Major Ronald Paulo Alves Pereira é um dos líderes de milícia em Rio das Pedras - WhatsApp O DIA (98762-8248)
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Por Adriano Araujo e Rafael Nascimento

Rio - Uma operação, chamada de "Os Intocáveis", busca prender nesta terça-feira milicianos, dois deles suspeitos de envolvimento nas execuções da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Pedro Gomes. A ação do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), da Polícia Civil, conta com cerca de 140 agentes e visa cumprir 13 mandados de prisão preventiva, além de busca e apreensão, contra a milícia mais antiga e perigosa do estado: a que atua em Rio das Pedras, Muzema e redondezas. Cinco pessoas foram presas.

Entre os presos estão o major da PM Ronald Paulo Alves Pereira e Maurício Silva da Costa, o "Maurição", tenente reformado da Polícia Militar. Os dois são chefes do grupo miliciano, ao lado de Adriano Magalhães da Nóbrega, ex-capitão do Bope, que também é procurado. Os outros presos são Manoel de Brito Batista, o "Cabelo"; Benedito Aurélio Ferreira Carvalho, o "Aurélio"; e Laerte Silva de Lima. 

Além das favelas de Rio das Pedras e da Muzema, as equipes da Polícia Civil e do MP fazem buscas em endereços nos bairros da Barra da Tijuca, Recreio dos Bandeirantes, Vargem Grande e Vargem Pequena, também na Zona Oeste.

Durante o cumprimento do mandando de prisão na casa de "Cabelo", apontado como contador e gerente armado do grupo paramilitar, os policiais da Draco e da Core encontraram um cofre chumbado em uma das paredes. O achado fez a equipe perder mais de duas horas para arrombá-lo, mas nada foi encontrado dentro. Por conta disso, o preso ainda não tinha chegado à Cidade da Polícia, no Jacarezinho, às 11h30.

Em nota, a Anistia Internacional afirmou que "é muito importante ver que o Ministério Público está atuando contra o crime organizado" e que "as informações divulgadas publicamente de que existiria no estado um grupo de extermínio chamado 'Escritório do Crime' eram muito preocupantes e requeriam uma resposta adequada do sistema de justiça criminal."

"Os suspeitos de envolvimento e participação neste grupo criminoso devem ser levados à justiça. Sobre o assassinato de Marielle Franco, a Anistia Internacional reitera que o único resultado aceitável como solução do caso é aquele que seja baseado em evidências concretas. O caso só pode ser considerado solucionado quando a investigação do assassinato for concluída da forma correta e quando os responsáveis forem levados à justiça por este assassinato, e não por outros crimes", finaliza o comunicado emitido pela instituição.

Dois alvos são do 'Escritório do Crime' 

Dois dos alvos de prisão, o major Ronald e o capitão Adriano, comandariam o "Escritório do Crime", braço armado da organização especializado em assassinatos por encomenda. Os principais clientes do grupo de matadores profissionais são contraventores e políticos. Há uma suspeita de que o "Escritório" estejam envolvidos no assassinato da vereadora do Psol e do motorista Anderson Gomes. A promotora do Gaeco Letícia Emili, que atua no caso Marielle, acompanha a operação da Cidade da Polícia.

Tanto Ronald quanto Adriano foram ouvidos na condição de testemunhas no caso Marielle. "O caso Marielle corre em segredo de justiça. São investigações que não se confundem. Não podemos, nesse momento, nem afirmar e nem descartar a participação de todos ou de alguns desses integrantes no caso", disse Simone Sibilio, outra promotora que investiga as execuções da vereadora e do motorista. "É possível sim que eles façam parte do escritório do crime e as investigações serão aprofundadas nesse sentido", concluiu. 

Um dos objetivos da operação, divulgado pelo MP, é coibir a grilagem de terras, que foi apontado como um dos motivos da morte de Marielle Franco, já que ela ameaçava o negócio criminoso. Através de escutas e informações do Disque Denúncia, os envolvidos foram denunciados pela construção, venda e locação ilegais de imóveis; receptação de carga roubada; posse e porte ilegal de arma; extorsão de moradores e comerciantes, mediante cobrança de taxas referentes a "serviços" prestados; ocultação de bens adquiridos com os proventos das atividades ilícitas, por meio de "laranjas"; falsificação de documentos; pagamento de propina a agentes públicos; agiotagem; utilização de ligações clandestinas de água e energia; e uso da força como meio de intimidação e demonstração de poder.

