Mariana Santos acertou uma bela bicicleta para mostrar que tem habilidade de sobra - Reginaldo Pimenta
Mariana Santos acertou uma bela bicicleta para mostrar que tem habilidade de sobraReginaldo Pimenta
Por LUCIANO PAIVA
Rio - Elas entram em campo e não fazem vergonha. Aliás, as meninas estão com tudo quando o assunto é futebol. Às vésperas da 8ª edição da Copa do Mundo de Futebol Feminino, que ocorre de 7 de junho a 7 de julho, na França, ainda há quem duvide do domínio de bola que elas têm. Tanto que o prefeito Marcelo Crivella (PRB-RJ)chegou a dizer que elas não têm intimidade com o esporte: “Vocês são meninas, não entendem nada, pelo menos na minha época não entendiam, mas os meninos a vida inteira brincaram”, afirmou Crivella, na quinta-feira, durante uma visita à obra de acesso da Ponte Rio-Niterói para a Linha Vermelha. Ele explicava que foi mal entendido na brincadeira em que comparou a queda da ciclovia com o desempenho do Vasco.
A declaração deixou as moças #chateadas. Enquanto as garotas batiam bola antes do treinamento no campinho de grama sintética castigada do projeto social Casas da Noruega, localizado em Bancários, na Ilha do Governador, a doméstica Norma Souza arrumava o meião para entrar em campo. Ao seu lado, a filha Raiane Dias dos Santos, de 13 anos, observava com atenção a mãe afirmar com firmeza.
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“A mulher entende de futebol, sim. E jogamos bem também. Se a gente gosta, tem que fazer mesmo tudo o que quiser e sentir vontade”, reforçou Norma.
Entre as que jogavam no campinho, Mariana Santos acertou uma bela bicicleta para mostrar que tem habilidade de sobra. Do lado de fora, encostada nas grades, a dona de casa Carla Roberta admirava os passes e dribles da filha Giovana, de 13 anos.
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“Muitas mulheres até jogam melhor do que os homens. Ensino isso ao meu filho mais novo, o Luiz Fernando, para que nunca duvide da habilidade das meninas”, afirmou Carla.
Natasha Dutra, da equipe feminina de futebol dos Bancários, na Ilha do Governador, exibe estilo com a redonda - Reginaldo Pimenta
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O líder do programa Casas da Noruega no Brasil, Jair Ferreira, é um dos maiores incentivadores da garotada. “A nossa luta contra o preconceito por aqui é diária, não acaba nunca. O mais engraçado nisso tudo é que até de mulheres eu já escutei frases do tipo ‘futebol é coisa de homem’. Está errado”, disse Jair, que trabalha com cerca de 40 meninas no projeto.
Procurada, a Prefeitura não se posicionou sobre a polêmica.
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CBF eleva patamar do campeonato
O caminho é longo e os passos são ainda lentos, mas, aos poucos, o futebol feminino reivindica espaço no universo masculino. Para se ter uma noção de como a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) já tenta acompanhar a evolução mundial da modalidade, a convocação do técnico Vadão, no último dia 16, foi um evento na sede da entidade, na Barra da Tijuca, o que nunca tinha sido feito antes. Em 2015, por exemplo, a lista das jogadoras convocadas foi divulgada apenas no site da entidade.
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Pela primeira vez, os jogos da Seleção feminina na Copa do Mundo serão transmitidos na TV Globo. A jornalista Ana Thaís Matos e a ex-jogadora Milene Domingues, que foi casada com Ronaldo Fenômeno, serão as primeiras mulheres a comentarem um jogo na emissora, com reportagem de Carol Barcellos.
Mulheres contam suas histórias brilhantes no futebol
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O futebol é coisa séria para as mulheres há muito tempo e já virou profissão. Atleta do time feminino do Fluminense, Samara Salgado, de 25 anos, joga desde os 10. Há dois anos também ensina o esporte para meninas de 6 até 14 anos, no município de Rio Bonito, onde nasceu. “O futebol é a minha vida, vivo o esporte diariamente. O próprio Vasco vem fomentando o futebol feminino há anos, precisa ser respeitado”, criticou ela.
“A procura de meninas pelas aulas está crescendo. A gente vai enfrentando barreiras pra outras chegarem. O preconceito serve de incentivo para mostrarmos que sabemos sim de futebol e somos capazes sim de jogar”, acrescentou a jogadora.
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A carioca Larissa Erthal apresenta programas esportivos na TV há 10 anos - Reprodução / Instagram
Apresentadora do programa esportivo Terceiro Tempo, a jornalista Larissa Erthal, 35 anos, afirma com orgulho que mulher no futebol é uma realidade. “Se há pouco mais de 30 anos o esporte era proibido entre as mulheres, hoje já tive a oportunidade de trabalhar numa redação predominantemente feminina. Não somos só nós que saímos ganhando, é também o público, os atletas, as instituições... esse processo se auto-alimenta”, ponderou ela, que já participou da cobertura de duas Copas do Mundo, Liga dos Campeões, Europa e Jogos Olímpicos. “Estou em um momento muito feliz com a valorização do futebol feminino. É um mercado em ascensão definitivamente”.
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Jogadora do time feminino de futebol de areia do Flamengo, Bárbara Figueiredo, de 26 anos, tomou gosto pelo esporte desde criança, influenciada pelo pai, que é treinador. “O futebol feminino tem várias barreiras a enfrentar. Visões preconceituosas impedem o avanço da modalidade”, disse ela. “E os entraves não são apenas no esporte, há toda uma questão cultural a ser combatida. É preciso o incentivo às meninas desde a infância”, sinalizou Bárbara.

Colaborou a estagiária Luana Dandara