Idoso chega para atendimento no Hospital Souza Aguiar, no Centro. Reclamações de pacientes que precisam usar a unidade são constantes - Reginaldo Pimenta / Agência O Dia
Idoso chega para atendimento no Hospital Souza Aguiar, no Centro. Reclamações de pacientes que precisam usar a unidade são constantesReginaldo Pimenta / Agência O Dia
Por GUSTAVO RIBEIRO

Rio - Faltam medicamentos e leitos de CTI, o atendimento na emergência dos hospitais leva mais de oito horas e doentes aguardam meses por cirurgias. Pacientes sofrem com o cenário caótico da rede municipal de Saúde do Rio e o caos pode ser explicado pela drástica redução de recursos disponíveis para as unidades da cidade. Diante de sucessivas tesouradas, a Secretaria Municipal de Saúde vê seu orçamento despencar desde 2017, quando Marcelo Crivella assumiu a cadeira de prefeito. Só nos dois primeiros anos de seu governo, os cortes chegaram a R$ 716,41 milhões. O dado consta no Fincon — Sistema Oficial de Acompanhamento das Finanças e Contas do governo.

Em 2016, foram gastos R$ 5,43 bilhões com a saúde pública municipal. Em 2017, o montante despencou para R$ 4,83 bilhões. E voltou a sofrer cortes no ano passado, quando os recursos empregados na Saúde foram de R$ 4,5 bilhões.

Nos hospitais da rede municipal, a reclamação é geral. Com uma inflamação no ouvido há dias, a dona de casa Cássia Ramos, de 48 anos, voltou para casa sem atendimento depois de peregrinar por três hospitais.

"Vim do Albert Schweitzer (Realengo) e já tinha ido ao Rocha Faria (Campo Grande). Disseram que no Souza Aguiar (Centro) eu conseguiria ser atendida. Mas, quando cheguei, me disseram que aqui era só caso cirúrgico e me mandaram para a UPA. É um descaso", reclamou.

Há dois anos na fila do Sistema de Regulação (Sisreg), na esperança de uma cirurgia para retirada de pedra nos rins, Andreia Fernandes, não conseguiu atendimento adequado.

"É muito sofrimento. Cansada de esperar, resolvi procurar ajuda por conta própria. Fui na UPA e me transferiram para o (hospital) Souza Aguiar. Aqui, me disseram que não tem o equipamento necessário, porque a pedra está na parede dos rins", conta ela que continua aguardando na fila.

No Hospital Souza Aguiar, a principal reclamação é sobre a demora no atendimento que, segundo pacientes, pode extrapolar oito horas.

Com o braço quebrado há um mês, Pablo Dias foi liberado da internação na unidade, sem o problema resolvido. "Está muito complicado. O serviço de saúde está precário em todas as unidades", reclama ele, que diz ter sido orientado a fazer fisioterapias sem saber se seu caso necessitará ou não de cirurgia.

Rosemery Ramos e Marciliara Silva são, respectivamente, sogra e mãe de uma grávida que aguardava a retirada de um feto morto de seu ventre. Elas reclamam do atendimento prestado à paciente Vilma da Silva, de 26 anos. "Já pedimos para fazerem uma cesariana, mas os médicos dizem que pelo SUS é assim mesmo".

Prefeitura: repasse de recursos à Saúde obedece lei

Procurada para explicar os sucessivos cortes na Saúde, a Prefeitura do Rio informou, em nota, que nos

últimos dois anos, mesmo com a queda na arrecadação dos cofres municipais, por conta da crise, houve esforço de gestão para destinar considerável parcela de suas receitas para a pasta.

“Foi mais do que suficiente para respeitar a legislação em vigor que estabelece o mínimo constitucional de 15%”, informou a prefeitura, que mantém o percentual investido na Saúde superior a 20% da arrecadação. A atual gestão destacou ainda que o município “assumiu dois hospitais do Estado”, elevando os custos em R$ 400 milhões.

A Secretaria Municipal de Saúde informou ainda que a paciente Cássia Ramos foi encaminhada para

a Coordenação de Emergência Regional, no Centro, e que Andreia Fernandes foi avaliada por urologista e terá sua cirurgia agendada pelo Sisreg. Já Pablo Dias, não precisou de cirurgia e terá atendimento ambulatorial. Sobre o caso da grávida Vilma, a Prefeitura diz que segue o protocolo de atendimento do Ministério da Saúde.

Cortes na atenção básica são despesa extra nas emergências

Se nas emergências das unidades de saúde a situação está caótica, na atenção básica não é diferente.

Após a extinção de cerca de 600 postos de trabalho desde que o prefeito Marcelo Crivella anunciou “reestruturação” da rede, pacientes vêm sentindo os efeitos. A mudança inclui a extinção

de 184 equipes de saúde. E o número de postos de trabalho extintos deve chegar a 1.400 nos próximos meses.

Para especialistas, a economia apontada por Crivella para justificar os cortes não é real. Isso porque o

gasto em atenção básica reduz, comprovadamente, a despesa nas emergências e com internações.

“No caso de um paciente com pressão alta, é muito melhor para ele e para o governo que seja feito um acompanhamento ambulatorial, evitando infarto ou AVC. A clínica da família serve para evitar que a doença

do paciente agrave”, explica Rita Helena Borret, presidente da Associação de Medicina da Família e Comunidade do Estado do Rio.

O pesquisador da Fiocruz Daniel Soranz destaca que, só em 2014, houve uma redução de 15.595

internações, fruto do aumento dos serviços de atenção primária à saúde. Na ocasião, a economia foi

de quase R$ 180 milhões.

*Estagiária sob supervisão de Herculano Barreto

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