Leandro é aderecista de carnaval e foi preso por homicídio. Família e amigos alegam que ele é inocente - Reprodução Facebook
Leandro é aderecista de carnaval e foi preso por homicídio. Família e amigos alegam que ele é inocenteReprodução Facebook
Por ADRIANO ARAÚJO
Rio - Em 27 de maio, Leandro dos Santos Oliveira, 37 anos, foi preso em Vila Isabel, na Zona Norte, por um assassinato ocorrido em 2017. Ele foi surpreendido pelo mandado de prisão, emitido em agosto de 2018, quando foi até um posto do Detran no bairro iniciar o processo de emissão da carteira de habilitação. Familiares e amigos do aderecista alegam que ele é inocente. Segundo o advogado, ele foi apontado como o autor do crime a partir de fotos de seu perfil no Facebook, mesmo com suas características sendo diferentes do suspeito apontado pela testemunha. De igual, apenas a cor da pele, diz uma parente.
O advogado Fábio Wanderley entrou com um pedido de revogação da prisão de Leandro, que foi negado. Segundo ele, os principais pontos contraditórios da investigação, com base na testemunha que viu o suposto assassino, foram ignorados. Agora ele espera resposta para um pedido de habeas corpus, solicitado na última sexta-feira.
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Leandro é acusado pela morte de Luiz Fernando Armando de Abreu, assassinado a facadas dentro de casa em 10 de março de 2017, no bairro do Anil, em Jacarepaguá. O DIA teve acesso ao inquérito policial que concluiu que Leandro é o assassino. Na madrugada do crime, a principal testemunha, uma vizinha da vítima, ouviu gritos do apartamento dele e foi ver o que estava acontecendo.
No depoimento, ela afirma que um homem moreno, alto, com uma tatuagem em um dos antebraços, abriu a porta e falou que não estava acontecendo nada, que era uma "briga de casal". Mas Leandro, preso pelo crime, é negro, não tem tatuagem e possui estatura mediana. 
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Cerca de 40 minutos depois, ela ouviu um barulho de portão batendo e flagrou o assassino deixando o local correndo. Ela chamou outros vizinhos e, ao olharem pela fresta da porta de Luiz Fernando, viram marcas de sangue na casa e chamaram a polícia, que encontrou a vítima morta com várias facadas.
Ainda no dia do crime, ela disse que não sabia quem era o assassino mas, cinco dias depois, na delegacia, apresentou a foto de Leandro e o apontou como o assassino. Ela contou que postou no Facebook lamentando a morte e pediu informações que ajudassem a prender o autor do crime e divulgou seu telefone.
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No depoimento, a testemunha disse que recebeu a ligação de um "Leandro", que pedia informações sobre a morte e que parecia "debochar”. Após "investigar" na lista de amigos no Facebook de Luiz Fernando, ela chegou até o aderecista Leandro dos Santos Oliveira, o apontando como o mesmo homem que abriu a porta da vítima na madrugada que ocorreu o crime.
"A pessoa que o reconheceu disse na polícia na época que o assassino tinha tatuagem no antebraço, mas o Leandro não tem nenhuma tatuagem, isso é gritante. Ela também apontou Leandro como namorado da vítima, mas as pessoas que conheciam a vítima disseram que ele não era namorado do Luiz Fernando. Isso foi totalmente ignorado", explicou o defensor.
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Uma vizinha que trabalhava no local onde Luiz Fernando almoçava quase que diariamente, falou em depoimento que conversou com ele um dia antes do crime. A vítima disse a ela que estava namorando, mostrou foto do suposto companheiro e disse que ele passaria o fim de semana em sua casa. Na delegacia, ela falou que Leandro não é o homem que Luiz Fernando mostrou na foto.
Esta mesma testemunha afirma que Luiz Fernando comentou que tinha "brigado horrores" com o namorado, contando que ele "era louco". No dia seguinte, ela ficou sabendo do assassinato do amigo.
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Leandro é aderecista de carnaval e foi preso por homicídio. Família e amigos alegam que ele é inocente - Reprodução Facebook


Querido no mundo do carnaval
Assim como Leandro, Luiz Fernando também trabalhava em escolas de samba como aderecista e estilista. O advogado do preso diz que eles não eram amigos, apenas conviviam no mesmo ambiente e tinham colegas em comum.
