David Nobio em foto durante
David Nobio em foto durante "trote cultural": jovem estuda odontologia na UFFReprodução Facebook
Por ADRIANO ARAÚJO

Rio - Internado em estado grave e acusado injustamente de ser um criminoso que atacou a tiros policiais em uma favela de São Gonçalo, segundo a família. Parentes do estudante de odontologia David Nobio vivem duas dores desde que o jovem de 22 anos saiu de casa em Itaboraí, no último sábado, para ir a uma festa no Rio. O universitário está em coma induzido, perdeu o rim e o baço, e teve o intestino perfurado após ser baleado. Enquanto ele luta pela vida, familiares lutam para provar que ele nunca teve envolvimento com o crime.

"O David não é capaz de matar uma mosca. Ele nunca se meteu em nada ilícito. Ele está respondendo bem ao tratamento, mas a vida dele nunca mais será a mesma. Ele perdeu o rim e o baço, teve o intestino perfurado pelo tiro e está usando uma bolsa de colostomia. E continua em coma induzido", diz a arquiteta Ronieli Moraes, que é casada com o tio de David, que virou uma espécie de espelho para ele querer seguir a carreira na área da Saúde.

"Ele se espelhou no meu marido, o tio, que é técnico em radiologia. Ele começou a estudar e gostar da área de saúde, o David se dedica, estuda muito, virou monitor do curso pH e ganhou uma bolsa para o pré-vestibular. Ele é formado em técnico em enfermagem, tem Coren (registro no conselho de enfermagem), mas queria mais. Então ele passou para enfermagem na UFF e depois odontologia. O sonho é fazer medicina, mas incentivamos ele fazer odonto e estava gostando. Ainda não desistiu de medicina, tanto que fez o Enem novamente ano passado", conta a tia.

Ronieli tem acompanhado de perto o sobrinho no hospital, custodiado e com um mandado de prisão preventiva expedido pela justiça, enquanto o pai do estudante, junto com outros familiares e um advogado, tentam provar sua inocência. Segundo ela, os pais estão destruídos, inclusive a avó materna de David, a quem ele considerava como uma mãe.

"A vida dele não será a mesma depois que acordar, em função dos órgãos que perdeu. Ninguém fica o mesmo depois de uma tragédia dessa. Estamos em choque, esta última noite não dormi pensando nele. São duas dores: a dor da vida dele e a dor da injustiça. Fico pensando nele entubado, sem baço, sem rim, sendo acusado injustamente, nem sei descrever a sensação", disse.

Ela conta que a família não sabe o que o rapaz estava fazendo no local no momento em que foi baleado, mas confia que tudo será esclarecido. O outro baleado, que a família também diz ser inocente, não é conhecido de David, de acordo com a tia.

Polícia ouvirá PMs novamente

Nesta quarta-feira, a Polícia Civil disse que ouvirá novamente os policiais militares envolvidos na ocorrência que apontou David e Ramon como criminosos que atiraram neles durante confronto na Favela do Brejal, em São Gonçalo. Eles afiram que a prisão foi pedida com base no depoimento inicial dos PMs.

"De acordo com informações da 74ª DP, a prisão foi baseada no depoimento de policiais militares, que serão novamente convocados para prestar novo depoimento. Policiais civis irão no Hospital com o objetivo de tentar ouvir os envolvidos, se for clinicamente possível. Demais diligências que possam ajudar no esclarecimento dos fatos estão em andamento", diz o texto enviado à reportagem.

Em nota, a PM disse que os policiais foram para a favela do Brejal em perseguição a criminosos que estariam praticando roubos na BR-101, na altura do bairro Bom Retiro. Segundo a PM, eles foram recebidos a tiros e houve confronto. Após o cessar-fogo, David e Ramon foram encontrados baleados, ainda de acordo com a corporação, que alega ter apreendido 34 trouxinhas de maconha e 186 pinos de cocaína, dois rádios-transmissores e uma pistola calibre 380 com numeração raspada.

Questionada, a corporação não informou se os policiais disseram se viram os dois baleados atirando, nem falou se denúncias das famílias de David e Ramon serão apuradas internamente. Na terça-feira, a Justiça converteu a prisão em flagrante dos dois para preventiva, com base nas informações dadas pelos PMs envolvidos o confronto. Em um trecho da decisão, a juíza Amanda Azevedo Ribeiro Alves, da 3ª Vara Criminal, disse que, com base nos elementos apresentados, há "fortes indícios de envolvimento dos mesmos junto à traficância local e à grande facção criminosa".

UFF diz que acompanha a investigação e dá apoio à família

Em nota, a Universidade Federal Fluminense (UFF) que tomou conhecimento do caso por meio de notícias veiculadas na imprensa e que acompanha de perto os acontecimentos. A instituição informou estar levantando informações sobre o caso para que as devidas providências sejam tomadas. "A UFF enviou um representante da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis e um assistente social ao hospital para oferecer todo o suporte necessário à família", dizia a nota.

Ainda de acordo com a instituição, o caso gerou "profunda comoção" entre os estudantes e professores de Odontologia que "prontamente" manifestaram solidariedade a David. "A direção da Faculdade de Odontologia também se colocou à disposição da família do estudante para colaborar no sentido que este triste episódio seja apurado com o devido rigor. O vice-diretor, Esio Vieira, e a vice coordenadora do curso de graduação em Odontologia, Telma Aguiar, também estiveram em contato com a equipe médica do hospital", ressaltaram.

A UFF informou que "toda sua comunidade se junta às preces da família para que David se recupere completamente e volte às atividades regulares do curso". A instituição ainda garantiu que deve consultar a Procuradoria Geral para buscar amparo jurídico. Eles reivindicam "profunda apuração" do caso para que os responsáveis sejam identificados e processados nos ditames da lei.

O Diretório Acadêmico Agripino Ether, do curso de odontologia, divulgou um posicionamento através de suas páginas na Internet e disse que "é testemunha de que David sempre esteve ativo nas atividades acadêmicas da faculdade e que nunca esteve envolvido com práticas ilícitas, as quais está sendo incriminado".

 

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