério Morón, de 63 anos, começou a tirar dúvidas de matemática e física, sem cobrar nada, na Praça Compositor Mauro DuarteLuciano Belford / Agencia O Dia
Por GUSTAVO RIBEIRO

Rio - Aluno do 1º período de Engenharia Mecânica, Márcio Almeida da Silva Júnior, de 26 anos, estava decidido a trancar a faculdade na sexta-feira passada. Desanimado pela dificuldade com cálculos, saiu de casa cabisbaixo naquele dia à tarde para o trabalho. No caminho, quase não acreditou quando viu uma placa em uma mesa na Praça Compositor Mauro Duarte, em Botafogo, onde se lia: "Tiro dúvidas de Matemática e Física (grátis)". Sim, de graça. E parou para pedir ajuda.

A cena do estudante concentrado nos ensinamentos do professor Silvério Morón, 63 anos, explodiu as redes sociais. Até ontem, cinco dias depois, a foto tinha sido compartilhada por mais de 47 mil pessoas.

"Eu nem sei o que dizer sobre essa foto, só que meu coração deu um sorriso de amor e esperança...", postou no Facebook a autora do clique, Van Novaes, 38, coordenadora em uma produtora. "Fiz a foto com o celular e eles nem perceberam. Todo mundo estava chocado com o assassinato da (vereadora) Marielle, e postei para mostrar aos meus amigos que existia luz em meio a dias tenebrosos".

Morador de Botafogo, Silvério formou-se em Engenharia e não tem licenciatura. Trabalhou por dois anos como engenheiro, 25 como comerciante e, há 14, vive de aulas particulares (paixão que descobriu aos 49 anos). Graças a uma reserva financeira, arrumou tempo para concretizar o projeto voluntário. Desde o dia 12, ele fica na praça de segunda a sexta-feira, das 11h às 14h, disponível para tirar dúvidas de Física e Matemática em todos os níveis de escolaridade, inclusive nos preparativos para o Enem. E quer continuar até o fim do ano.

Com a iniciativa, o professor espera contribuir com uma sociedade, em sua visão, carente de educação. Ele evita falar de política, mas não acredita que a intervenção federal na segurança sozinha seja capaz de enfrentar a violência. "Não entendo de política, mas entendo de ser humano e de educação. O Rio de Janeiro está doente. O nível de educação está aqui embaixo e a violência, lá em cima. Não adianta nenhuma força externa trabalhar só no sintoma. Tem que trabalhar a causa. Se o braço da educação levantar, o da violência vai descer", disse Silvério.

Seu desejo é inspirar outras pessoas a dividir o que sabem com as outras, seja fazer cálculos ou cozinhar, lavar, dançar... "Já pensou se aparecem mil pessoas com o mesmo pensamento que eu? Professor não é só quem tem licenciatura. É quem tem conhecimento para ensinar algo a alguém. Você acredita que alguém passe 60 anos sem aprender nada na vida?"

O professor prometeu ajudar Márcio até a formatura. E o futuro engenheiro desistiu de desistir. "Eu não ia mais para a faculdade a partir daquele dia. Já tinha falado com meu pai e minha mãe. Foi uma luz no meu caminho", agradeceu o jovem. "As pessoas hoje em dia estão muito perdidas, à procura de alguém para ajudar e não encontram. Quando a gente vê uma atitude dessas, é maravilhoso", incentivou a cabeleireira Olanir César, 57, que observou Silvério lecionando ontem.

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