Sem reforma prometida, antigo Museu do índio segue abandonado ao lado do Maracanã - Foto: Daniel Castelo Branco
Sem reforma prometida, antigo Museu do índio segue abandonado ao lado do MaracanãFoto: Daniel Castelo Branco
Por Beatriz Perez

Rio - Semana passada, o deputado estadual eleito Rodrigo Amorim (PSL-RJ) fez declarações interpretadas como preconceituosas por lideranças indígenas. Amorim, que ficou conhecido por destruir uma placa em homenagem a Marielle Franco em um ato de campanha, afirmou que a Aldeia Maracanã é "lixo", e defendeu que  a área de 14.300 metros quadrados na Zona Norte do Rio seja utilizada com atividades que visem lucro. Ao DIA, o deputado mais bem votado do Rio disse que usará seu mandato na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) para intervir na aldeia, onde fica o antigo Museu do Índio. Já ao jornal O Globo, Amorim declarou que, "quem gosta de índio, que vá para a Bolívia, que além de ser comunista ainda é presidida por um índio".  Autoridades bolivianas também reagiram com indignação às declarações.

Dinaman Tuxá, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), participou da Marcha Mundial do Clima, em São Francisco, nos Estados Unidos - Reprodução/ Redes Sociais

Para Dinam Tuxá, integrante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, a fala do deputado difunde ódio e violência contra os índios. "Os povos indígenas se encontram muito fragilizados juridicamente e politicamente, porque temos uma conjuntura política totalmente anti-indígena, na qual, se você se manifesta a favor dos direitos de nossa gente, você é convidado a se retirar do Brasil", protestou.

Ele teme um retrocesso nos direitos dos povos indígenas, como a paralisação de demarcação de terras, no governo que se inicia. "É muito alarmante quando vem um deputado estadual querendo propagar e difundir ainda mais violência. As pessoas que deveriam pleitear e apaziguar a ordem aqui no Brasil fazem esta declaração que não agrega em nada", desabafou.

Reinaldo de Jesus Cunha, conselheiro do Conselho Estadual dos Direitos Indígenas (CEDIND ) - Reprodução/ Redes Sociais

Conselheiro do Conselho Estadual dos Direitos Indígenas (CEDIND), Reinaldo de Jesus Cunha diz que o deputado deveria, antes de se posicionar, familiarizar-se com a criação do Centro de Referência e Convivência Indígena e Universidade Indígena no terreno da Aldeia Maracanã. "A campanha eleitoral acabou. Chegou o momento de sair do palanque. Se o deputado realmente respeita a comunidade indígena, deve ter maior equilíbrio em seus argumentos e contribuindo para o restauro do Antigo Museu do Índio. Afinal, quem ganha com a ocupação ordenada do lugar é toda a sociedade, e, por conseguinte, o turista, que vai ter um novo espaço de visitação, além do fomento de empregos", declarou. Reinaldo defende um debate aberto e franco com as lideranças de movimentos indígenas, instituições parceiras e representantes do poder executivo e legislativo sobre o espaço.

Dauá Puri é contador de histórias, instrutor e jornalista - Reprodução/ Redes Sociais

Dauá Puri, 65, é um dos fundadores da Associação Indígena da Aldeia Maracanã (AIAM),onde morou por sete anos. Membro do Movimento de Ressurgência Puri, ele deixou o espaço em 2012, após compromisso firmado com o estado de que fosse criado ali um Centro de Cultura e Universidade Indígena. Segundo ele, o parlamentar não está atualizado com as informações do movimentos sociais do Rio de Janeiro. "Acredito que o parlamentar que venha a pleitear uma cadeira no Estado do Rio precisa ler e se informar sobre a situação indígena antes de dar declarações. A relação com os indígenas é primordial, porque são os primeiros habitantes desta terra. Os povos indígenas foram invisibilizados, mas hoje estão em posição de diálogo com qualquer estado de governo que se estabeleça no país. A declaração é de quem não sabe que hoje temos índios doutores, médicos, advogados e mestres", acrescentou.

O Governo do Estado informou que vai analisar a situação da Aldeia Maracanã, "inclusive a questão jurídica", para tomar uma decisão sobre o local. Já a Funai informou que não irá se manifestar sobre as declarações do parlamentar.

Autoridades bolivianas reagem

A Bolívia reagiu com indignação às declarações de Amorim (PSL). O presidente boliviano Evo Morales lamentou a fala que considerou de supremacia racista.

"Lamentamos o ressurgimento da ideologia de supremacia racista. Perante a intolerância e a discriminação, nós povos indígenas promovemos o respeito e a integração. Temos os mesmos direitos porque somos filhos da mesma Mãe Terra", escreveu Morales, de origem indígena, em sua conta de Twitter, sem citar o deputado.

O ex-presidente boliviano Carlos Mesa também reagiu à fala nas redes sociais: "Declaração revoltante de deputado brasileiro ofende a Bolívia e não expressa a irmandade de nossos povos. Diferenças ideológicas entre governos não justificam tal afirmação. O indígena é parte essencial de nossas identidades e nossa força como nação".

A ministra boliviana das Comunicações, Gisela López, escreveu no Twitter que o deputado brasileiro "despreza com ignorância supina nossos antepassados, os verdadeiros donos da Pátria Grande, com palavras que demonstram cegueira e pobreza espiritual".

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