Corpos foram velados na mesma capela do Jardim da Saudade, em Sulacap. Eles serão enterrados lado a lado - Rafael Nascimento / Agência O Dia
Corpos foram velados na mesma capela do Jardim da Saudade, em Sulacap. Eles serão enterrados lado a ladoRafael Nascimento / Agência O Dia
Por RAFAEL NASCIMENTO

Rio - Cerca de 300 pessoas, entre amigos e familiares de Maria José Fontes e do sargento da PM Douglas Fontes, mãe e filho, se despediram dos dois na manhã desta sexta-feira, no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap. Os corpos foram velados lado a lado e enterrados na mesma cova. Duas irmãs de Maria José passaram mal e precisaram de atendimento médico durante o sepultamento. 

O pai do policial, Manoel Gonçalves Caluete, de 62 anos, estava entre os presentes. Ele disse que sempre temeu pela vida do filho e que foi contra a entrada dele para a Polícia Militar. O praça foi executado a tiros em Duque de Caxias, e a mãe, ao ver o corpo do filho na cena do crime, em Gramacho, sofreu um infarto e não resistiu.

"Ele gostava muito (de ser PM), mas eu não era a favor. Orientei muito a não seguir a carreira quando ele fez a prova, pois é um barril de pólvora, tudo pode acontecer. Ele sabia que um dia poderia sair de casa e não voltar", disse, emocionado. Manoel comentou que os dois netos já estão sabendo da morte do pai.

Enterrado no Cemitério Jardim da Saúdade em Sulacap Zona Oeste do Rio, O Policicial Militar Douglas Fontes Caluete assassinado em Duque de Caxias Baixada Fluminense e sua Mãe Maria José Fontes morreu quando viu o corpo do filho, Foto Severino Silva Agencia O Dia - Severino Silva
Apesar de o PM gostar do trabalho, o pai falou que o filho temia pela vida. "Ele tinha medo de morrer. Costumava dizer: 'Pai, eu sei que é perigoso, um cidadão comum está exposto, imagina eu?", contou. "Sou suspeito para falar do meu filho. Ele era um excelente filho, assim como o outro (Rômulo, irmão gêmeo de Douglas)."

“Meu Deus, como dói. Por que? Por que fizeram isso? Eles vão pagar. Eu tenho fé”, disse a irmã de dona Maria, identificada como Márcia Fontes. 

'Foi tudo muito rápido', conta pai de PM sobre morte de mãe na cena do crime

Manoel conta que estava em casa, que fica em frente à residência de Maria José, sua ex-mulher, quando uma pessoa ligou e deu a notícia que o filho tinha sido assassinado. Os dois foram até a cena do crime juntos.

"Eu fui correndo junto com ela. Ela estava tentando levantar o corpo dele e foi caindo. Ainda tentei segurá-la, mas não deu mais. Minha ex-cunhada a colocou no carro e, quando ela chegou na UPA, não suportou", lamenta.

O desenhista de instalações disse estar preocupado com a nora, que acompanhava o policial momento do crime. Ela chegou a prestar um depoimento, mas precisará voltar à delegacia porque não tinha muitas condições de falar sobre o crime.

"Não consegui conversar com a minha nora, ela foi para a delegacia e não a vi mais. Estou para conversar com ela e dar um conforto. Ela se sente culpada porque estava com ele", falou.

Maria José não resistiu ao ver o corpo do filho, o sargento Douglas. Ela teve um infarto fulminante - reproduções

Comandante-geral não comparece a velório

Enquanto o sargento Douglas e a mãe eram velados e sepultados em Sulacap, o comandante-geral da PM, coronel Luís Cláudio Laviano, participava de evento não revelado pela assessoria da corporação em um hotel de Copacabana. O DIA perguntou o motivo da não ida do oficial ao enterro do militar. De acordo com a PM, o comandante estava participando do evento que já estava agendado e que o comandante do 15º BPM (Duque de Caxias) estava lá para representá-lo.

O irmão gêmeo de Douglas agradeceu ao comandante, que intermediou a autorização para mãe e filho fossem enterrados juntos. Segundo ele, a Polícia Militar prestou assistência à família neste momento de dor.

"Não consegui sentir ódio, mas dá raiva. Agora, meu sentimento é de tristeza, porque perdi uma mãe e um irmão. Meu choro é de dever cumprido, pois meu irmão foi sabendo que eu o amava, assim como minha mãe. O amor da minha mãe agora ultrapassou as barreiras da vida", disse Rômulo Fontes.

Ele criticou a falta de solução para os crimes contra policiais: "Se ele morresse e isso se resolvesse, sairia daqui até feliz, mas ele não será o único. Esse é um sentimento que a gente não deseja pra ninguém. O que a gente deseja é o que não será feito e não está sendo feito. Sei que vão correr atrás, prender os responsáveis, mas não existe solução para o Rio de Janeiro", desabafou.

'Carnificina'

Também presente no funeral, o tenente Nilton da Silva, do grupo SOS PM, cobrou respostas das autoridades ao abordar os seguidos assassinatos de policiais no Estado do Rio.

"O que a gente espera é que o estado dê uma resposta efetiva em relação a essa carnificina que estamos sofrendo. Sabemos que o Rio vive uma crise, mas não podemos colocar nela as mortes que estamos sofrendo todos os dias. São pais, mães, filhos, sobrinhos e parentes e, infelizmente, não estamos tendo respostas", disse o oficial, que concluiu.

"Hoje, colocamos várias cruzes em frente ao Cfap (Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças) para dar um recado, pois a gente não pode sentir que a coisa não pode modificar. Queremos mudanças e que alguém interceda pelas nossas vidas".

Amigo de Douglas, o entregador Jonatas dos Santos, de 24 anos, foi outro que se despediu do amigo no Jardim da Saudade:

"Um cara honesto, nunca foi de fazer nada demais. Infelizmente, aconteceu essa tragédia. Está sendo difícil pra gente, era amigo dele de infância. Saímos todos os amigos juntos. Ele nunca procurou problemas. Sempre amenizava as brigas e os estresses. Ele sempre comentava que tinha medo de morrer". 

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