Foram denunciados Adriano Magalhães da Nóbrega, mais conhecido como "capitão Adriano" ou "Gordinho"; Ronald Paulo Alves Pereira, o major Ronald ou "Tartaruga"; Maurício Silva da Costa, conhecido como "Maurição", "Careca", "Coroa' ou "Velho"; Marcus Vinicius Reis dos Santos, "Fininho"; Manoel de Brito Batista, "Cabelo"; Júlio Cesar Veloso Serra; Daniel Alves de Souza; Laerte Silva de Lima; Gerardo Alves Mascarenhas, o "Pirata"; Benedito Aurélio Ferreira Carvalho, "Aurélio"; Jorge Alberto Moreth, o "Beto Bomba"; Fabiano Cordeiro Ferreira, o "Mágico" e Fábio Campelo Lima. Por meio da transcrição de áudios, foram verificadas as relações estabelecidas entre os criminosos e as funções desempenhadas por cada um deles na organização, tais como segurança (ou 'braço armado'), agente de cobrança de taxas, lavagem de dinheiro (na figura de 'laranjas'), agiotagem e forte atuação no ramo ilegal imobiliário.

Um dia após completar 10 meses do assassinato da vereadora Marielle Franco (Psol) e de Anderson Gomes, ocorreu um encontro entre as promotoras do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) — que investigam paralelamente o caso — e os delegados do Departamento Geral de Homicídios e Proteção à Pessoa (DGHPP). O objetivo da reunião era apresentar detalhes da investigação e tentar sanar um racha que se instaurou entre os dois órgãos há alguns meses após discordâncias sobre as investigações e seus andamentos.

Participaram do encontro as promotoras Simone Sibilio e Letícia Emili, do Gaeco. Além do diretor do DGHPP, Antônio Ricardo Nunes e o delegado Giniton Lages, que está a frente do caso.

Informações privilegiadas

A denúncia do Ministério Público aponta que o capitão Adriano, Major Ronald e o tenente reformado da PM Maurício Silva da Costa, o 'Maurição’' são os líderes da organização de Rio das Pedras e adjacências. Jorge Alberto Moreth, o "Beto Bomba", é o presidente da Associação de Moradores da comunidade, cargo conquistado, segundo o MP, a partir de ameaças e uso de força.

Através da associação são realizadas as transações de compra e venda dos imóveis construídos ilegalmente e a manipulação de documentos necessários à concretização de operações ilícitas. ""Beto Bomba" goza de informações privilegiadas sobre operações policiais realizadas nas localidades dominadas, sempre alertando seus subordinados, de forma prévia, sobre as intervenções programadas, a fim de que o esquema criminoso não seja desbaratado", diz o Ministério Público.

Documentos comprovam que moradores eram obrigados a alugar determinadas casas e se precisassem de empréstimos não poderiam pegar em bancos ou empresas especializadas. Os moradores eram obrigados a contratar as dívidas junto à associação. Em um dos documentos o Ministério Público encontrou uma pessoa que fez um empréstimo de R$ 100 mil a juros de 6% ao mês. Em outro documento, os policiais encontraram o nome de pelo menos 20 pessoas que alugavam casas e apartamentos dos milicianos. De acordo com as provas, que estão sendo analisadas, todas as operações de compra e venda de imóveis passava pelo crivo da associação de moradores de Rio das Pedras. 

Alguns integrantes do grupo também respondem pelo homicídio de Júlio de Araújo, em 24 de setembro de 2015, morto com vários tiros na cabeça da vítima e que seria uma "queima de arquivo", já que ele poderia fazer denúncias sobre crime anterior cometido por integrantes da organização criminosa. Também há imputação do crime de corrupção ativa para dois denunciados.

O MP do Rio pede a condenação dos denunciados por organização de milícia e pelos crimes de homicídio "mediante recompensa", por motivo torpe ou emboscada. "O Ministério Público espera que, a partir destas prisões, a comunidade passe a denunciar outras práticas ilegais de cobrança ilegal de taxas e outros crimes praticados pela organização criminosa", diz o órgão.

 

 

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