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"Eles se viam na Cidade do Samba, em áreas de convívio comum, como lanchonete, se esbarravam no dia a dia no barracão. Nessa época do crime, a vítima trabalhava na Grande Rio e, salvo engano, Leandro estava na Estácio de Sá, que são de grupos diferentes. Eles tinham amigos em comum, mas eles eram mais colegas que amigos, única relação é que trabalhavam com carnaval, um universo gigante”, diz Fábio Wanderley.
Segundo o defensor, Leandro nunca soube que era suspeito de um crime e nunca foi chamado para prestar depoimento na delegacia. O preso chegou a receber prêmios e até apareceu na televisão durante o carnaval deste ano, quando trabalhou pela Vila Isabel.
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"Ele é um profissional respeitado, já recebeu prêmios, é muito querido no meio do samba. Como o processo é de 2017, constava que ele estava foragido, mas ele sequer tinha conhecimento desta acusação, até apareceu na mídia durante este carnaval. Como uma pessoa foragida vai aparecer em vinheta do carnaval, dar entrevista?”, questionou o advogado, que conta que Leandro trabalha há mais de 20 anos com carnaval, tendo passagem por várias escolas de samba.


Família e amigos cobram justiça
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Familiares e amigos se mobilizam através das redes sociais, através da hashtag #somostodosleandro, para cobrar justiça para Leandro. Entre os que reforçam o coro está o carnavalesco Paulo Menezes, com quem o preso trabalha no carnaval há mais de 20 anos. "A justiça será feita", escreveu Menezes na Internet.
A professora Ana Paula dos Santos, 41 anos, é prima de Leandro e diz acredita na inocência do padrinho de sua filha de cinco anos, que pergunta a todo momento por ele. Ela diz que desconversa e diz a filha que ele está doente, internado.
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"Está todo mundo consternado, assustado com isso tudo. Ele é uma pessoa maravilhosa, um filho presente, cuida da mãe e da família dele. Isso é uma injustiça, ele não fez isso, é incapaz de fazer mal a alguém. Nosso maior desejo é que saia de lá logo", diz.
A prima conta que a mãe de Leandro está a base de remédios e todos temem o que pode acontecer com ela. A preocupação também é de como o aderecista vai assimilar todo esse sofrimento na cadeia, sendo inocente. "Nossa preocupação é como está a cabeça dele e como ele vai sair de lá. É o nome dele, a imagem dele".
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Ana Paula acredita que o fato do primo ser negro pode ter contribuído para ele ser apontado como o autor do crime. "É aquela velha frase racista: todo preto se parece. Mas isso não é verdade. Eu acredito até que ela tenha confundido, mas não é ele. Até para você acusar tem que ter provas. Enquanto isso o assassino está aí, solto", conclui.
Jorge Francisco, o "Chiquinho" da Babado da Folia, loja que abastece o carnaval do Rio para a confecção dos adereços, postou um vídeo em solidariedade a Leandro. O advogado também reuniu declarações de todas as escolas que o aderecista trabalhou nos últimos anos para ajudar na defesa.
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"Com todo respeito, mas a DH investigou mal. Tinham que no mínimo chamar meu cliente, fazer o reconhecimento presencial. Isso não foi feito, o reconhecimento foi pelo Facebook", criticou o advogado.
A reportagem entrou em contato com a Polícia Civil e com o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), que ainda não se pronunciaram sobre o caso de Leandro dos Santos Oliveira. O DIA também tentou falar com um delegado que participou da investigação, mas não conseguiu contato.
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Caso parecido 
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Em julho do ano passado, o motorista de aplicativo Antonio Carlos Rodrigues Junior, 43, ficou preso por sete dias ao ser confundido com um dos ladrões que roubaram a cônsul-geral da Venezuela no Rio. Assim como Leandro, ele também foi reconhecido por fotos de redes sociais. Após ser solto, ele revelou que tinha dificuldades para dormir.
Prw, como é conhecido pelos amigos, falou que teve dificuldades para comer e até para beber água. "É um local feio, com um clima pesado, cheiro ruim, escuro. Eu estava lá com ladrão, traficante, gente com feridas abertas, e você sente no olhar a ameaça. Fiquei deitado em um papelão no chão, mas não tinha como fechar os olhos naquele lugar", contou sobre a rotina do presídio de Benfica, na Zona Norte do Rio.