Rio - Um terreiro foi depredado, na madrugada desta terça-feira, na Rua Tegípio, no bairro Cabuçu, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Os vândalos atacaram o Centro Espirita Caboclo Pena Branca, que pertence ao sacerdote Sergio Malafaia D'Ogum, quebraram imagens, atearam fogo e picharam a frase "Fora macumbeiros, aqui não é lugar de macumba".
O Corpo de Bombeiros foi acionado, por volta das 2h, para combater o incêndio. O caso foi registrado na 56ª DP (Comendador Soares). De acordo com a corporação, ninguém ficou ferido. Segundo a Polícia Civil, as investigações estão em andamento e os agentes tentam encontrar os suspeitos do crime.
A polícia destacou ainda que a intolerância religiosa é uma das linhas de investigação. Segundo o babalorixá Sérgio D'Ogum, dono do espaço, o ataque ocorreu no meio da madrugada. "Colocaram fogo e quebraram tudo que eu tinha lá (no terreiro), perdi todo o meu material espiritual. Foi no meio da madrugada, uma vizinha percebeu o incêndio e ligou para os bombeiros por volta das duas e meia da manhã. Também escreveram palavras de ordem na parede, coisas obscenas e muitos palavrões".
"Eu trabalhava naquele local há 15 anos. Sou muito bem visto aqui em Cabuçu. Distribuo cestas básicas, ajudo com exames médicos e nunca havia recebido sequer uma ameaça. Outro ponto é que as atividades no centro acontecem sempre durante o dia. Eu até poderia trabalhar durante a noite, mas para não atrapalhar o descanso das pessoas sempre evito". contou o religioso.
"Não vou mudar de local de trabalho, aquilo lá eu construí. Vou ver daqui para frente, mas a tendência é que eu faça uma vaquinha. Preciso pedir ajuda para conseguir voltar com as atividades no Centro. Eu sonho por um país melhor, com menos intolerância religiosa. Onde já se viu isso? Um absurdo, uma falta de respeito sem tamanho", lamentou Sérgio.
O presidente do Conselho Estadual de Defesa e Promoção da Liberdade Religiosa, Márcio Jagun, comentou os casos de intolerância religiosa no Rio. "Os casos de intolerância religiosa estão presentes em toda história do Brasil. O que acontece é que atualmente as ocorrências têm sido mais graves, com mortes, templos destruídos e agressões físicas. Posso dizer que a questão se agrava quando sai do âmbito filosófico e parte para a prática criminosa", disse.
"Hoje batalhamos em duas frentes para diminuir os casos de intolerância. A primeira consiste na promoção da liberdade religiosa, que passa por uma questão educativa e vai nos trazer resultados em um médio ou longo prazo. A segunda é mais prática, que é o combate a quem promove atos de intolerância. Não tenho dúvidas que a existência de traficantes que seguem religiões que não tem matriz africana agravou a situação. Esse fato pode estar diretamente ligado ao número de ocorrências violentas", pontuou Jagun.
Para o babalawo Ivanir dos Santos, interlocutor da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, o caso deveria servir de alerta para investigações. "Esse episódio mostra que o ano passado não serviu de lição para as autoridades. O sentimento é de impunidade. O caso voltou a acontecer na mesma região. Os nossos sacerdotes estão desprotegidos. Houve mobilização e abriram inquérito no ano passado. Mas nada foi feito. Isso está incentivando atos como o que aconteceu nessa madrugada. A casa tem uma boa convivência e faz um bom trabalho social para a área", afirmou Ivanir.
"Amanhã eu vou lá (no terreiro). As autoridades não criam medidas preventivas para isso não acontecer. Se fosse em qualquer ambiente de Igreja a resposta já teria sido dada. Esse ato foi coisa organizada e orquestrada, mas cabe às autoridades dizerem. Estamos esperando resposta dos ataques do ano passado. As autoridades vieram a público, mas não resolveram nada. A constituição garante proteção aos templos religiosos. Mas o estado, não", desabafou o babalawo.
*Estagiários sob supervisão de Thiago Antunes